Por que a ascensão da China é considerada um desafio para o processo de globalização?

Desafios atuais para a pol�tica externa da china: uma reflex�o sobre o Livro Branco Sobre o Desenvolvimento Pac�fico da China

Lu�s Antonio Paulino[1]

No dia 06 de setembro de 2011, o Departamento de Comunica��o do Conselho de Estado da China divulgou o �Livro Branco sobre o Desenvolvimento Pac�fico da China�, no qual destaca que o desenvolvimento pac�fico � a escolha estrat�gica da China para realizar a moderniza��o, tornar-se forte e pr�spera e contribuir para a paz mundial e o progresso da humanidade. Trata-se de um documento de grande import�ncia para todos os que desejam compreender a estrat�gia chinesa de desenvolvimento. O documento delineia um roteiro completo do desenvolvimento futuro da China e estabelece um compromisso solene de que a China vai continuar a seguir o caminho do desenvolvimento cient�fico, independente, aberto, pac�fico, colaborador e conjunto com os demais pa�ses do mundo.

A reitera��o do caminho do desenvolvimento pac�fico tem a ver, em primeiro lugar, com a compreens�o por parte da China de que uma condi��o b�sica para a continuidade de seu desenvolvimento futuro � exist�ncia de estabilidade social interna e de um ambiente internacional pac�fico. O pr�prio Deng Xiaoping, o principal arquiteto do processo de reforma e abertura da China, afirmou que �a moderniza��o da China precisa de dois pr�-requisitos. Um � a paz internacional, e o outro � a estabilidade pol�tica interna� (apud JACQUES, 2009:157).

Um segundo motivo s�o as preocupa��es, no resto do mundo, quanto �s poss�veis conseq��ncias da ascens�o da China � condi��o de grande pot�ncia.Ap�s 32 anos de reforma e abertura, a China tornou-se a segunda economia no mundo e, mantido o ritmo atual de crescimento econ�mico, poder�, at� meados do s�culo, superar os Estados Unidos. Em 2001, o Produto Interno Bruto (PIB) chin�s era de 9,6 trilh�es de Yuan (US 1,16 trilh�o); em 2010, havia quadruplicado, para 39,8 trilh�es de Yuan (US$ 5,88 trilh�es pela taxa de c�mbio corrente). No mesmo per�odo, o com�rcio externo chin�s quase sextuplicou, de US$ 500 bilh�es para US$ 3 trilh�es. Em 2011, a corrente de com�rcio da China alcan�ou US$ 3,64 trilh�es, dos quais US$ 1,9 trilh�o corresponde a exporta��es e US$ 1,74 trilh�o a importa��es.As reservas cambiais do pa�s aumentaram de US$ 212 bilh�es, em 2001, para US$ 3,2 trilh�es em julho de 2011. O or�amento oficial de defesa passou de US$ 17 bilh�es, em 2001, a US$ 78 bilh�es, em 2010. (PEI, 2011). De acordo com Mallaby e Wethington (2012),

De acordo com o crescente coro de especialistas e economistas, a China � j� o mais prol�fico exportador mundial, o maior credor soberano, e a segunda maior economia � ir� em breve fornecer a moeda de reserva mundial. De acordo com essa vis�o, assim como o d�lar destronou a libra inglesa nos anos entre-guerras, do mesmo modo o yuan ir� em breve tomar o lugar do d�lar, golpeando os interesses dos Estados Unidos

Transforma��es de tamanho vulto fazem com que os Estados Unidos e, em menor medida, a Uni�o Europ�ia e o Jap�o se preocupem com a possibilidade de que a ascens�o chinesa possa de algum modo desafiar e corroer os seus interesses globais e regionais. Alguns pa�ses em desenvolvimento, por seu turno, avaliam at� que ponto o desenvolvimento da China no atual contexto global poderia levar a um novo hegemonismo, que sempre segue o crescimento do poder nacional, reproduzindo, assim, o antigo padr�o das rela��es Norte-Sul, danoso aos interesses dos pa�ses m�dios e pequenos.

Muito embora a China tenha reafirmado em diversas ocasi�es o seu conceito de desenvolvimento pac�fico, de mundo harmonioso e prosperidade conjunta, seja pelas experi�ncias passadas, seja pela atual situa��o global, o crescimento da China tem sido questionado e apresentado, particularmente pelos Estados Unidos, como uma amea�a, o que tem levando muitos a ver com certa desconfian�a o atual desenvolvimento da China.

Frente a esta situa��o, o livro branco procura esclarecer e reafirmar a estrat�gia chinesa de desenvolvimento pac�fico com destaque para os seguintes pontos:

O significo do caminho do desenvolvimento pac�fico da China;

Os objetivos da estrat�gia do desenvolvimento pac�fico;

A pol�tica externa da China para alcan�ar o desenvolvimento pac�fico;

Desenvolvimento pac�fico com escolha imposta pela hist�ria da China;

O significado do desenvolvimento pac�fico da China para o resto do mundo.

