Quais foram as principais mudanças no estado nutricional da população ao longo do tempo?

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A chamada transição nutricional diz respeito às mudanças na estrutura da dieta dos indivíduos, relacionada  a essas alterações e às condições de saúde.[1] Foi descrito como tendo por característica principal um antagonismo de tendências temporais entre desnutrição e obesidade inserido em um contexto histórico de mudanças econômicas, políticas e sociais, que levou a população a transitar de uma situação de grande prevalência de desnutrição, ao estado atual, em que a obesidade e o sobrepeso tomam proporções epidêmicas.

Fatores[editar | editar código-fonte]

Dentre os principais fatores relacionados à transição alimentar, observamos como causas: mudanças sociais e geopolíticas, alterações no padrão alimentar, redução nas atividades físicas, diferenças regionais e condições socioeconômicas.

As consequências mais evidentes dessa transição são as doenças associadas à obesidade e às carências nutricionais.

Mudanças no padrão alimentar[editar | editar código-fonte]

A característica mais marcante da transição nutricional é a redução do consumo de frutas, legumes, verduras e carboidratos complexos e o aumento do consumo de alimento industrializado e ultraprocessados, como refrigerantes, açúcar, produtos ricos em gordura e fast foods, o que gera um quadro de excesso calórico e deficiência de micronutrientes (vitaminas e minerais).[2]

A maior oferta de produtos industrializados nos supermercados, bem como o grande número de propagandas relacionadas a eles, que são em sua maior parte voltadas ao público infanto-juvenil,  acarreta no aumento de indivíduos consumidores destes produtos, contribuindo para o crescente número de casos de obesidade e doenças crônicas.

Os biscoitos e chocolates, ricos em açúcares e gorduras, bem como salgadinhos e refrigerantes compõe mais de 70% das peças publicitárias exibidas na televisão aberta, enquanto frutas e hortaliças quase não têm exibição nos meios de comunicação.

A regulamentação desta indústria através de órgãos nacionais e internacionais vem tentando controlar estes efeitos através de medidas específicas para este público.[3]

Mudanças nas práticas de atividades física[editar | editar código-fonte]

A urbanização e a industrialização das cidades, somados ao avanço da tecnologia reduziram a demanda de esforços físicos dos trabalhadores no desempenho de suas funções, além disso o maior número de opções de lazer nos grandes centros urbanos, fez com que se diminuísse a prática de atividades com maior gasto energético.

Observa-se que, ao longo das décadas, houve uma substituição dos passeios e atividades ao ar livre, como as práticas esportivas, por atividades sedentárias, como cinema, televisão, videogame ou computador. Ocorre que estas mudanças proporcionaram uma redução do gasto calórico global, bem como o aumento da ingestão de alimentos com alta concentração calórica durante tais atividades.[2]

A automatização do maquinário doméstico é outro fator de influência neste processo. Controles remotos, vidros, portas e portões elétricos, veículos motorizados e máquinas de lavar louça, roupa, corta-gramas entre outros, substituíram o trabalho humano e o consequente esforço físico e consumo energético que a execução de tais tarefas proporcionaria.

Diferenças regionais no Brasil[editar | editar código-fonte]

Partindo dos Estudos de Josué de Castro,[4] que deram início à problemática alimentar/nutricional do país, traçou-se um cenário primeiramente regionalizado, dividindo o país em quatro grandes espaços: dois de fome endêmica (a Amazônia e a Zona da Mata nordestina); um de fome epidêmica (o Nordeste Semiárido) e um de subnutrição ou fome oculta (Centro-Sul). Ao longo das últimas quatro décadas, a situação nutricional da população destas regiões, embora com parâmetros desiguais para os diferentes grupos regionais, verificou-se o declínio da prevalência da desnutrição em crianças e adultos, concomitantemente ao aumento da prevalência de sobrepeso e obesidade nestas populações.

Nos espaços urbanos, a redução da deficiência estatural de crianças em função da desnutrição apresentou um declínio mais evidente e acelerado do que em relação aos espaços rurais, acarretando em um aumento ainda maior na disparidade social nos três últimos decênios do séc. XX, de 52% em 1975 para 145% em 1996.[5]

Na população adulta, representada por mulheres de 18 a 49 anos, observou-se uma redução acelerada e homogênea no número de pessoas com baixo IMC em quase todas as regiões, com exceção do Nordeste Rural, caindo até 5% na década de 80, porém apresentando um aumento especialmente nos espaços urbanos na década seguinte. Ainda assim, a única região que ainda apresentava altos índices de baixo IMC era o Nordeste Rural.