Antes de definir o significado do caminho do desenvolvimento pac�fico da China, o documento destaca alguns aspectos gerais do processo hist�rico de forma��o da China moderna, os quais poderiam ser resumidos nos seguintes pontos:

          A China tem uma hist�ria de quase 5.000 anos ao longo dos quais construiu uma esplendia civiliza��o e um pa�s unificado e multi-�tnico, com caracter�sticas �nicas, entre as quais se destacam sua longevidade, abertura e capacidade de inclus�o.

          Em meados do s�culo 19 as pot�ncias ocidentais for�aram a abertura da China por meio das armas e os dist�rbios internos e as agress�es externas levaram o pa�s a uma condi��o semi-colonial.

          A revolu��o democr�tica e nacionalista de 1911 p�s fim ao sistema mon�rquico sob o qual a China viveu por milhares de anos.

          Em 1949, depois da guerra civil, o povo chin�s, sob a lideran�a do Partido Comunista Chin�s, criou Rep�blica Popular da China.

          Ao longo dessas seis d�cadas desde a cria��o da Rep�blica Popular da China e particularmente depois de 1978, quando teve in�cio o processo de reforma e abertura, o governo chin�s tem feito um trabalho intenso para explorar o caminho da moderniza��o socialista de acordo com as condi��es da China e a tend�ncias atuais mundiais.

          O povo chin�s foi bem sucedido em encontrar o caminho do desenvolvimento de acordo com a realidade da China: o caminho do socialismo com caracter�sticas chinesas.

Quanto ao significado do desenvolvimento pac�fico da China, o documento afirma que, considerado em um contexto global e hist�rico mais amplo, o mesmo pode ser definido da seguinte forma:

A China deve desenvolver a si mesma por meio da defesa da paz mundial e contribuir para paz mundial por meio do seu pr�prio desenvolvimento. Deve alcan�ar o desenvolvimento por meio de seus pr�prios esfor�os e pela realiza��o de reformas e inova��es. Ao mesmo tempo, deve abrir-se para o mundo a aprender com os outros pa�ses. Deve procurar o beneficio m�tuo e o desenvolvimento comum com outros pa�ses de acordo com a tend�ncia da globaliza��o econ�mica. Deve trabalhar com outros pa�ses para construir uma paz dur�vel e a prosperidade comum. Este � o caminho do desenvolvimento cient�fico, independente, aberto, pac�fico, cooperativo e comum� (CHINA, 2011:2)

O documento define a seguir os conceitos de desenvolvimento cient�fico, independente, aberto, pac�fico, cooperativo e comum da seguinte forma:

     Desenvolvimento cient�fico significa respeitar e seguir as leis que governam o desenvolvimento da economia, da sociedade e da natureza, enfocando o desenvolvimento e libera��o das for�as produtivas.

     Desenvolvimento independente significa que como pa�s em desenvolvimento com grande popula��o a China deve confiar e apoiar-se em si mesma para alcan�ar o desenvolvimento.

     Desenvolvimento aberto significa que a China n�o pode se desenvolver com suas portas fechadas.

     Desenvolvimento pac�fico significa que o objetivo central da diplomacia chinesa � criar um ambiente internacional pac�fico e est�vel para o seu desenvolvimento; que a China n�o se envolve em agress�es ou expans�o, n�o procura a hegemonia e continua sendo uma for�a firme para a defesa da paz e estabilidade regional e mundial.

     Desenvolvimento comum tem a ver com o fato dos pa�ses serem cada vez mais interdependentes. Somente quando o desenvolvimento de todos os pa�ses � alcan�ado e mais pessoas partilham dos frutos do desenvolvimento, a paz e a estabilidade mundial t�m uma fundamenta��o s�lida e efetivamente garantida e o desenvolvimento pode ser sustent�vel em todos os pa�ses. Desta forma a China persegue uma estrat�gia de abertura e benef�cios m�tuos.

O documento prossegue afirmando que gra�as � estrat�gia de desenvolvimento pac�fico, a for�a da China tem crescido consideravelmente. O seu PIB alcan�ou US$ 5,88 trilh�es, em 2010, dezesseis vezes mais do que em 1978, representando 9,3% do produto mundial contra apenas 1,8%, em 1978.O progresso constante transformou a China em um pa�s industrializado, baseado nas tecnologias de informa��o, urbanizado, orientado para o mercado e a causa do desenvolvimento socialista tem avan�ado em todos os aspectos. O povo chin�s, antes mal vestido e mal alimentado, leva, de maneira geral, uma vida decente. A renda per capita da China aumentou de 24,9% da m�dia mundial, em 2005, para 46,8% em 2010. O sistema econ�mico passou por uma profunda transforma��o: de uma economia planejada, altamente centralizada, transformou-se em uma din�mica economia socialista de mercado, na qual a propriedade p�blica tem a lideran�a e diferentes formas de propriedade econ�mica crescem lado a lado. O mercado joga um papel cada vez mais importante na aloca��o dos recursos. Simultaneamente um sistema de seguridade social urbano e rural vai tomando forma.

Quanto aos objetivos da estrat�gia chinesa de desenvolvimento pac�fico, o documento afirma que o objetivo geral da China � promover o desenvolvimento, a harmonia dom�stica e buscar a coopera��o e a paz internacional.

No que diz respeito ao desenvolvimento interno, a China adotou uma estrat�gia em tr�s est�gios para alcan�ar a moderniza��o. O primeiro era o dobrar o PIB de 1980 para assegurar o atendimento das necessidades b�sicas do povo. O segundo era quadruplicar o PIB de 1980 para atingir um n�vel inicial de prosperidade no final do s�culo 20. Esses dois objetivos foram alcan�ados. O terceiro objetivo � elevar o PIB per capita ao n�vel dos pa�ses de desenvolvimento m�dio, de forma a trazer prosperidade geral, realizando a moderniza��o e transforma��o da China em um pa�s rico, forte, democr�tico, civilizado e harmonioso. Construir, enfim, um pa�s socialista moderno por ocasi�o do 100� anivers�rio da Rep�blica Popular da China, na metade do s�culo 21. A id�ia � que, at� 2020, a China ter� constru�do uma sociedade de alto n�vel inicial de prosperidade de uma forma completa que beneficie os mais de um bilh�o de chineses.

Nos pr�ximos cinco anos, a China se concentrar� no desenvolvimento cient�fico e na acelera��o da mudan�a no modelo de crescimento. Ser�o feitos esfor�os para alcan�ar um desenvolvimento est�vel e razo�vel da economia. Buscar� avan�ar na realiza��o de ajustamentos estrat�gicos em seu modelo de crescimento, melhorando significativamente a ci�ncia, a tecnologia e a educa��o, fazendo progressos na poupan�a de recursos naturais e na prote��o do meio-ambiente, continuando a melhorar a vida das pessoas, melhorando os servi�os sociais e aprofundando as reformas e abertura para o mundo.

Para alcan�ar tais objetivos a China se prop�e a tomar as seguintes medidas:

     Acelerar a mudan�a no modelo de crescimento econ�mico. A demanda dom�stica, especialmente o consumo, ser� estimulada pelo aumento do consumo individual e pelo ajuste e melhoramento da composi��o do investimento dom�stico. A industrializa��o, a urbaniza��o e moderniza��o da agricultura ser�o promovidas simultaneamente de forma que o crescimento econ�mico seja conduzido pelas for�as combinadas do consumo, do investimento e das exporta��es, ao inv�s dos investimentos e exporta��es apenas. Da mesma forma o crescimento deve ser conduzido pelas for�as combinadas dos setores prim�rio, secund�rio e terci�rio, ao inv�s do setor secund�rio apenas. Tamb�m ser�o feitos esfor�os para remover os gargalos ambientais que impedem o desenvolvimento.

     Explorar ainda mais os recursos pr�prios da China e a for�a de seu mercado. A China deve confiar em si mesma pra alcan�ar o desenvolvimento sustentado. Estima-se que, por volta de 2015, o n�mero de pessoas qualificadas na China ir� alcan�ar 156 milh�es; 15% da for�a de trabalho ter�o n�vel superior de educa��o e a taxa de contribui��o do pessoal qualificado para o crescimento econ�mico alcan�ar� 32%. Isso assegurar� amplo suprimento de for�a de trabalho de qualidade para sustentar o desenvolvimento econ�mico. Apesar da disponibilidade de recursos naturais per capita ser baixa, a China pode minimizar sua depend�ncia dando pleno funcionamento ao papel do mercado na aloca��o dos recursos e no progresso da pesquisa e desenvolvimento. O tamanho da popula��o e do seu produto econ�mico representa um enorme potencial de demanda dom�stica. Nos pr�ximos cinco anos, a estrutura de consumo na China ser� ainda mais melhorada e o consumo individual aumentar�, de modo que o mercado dom�stico de consumo da China vai ser um dos maiores do mundo e o volume acumulado de importa��es deve chegar a US$ 8 trilh�es, o que criar� novas oportunidades de neg�cios para outros pa�ses.

     Acelerar a constru��o de uma sociedade harmoniosa. A melhoria da qualidade de vida das pessoas � a base da harmonia social. Para alcan�ar esse objetivo a China est� acelerando a reforma do sistema social com o objetivo de melhorar os servi�os p�blicos b�sicos, desenvolver novos mecanismos de gest�o social para torn�-lo mais eficiente, melhorar a distribui��o de renda e o sistema de seguridade social. O objetivo � assegurar que as pessoas tenham direito a educa��o, emprego e sal�rio, servi�os m�dicos e atendimento � velhice e habita��o, de forma que dividam a responsabilidade de criar uma sociedade harmoniosa e desfrutem dos benef�cios do desenvolvimento de tal sociedade. O objetivo � construir uma democracia socialista de modo a transformar a China em um pa�s socialista sob o Estado de Direito e assegurar que o povo tenha controle sobre seu pr�prio destino.