Com o rápido decréscimo da desnutrição nos espaços urbanos e rurais, o número de pessoas com sobrepeso e obesidade foi ampliado rapidamente  e de forma desigual nestes espaços. A Região Centro-Sul apresenta uma prevalência claramente mais elevada, chegando a 112%, ainda que tenha triplicado na Região Nordeste, um percentual igualmente preocupante.[5]

Condições sócio-econômicas[editar | editar código-fonte]

O processo de transição nutricional, apesar de afetar a população como um todo, parece diferenciar-se em momentos e em intensidade, conforme o segmento sócio-econômico considerado.[1]

A partir da década de 80, foi observada uma modificação na prevalência dos casos de obesidade e sobrepeso na população, com a redução de sua concentração na camada social economicamente mais favorecida, e maior manifestação na de menor renda, especialmente nas mulheres deste grupo.[6]

Ademais, a inserção da mulher no mercado de trabalho demonstra ser outro fator de importante influência no processo de transição alimentar brasileiro, uma vez que esta passa mais tempo fora de casa e dispõe de menos horas para preparar as refeições, optando por alimentos industrializados ou mesmo refeições fora do ambiente doméstico.[2]

Consequências[editar | editar código-fonte]

Doenças associadas[editar | editar código-fonte]

A mudança nos padrões alimentares carrega consigo as estatísticas da prevalência de doenças metabólicas associadas à obesidade, como dislipidemia e diabetes mellitus tipo 2, doenças cardiovasculares, problemas respiratórios e distúrbios do aparelho locomotor,[1] bem como alguns tipos de câncer, acarretando um significativo aumento de pessoas hospitalizadas em decorrência dessas doenças, o que significa grande impacto para o Serviço de Saúde Pública.

Carências nutricionais[editar | editar código-fonte]

A Hipovitaminose A parece ter reduzido sua prevalência a partir da década de 90, bem como a carência de Iodo e a consequente prevalência do Bócio, doença caracterizada pela falta deste nutriente, com níveis considerados aceitáveis desde o início dos anos 2000,[5] porém ainda com números preocupantes, de acordo com a Política Nacional de Alimentação e Nutrição, que adiciona a deficiência de Ferro como mais uma carência com níveis preocupantes na atualidade.[7]

Referências

  1. a b c Mehri, Vânia Aparecida Leandro; Frenhani, Patrícia Baston; Soares, Cristiane Stelato Rocha; Jacob, Patricia; Bernardi, Júlia Laura Delbue; Portero-McLellan, Kátia Cristina (4 de janeiro de 2012). «Estado nutricional e composição corporal de pacientes hospitalizados: reflexos da transição nutricional -». Revista Brasileira em Promoção da Saúde. 23 (1): 25–33. doi:10.5020/1167
  2. a b c Souza, Elton Bicalho de (27 de março de 2017). «Transição nutricional no Brasil: análise dos principais fatores». Cadernos UniFOA. 5 (13): 49–53. ISSN 1982-1816
  3. LANG, Regina Maria Ferreira.; NASCIMENTO, Anelise  Noronha do; TADDEI, José Augusto de Aguiar Carrazedo. A transição nutricional e a população infanto-juvenil: medidas de proteção contra o marketing de alimentos e bebidas prejudiciais à saúde. Nutrire: rev. Soc. Bras. Alim. Nutr., São Paulo, v. 34, n. 3, p. 217-229, dez. 2009. Disponível em: <http://files.bvs.br/upload/S/1519-8928/2009/v34n3/a016.pdf> acesso em 30 Mar. 2019.
  4. CASTRO, Josué de (1992). Geografia da fome. Rio de Janeiro: Griphus
  5. a b c Rissin, Anete; Batista Filho, Malaquias (2003). «Nutritional transition in Brazil: geographic and temporal trends». Cadernos de Saúde Pública. 19: S181–S191. ISSN 0102-311X. doi:10.1590/S0102-311X2003000700019
  6. Rissin, Anete; Batista Filho, Malaquias (2003). «A transição nutricional no Brasil: tendências regionais e temporais». Cadernos de Saúde Pública. 19: S181–S191. ISSN 0102-311X. doi:10.1590/S0102-311X2003000700019
  7. Brazil. Departamento de Atenção Básica. Política nacional de alimentação e nutrição 1 ed. Brasilía, DF: [s.n.] ISBN 9788533419117. OCLC 945025045

Quais foram as principais mudanças de consumo de alimentos ao longo do tempo?

As mudanças principais mostraram-se semelhantes nas regiões Nordeste e Sudeste e envolveram: 1) redução no consumo relativo de cereais, feijão, raízes e tubérculos; 2) substituição de banha, toucinho e manteiga por óleos e margarinas; e 3) aumento no consumo relativo de leite e derivados e ovos.

Quais mudanças no perfil nutricional da população foram demonstradas ao longo das últimas décadas?

O Brasil, nas últimas décadas, passou por uma transição nutricional na qual os padrões alimentares mais tradicionais, como cereais, raízes e tubérculos foram sendo progressivamente substituídos por uma alimentação mais ocidental, isto é, consumo de alimentos mais ricos em gorduras e açúcares, a qual, aliada à ...

Qual a mudança alimentar populacional brasileira de antes e atualmente?

Atualmente, a nossa alimentação foi gradativamente substituída por produtos alimentícios ultraprocessados de preparo instantâneo, tais como steaks, hambúrgueres, salsichas, massas de preparo ultrarrápido com temperos artificiais, sucos de caixa e em pó com alto nível de corantes e conservantes, refrigerantes.

Que mudanças ocorreram nos hábitos alimentares dos brasileiros?

O aumento significativo no consumo de fast food, pães e refeições instantâneas; a diminuição da ingestão de frutas e vegetais; e o crescimento das refeições noturnas são algumas das mudanças ocorridas nos hábitos alimentares e no estilo de vida dos brasileiros a partir do isolamento social ocasionado pela pandemia da ...