     Implementa��o da estrat�gia de abertura de benef�cio m�tuo. A China manter� a pol�tica de abertura para o mundo e busca do benef�cio m�tuo. Por meio do uso total das condi��es favor�veis criadas pela globaliza��o econ�mica, a China procurar� afastar-se do foco na exporta��o e recebimento de investimento estrangeiro para colocar a mesma �nfase em importa��o e exporta��o, na absor��o de investimentos estrangeiros e na realiza��o de investimentos no exterior. Da mesma forma ir� afastar-se do foco de apenas aumentar o volume de com�rcio para melhorar a qualidade e a efici�ncia do com�rcio, e elevar a competitividade geral do com�rcio externo, ao inv�s de basear-se na produ��o de baixo custo. A estrat�gia de benef�cio m�tuo tamb�m implica dar maior prote��o dos direitos e interesses de empresas estrangeiras na China, implementar uma estrat�gia nacional de propriedade intelectual, dar maior import�ncia para investimentos no exterior, expandir a coopera��o internacional na agricultura e no desenvolvimento de outras fontes de energia, assim como continuar a abrir o mercado financeiro chin�s e o setor financeiro de forma ordenada.

     Criar um ambiente internacional pac�fico e condi��es externas favor�veis. Promover rela��es de amizade com outros pa�ses com base nos cinco princ�pios da coexist�ncia pac�fica � o principal objetivo da pol�tica externa da China. Para isso se prop�e a:

o                       Promover o di�logo estrat�gico com os pa�ses desenvolvidos de forma a promover a confian�a m�tua, aprofundar a coopera��o mutuamente ben�fica, lidar apropriadamente com as diferen�as, explorar caminhos para estabelecer e desenvolver um novo tipo de relacionamento entre os grandes pa�ses e promover o crescimento sadio, firme e de longo-prazo das rela��es da China com esses pa�ses.

o                       Promover a pol�tica de boa vizinhan�a, tratar os pa�ses vizinhos como parceiros, fortalecer as rela��es da amizade e coopera��o tanto com os pa�ses vizinhos quanto com outros pa�ses da �sia.

o                       Aumentar a unidade com outros pa�ses em desenvolvimento, aprofundando as tradicionais rela��es da amizade e expandindo a coopera��o m�tua, ajudando os outros pa�ses em desenvolvimento a alcan�ar o desenvolvimento independente, fazendo investimentos e defendendo seus direitos leg�timos e tamb�m seus interesses comuns.

A pol�tica de defesa da China � de natureza defensiva. A China tem 22.000 km de fronteira seca e 18.000 km de costa e enfrenta desafios de seguran�a tradicionais e n�o-tradicionais, bem como a amea�a do separatismo e do terrorismo, o que justifica a moderniza��o de sua capacidade de defesa de forma a proteger a sua seguran�a e proteger seu desenvolvimento pac�fico. O prop�sito fundamental de modernizar suas for�ar armadas � o de salvaguardar a soberania da China, sua integridade territorial e os interesses de desenvolvimento nacional. A China afirma que n�o se engajar� em corrida armamentista com nenhum outro pa�s e seguir� o princ�pio de n�o atacar outros pa�ses a menos que seja atacada e est� comprometida em resolver as disputas internacionais e quest�es cr�ticas por meios pac�ficos.

A pol�tica externa da China para alcan�ar o desenvolvimento pac�fico orienta-se pelos seguintes objetivos:

                     Promover a constru��o de um mundo harmonioso. Na base dessa proposta est� a id�ia de que os neg�cios internos de cada pa�s devem ser decididos pelo seu pr�prio povo, as quest�es internacionais devem ser decididas por meio de consultas em p� de igualdade e o direito de todos os pa�ses de participar equitativamente nos neg�cios internacionais deve ser respeitado e defendido. Economicamente, os pa�ses devem cooperar uns com os outros, apoiarem-se na for�a uns dos outros e fazerem a globaliza��o econ�mica equilibrada e um processo que beneficie todos os pa�ses. No que diz respeito ao meio-ambiente a China defende o principio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas e o fortalecimento da coopera��o internacional na prote��o ambiental e na abordagem das mudan�as clim�ticas.

   Buscar uma pol�tica externa independente de paz. A base sobre a qual repousa a pol�tica externa da China s�o os cinco princ�pios da coexist�ncia pac�fica, a saber:

1.                    Respeito m�tuo pela integridade territorial e soberania;

2.                    N�o agress�o m�tua;

3.                    N�o interfer�ncia m�tua nos assuntos internos;

4.                    Igualdade e benef�cio m�tuo;

5.                    Coexist�ncia pac�fica.

Com base nesses princ�pios, a China reafirma que o seu sistema social e pol�tico � o socialismo com caracter�sticas chinesas � � o caminho do desenvolvimento escolhido por seu pr�prio povo. N�o aceita, portanto, a interfer�ncia de for�as externas em seus neg�cios internos. Op�em-se a qualquer pr�tica de agress�o aos pa�ses menores, bem com a opress�o dos mais fracos pelos mais fortes e qualquer forma de hegemonismo ou pol�tica de pol�tica de poder. Afirma que n�o usa sua ideologia ou sistema pol�tico como base para determinar o tipo de rela��o que ter� com outros pa�ses e respeita o direito de cada povo escolher de forma independente seu pr�prio sistema social e caminho do desenvolvimento. Defende que as disputas e conflitos internacionais sejam resolvidos por meio de conversas e consultas e pela procura de bases comuns, colocando de lado as diferen�as. Sem querer impor sua pr�pria vontade procura agir em fun��o dos interesses do povo chin�s.

Os principais interesses da China que orientam sua pol�tica externa s�o: a soberania do estado, a integridade territorial e a reunifica��o nacional, o sistema pol�tico escolhido pela Constitui��o da China e a estabilidade social geral e as salvaguardas b�sicas para garantir a sustentabilidade econ�mica e social.

     Promover um novo pensamento sobre a seguran�a baseado na confian�a e no benef�cio m�tuo, na igualdade e na coordena��o. A China prop�e que esse novo pensamento sobre seguran�a busque uma seguran�a abrangente, comum e cooperativa.

Em termos de abrang�ncia, entende que a quest�o da seguran�a tem novas dimens�es na medida em que as amea�as tradicionais e n�o-tradicionais � seguran�a tornaram-se mais entrela�adas nas novas condi��es hist�ricas, o que exige dos diversos pa�ses trabalharem em conjunto para enfrentar os novos desafios � seguran�a.

No que diz respeito � seguran�a comum entende que todos os pa�ses partilham interesses comuns na era da globaliza��o econ�mica e que todos os pa�ses devem salvaguardar sua pr�pria seguran�a e respeitar as preocupa��es de seguran�a dos demais. Defende que se abandone a mentalidade da Guerra Fria e o confronto entre blocos de pa�ses e que se defenda a seguran�a comum por meio da coopera��o multilateral e o trabalho comum para se evitar conflitos e guerras. Defende o fortalecimento do papel da ONU na manuten��o da paz mundial.

No que tange � seguran�a cooperativa entende que guerras e viol�ncia levam apenas a mais guerras e mais viol�ncia e que o di�logo e a coopera��o s�o o �nico caminho efetivo e confi�vel para resolver as disputas.

     Estar � altura de suas responsabilidades internacionais. A China entende que como pa�s mais populoso do mundo, governar-se bem � a sua mais importante responsabilidade internacional, mas entende que deve assumir maiores responsabilidades internacionais na medida em que sua for�a e influ�ncia geral aumentem.

     Promover a coopera��o regional e as rela��es de boa-vizinhan�a. A China procura aumentar a coopera��o amistosa com seus vizinhos e trabalhar com eles para promover uma �sia harmoniosa. Entende que os pa�ses da regi�o devem aumentar o com�rcio e coopera��o m�tua, promover a integra��o econ�mica regional, melhorar os atuais mecanismos regionais e sub-regionais de coopera��o, estar abertos a outras propostas de coopera��o regional e serem receptivos � participa��o de pa�ses de fora da regi�o para jogar um papel construtivo na promo��o da paz regional e do desenvolvimento. A China n�o busca a hegemonia regional nem busca estabelecer uma esfera de influ�ncia e n�o quer excluir nenhum pa�s de participar da coopera��o regional. A China entende que sua prosperidade, desenvolvimento e estabilidade de longo prazo representam mais oportunidade do que uma amea�a para seus vizinhos. A China defende o direto de a �sia sustentar-se sobre seus pr�prios p�s e partilhar o bem-estar e as afli��es.

No que diz respeito ao desenvolvimento pac�fico com escolha imposta pela hist�ria da China o documento destaca os seguintes pontos:

     O desenvolvimento pac�fico leva adiante a tradi��o hist�rica e cultural da China. O documento lembra que a famosa �Rota da Seda� era um caminho de com�rcio, de interc�mbio cultural e de paz, o que testemunha a busca da amizade e da coopera��o mutuamente ben�fica com outros pa�ses na China antiga.Lembra ainda que o famoso navegador da dinastia Ming, Zheng He, fez sete viagens aos mares ocidentais, visitando mais de 30 pa�ses e regi�es na �sia e na �frica, levando com ele a nata da cultura e da tecnologia chinesa, bem como a mensagem de paz e amizade. Imbu�da do esp�rito de que todos devem ser inclusivos, como o oceano que recebe centenas de rios, a na��o chinesa tem procurado abra�ar tudo que � bom das culturas estrangeiras.

     O desenvolvimento pac�fico � uma imposi��o das condi��es nacionais b�sicas da China. A China tem uma grande popula��o, mas possui uma base econ�mica fraca. Tem de alimentar perto de 20% da humanidade, mas disp�e apenas de 7,9% da terra ar�vel e 6,5% da �gua pot�vel do Planeta. A renda per capita da China � de US$ 4.400,00, o que coloca a China no 100� lugar no mundo. Um desenvolvimento desbalanceado ainda persiste entre as �reas rurais e urbanas e entre as diversas regi�es da China. Os problemas estruturais econ�micos e sociais permanecem agudos e o crescimento econ�mico, baseado no uso intensivo de recursos naturais � crescentemente constrangido pela escassez desses recursos e por problemas ambientais. Isso tudo faz com que mudar o modelo de desenvolvimento seja uma tarefa dif�cil. A capacidade de inova��o independente da China � fraca e ela est� ainda nos patamares mais baixos da cadeia de valor tanto na divis�o internacional do trabalho quanto do com�rcio internacional. O padr�o de vida do chin�s n�o � alto; o sistema de seguridade social � inadequado, muito abaixo dos pa�ses desenvolvidos. O desenvolvimento da China � um processo de longo prazo e a China continuar� como um pa�s em desenvolvimento durante muito tempo, o que significa que a China deve dedicar-se a avan�ar seu processo de moderniza��o, promovendo o desenvolvimento e melhorando o sustento de seu povo. Isso exige manter um ambiente internacional pac�fico e est�vel e estimular trocas internacionais e coopera��o. A paz � cr�tica para seu desenvolvimento e a China n�o tem nenhum motivo para desviar-se do caminho pac�fico.

     O desenvolvimento pac�fico � uma escolha que representa uma tend�ncia global. A paz e o desenvolvimento s�o as duas quest�es mais importantesdo mundo atual. O mundo caminha para a multipolaridade e a globaliza��o econ�mica ganha impulso. A globaliza��o econ�mica tornou-se uma tend�ncia importante na evolu��o das rela��es internacionais, interconectando cada vez mais estreitamente os diferentes membros da comunidade internacional. Uma nova guerra mundial seria desastrosa para todos. Os desafios globais tornarem-se a maior amea�a para o mundo. A quest�o da seguran�a comum se torna uma quest�o cada vez mais severa. Isso inclui o terrorismo, a dissemina��o de armas de destrui��o em massa, as crises financeiras globais, os desastres naturais, as mudan�as no clima e a seguran�a de energia, recursos naturais, alimentos, sa�de p�blica. A tend�ncia em dire��o � multipolaridade � irresist�vel, na medida em que as economias emergentes, a �sia e outras regi�es v�o se tornando cada vez mais fortes. A comunidade internacional deveria, portanto, rejeitar o jogo de soma zero, que foi um subproduto das velhas rela��es internacionais e da mentalidade da guerra fria.

Quanto ao significado do desenvolvimento pac�fico para o resto do mundo, o documento afirma que o desenvolvimento pac�fico da China quebrou o velho paradigma de que uma pot�ncia em crescimento busca necessariamente a hegemonia. O documento destaca que na hist�ria moderna, algumas pot�ncias em ascens�o � leia-se Europa, Estados Unidos e Jap�o � estabeleceram col�nias, lutaram por esferas de influ�ncia e conduziram a expans�o militar contra outros pa�ses. Tal processo chegou ao cl�max no s�culo 20, quando a disputa por hegemonia e a confronta��o militar jogaram a humanidade no abismo de duas guerras mundiais. Com base na an�lise de sua tradi��o cultural e hist�rica de milhares de anos, da natureza da globaliza��o econ�mica, das mudan�as nas rela��es internacionais e do panorama da seguran�a internacional no s�culo 21, assim como dos interesses e valores comuns da humanidade, a China entende que o desenvolvimento pac�fico e a coopera��o mutuamente ben�fica s�o os caminhos fundamentais para realizar sua moderniza��o, participar dos neg�cios internacionais e lidar com as rela��es internacionais. A China n�o pode se desenvolver isolada do resto do mundo.

Conclus�o

Dentre os diversos aspectos que chamaram aten��o na an�lise deste documento podemos destacar, � guisa de conclus�o, os seguintes pontos:

A China � uma civiliza��o. Mais do que um estado-na��o, no sentido que atribu�mos ao termo no Ocidente, a China �, antes de tudo, um estado-civiliza��o, com mais de cinco mil anos de hist�ria e uma poderosa heran�a cultural. Nenhum povo � mais ligado ao seu pr�prio passado do que o povo chin�s. A China � o mais antigo pa�s do mundo. Quando, em janeiro de 2012, os chineses comemoram sua mais importante festa popular anual, o Ano Novo Chin�s, celebravam o ano 4710 do calend�rio lunar chin�s. O calend�rio gregoriano s� foi adotado na China com a instaura��o da Rep�blica, em 1911. Mesmo se considerarmos a China como pa�s apenas a partirda unifica��o de seu territ�rio, que ocorreu no ano 221 a.C., quando o imperador Qin Shihuangdi conquistou os estados vizinhos, fundou a dinastia Qin, unificou a escrita, estabelecendo as bases de uma identidade central entre povos que falavam idiomas diferentes, ainda assim teremos um pa�s com exist�ncia cont�nua de mais de 2.200 anos. Ao longo desses mil�nios, a China sofreu invas�es de povos vizinhos, como os mong�is, no s�culo 13, e os manchus, no s�culo 17, ora esteve politicamente unificada, ora esteve dividida, mas nunca deixou de ser a China, tal qual a conhecemos hoje. Paradoxalmente, o resultado dessas invas�es foi a incorpora��o dos territ�rios dos invasores ao imp�rio chin�s. Esses povos invasores, militarmente mais fortes, mas com uma cultura menos sofisticada, assimilaram a cultura chinesa, chegando a formar dinastias chinesas, como a dinastia Yuan (1271-1368), dos mong�is, ou a dinastia Qing (1644-1911), dos manchus. Nos dois casos, entretanto, os neg�cios de estado continuaram a ser conduzidos pela burocracia chinesa, formada por oficiais chineses, da etnia Han, altamente qualificados � os mandarins � recrutados pelo milenar sistema de concursos p�blicos e treinados de acordo com os preceitos do confucionismo, que enfatizava, sobretudo, o cultivo da harmonia social. Tal situa��o se alterou a partir de meados do s�culo 19, quando a China foi, pela primeira vez, agredida pelas pot�ncias ocidentais, nomeadamente a Inglaterra. Com as chamadas �Guerras do �pio� (1839-1842/1856-1860), o que as pot�ncias ocidentais pretendiam n�o era propriamente invadir o territ�rio chin�s com o prop�sito de tomar o poder ou instituir uma nova dinastia, mas colocar em xeque o auto-atribu�do papel da civiliza��o e da na��o chinesas como o centro do mundo civilizado e reduzi-la a uma situa��o semi-colonial. Vieram para impor aos chineses uma nova ordem mundial, onde a China deixaria de ser o �Imp�rio do Meio� (Zhong Guo,

Por que a ascensão da China é considerada um desafio para o processo de globalização?
), como at� hoje os chineses chamam o seu pa�s, e passaria � condi��o de periferia de um novo centro: a Inglaterra. � interessante observar que mesmo ap�s essas agress�es externas � primeiro do Ocidente, depois do Jap�o � o fato da China ter se mantido relativamente isolada do resto do mundo lhe permitiu preservar as caracter�sticas essenciais de sua civiliza��o milenar, mesmo que econ�mica e militarmente submetida pelo Ocidente. N�o deixa de ser ir�nico, portanto, que exatamente no momento que a ascens�o chinesa a recoloca novamente no �centro do mundo�, o grande risco que a China enfrenta � de, apesar de sua renovada for�a econ�mica e militar, poder sucumbir culturalmente ao dom�nio do Ocidente. O fato de express�es da arte e da cultura ocidentais j� fazerem sombra � cultura tradicional chinesa, a ponto de filmes como �Avatar� e �Transformers 3� seremcampe�es de bilheteria na China e as m�sicas da cantora pop americana Lady Gaga serem t�o populares entre os jovens chineses quanto as dos principais cantores pop do pa�s, s�o sinais de que a influ�ncia cultural do Ocidente � cada vez mais forte na China. Tais fatos n�o passam desapercidos pelos dirigentes chineses. No sexto pleno do Comit� Central do Partido Comunista Chin�s, realizado, em outubro de 2011, foi discutida a necessidade de aumentar a �seguran�a cultural� da China. Na ocasi�o, o presidente Hu Jianto fez um discurso, publicado, em dezembro de 2011, na revista Quishi (Buscando a Verdade), do Partido Comunista Chin�s, no qual, segundo tradu��o da Associated Press, afirma:

Precisamos perceber claramente que for�as hostis internacionais est�o intensificando a conspira��o estrat�gica de ocidentaliza��o e divis�o da China, que os campos ideol�gico e cultural s�o �reas focais de sua infiltra��o no longo prazo. [�] N�s dever�amos entender profundamente a seriedade e complexidade dessa batalha ideol�gica, sempre soar os alarmes e permanecer vigilantes, e tomar medidas en�rgicas para estar em guarda e responder� (WONG, 2012).

A civiliza��o chinesa, diferentemente da civiliza��o ocidental, nunca teve um car�ter pros�lito ou expansionista, at� porque sempre foi laica, limitando-se, ao longo de mil�nios, a preservar seus valores e a medir os outros pela maior ou menor identidade e conformidade com seus valores, mas sem a pretens�o de convert�-los. Isso funcionou bem enquanto a China esteve relativamente isolada do resto do mundo, interagindo com povos vizinhos que em maior ou menor medida partilhavam de valores culturais semelhantes. A quest�o que se coloca agora � como a China, cada vez mais aberta e integrada ao mundo globalizado, reagir� frente a uma cultura ocidental que procura de forma agressiva impor seus valores culturais e pol�ticos (individualismo, pluripartidarismo, democracia eleitoral) como valores universais. Na impossibilidade e mesmo na falta de interesse da China em deixar o mundo mais parecido com ela, conseguir� se proteger do desejo do Ocidente de tornar a China mais parecida com ele? E caso n�o consiga faz�-lo, quais ser�o as conseq��ncias a m�dio e longo prazo sobre seu sistema pol�tico e social?

A China � um pa�s pac�fico. Chama aten��o que durante esses mais de dois mil�nios, a hist�ria da China tenha sido marcada por lutas permanentes pela preserva��o da sua integridade territorial e de sua cultura. No per�odo din�stico, a China foi invadida diversas vezes por povos estrangeiros: os mong�is, no s�culo 13, e os manchus, no s�culo 17. No s�culo 19, ainda na dinastia Qing, a China sofreu as primeiras agress�es das pot�ncias imperialistas ocidentais: as duas Guerras do �pio (1839-1842;1856-1860). J� no per�odo Republicano, iniciado em 1911, a China sofreu a invas�o japonesa (1937-1945). N�o h� registro, contudo, de nenhuma a��o militar de car�ter imperialista por parte da China com o prop�sito de estabelecer col�nias estrangeiras, como fizeram os pa�ses da Europa e os Estados Unidos na Am�rica Latina, na �frica e na �sia e o Jap�o, na �sia. A China � um estado multi-�tnico. S�o 56 etnias na China, dentre as quais a etnia Han � a maior e corresponde a 92% da popula��o chinesa. Os atuais limites territoriais da China correspondem, aproximadamente, �queles estabelecidos no in�cio da dinastia Qing, em 1644. A China atingiu sua maior extens�o durante o s�culo 18, quando a �rea total de seus territ�rios alcan�ava 13 milh�es de km2. Al�m do atual territ�rio, de 9,6 milh�es de km2, inclu�a a Mong�lia. Historicamente, a China tem se limitado a defender a sua integridade territorial contra movimentos de car�ter separatista, como no caso de Taiwan e do Tibet, e agress�es externas, como a invas�o japonesa.

A China � ainda um pa�s dividido. Ao longo dos seus quase cinco mil anos de hist�ria a China esteve ora unificada, ora dividida. Mesmo ap�s a unifica��o de seu territ�rio, no ano 221 a.C., na dinastia Qin, a China passou por momentos de divis�o, provocados ou por lutas internas ou agress�es externas. Desde a implanta��o da Rep�blica Popular da China, em 1949, o governo chin�s se esfor�a para reunificar seu territ�rio trazendo para o rega�o da na��o chinesa aqueles territ�rios que por uma raz�o ou outra foram separados da p�tria m�e. Com a recupera��o da soberania sobre Hong Kong, em 1997, depois de 155 anos de dom�nio ingl�s, e sobre Macau, depois de 400 anos de coloniza��o portuguesa, resta, ainda, a quest�o de Taiwan. Por mais de 2 000 anos, Taiwan faz parte da China, tendo passando por per�odos de maior ou menor autonomia administrativa. No s�culo XVI, os portugueses chegarm � ilha e a nomearam "Formosa". Depois de passar por um curto per�odo de dom�nio dos espanh�is foi parcialmente colonizada pelos holandeses, no s�culo XVII, antes de ser reocupada pelo imp�rio chin�s durante a dinastia Qing. Por ocasi�o da Primeira Guerra Sino-Japonesa, em 1895, Taiwan foi ocupada pelo Jap�o. Ap�s a derrota do Jap�o, ao final da II Guerra Mundial Mundial, Taiwan retornou ao controle da Rep�blica da China. Em maio de 1950, ap�s a derrota das for�as do Kuomintang na guerra civil que levou � cria��o da Rep�blica Popular da China, as for�asnacionalistas do General Chiang Kai-Shek, refugiaram-se na ilha e ali estabeleceram a sede administrativa do governo separatista. Apesar de n�o ser reconhecida pela ONU e pela maioria esmagadora dos pa�ses, Taiwan permanece formalmente separada da China, gra�as, sobretudo, ao apoio militar dos Estados Unidos, que considera a ilha uma esp�cie de protetorado americano. Em sua estrat�gia de conter a influ�ncia da China e manter a hegemonia americana na �sia e no Pac�fico, os Estados Unidos ve�m Taiwan como uma esp�cie de porta-avi�es inafund�vel que eles podem manter na costa chinesa.Enquanto Taiwan n�o retornar para o rega�o da p�tria chinesa, a China continuar� sendo um pa�s dividido. Mesmo consciente de que um mundo pac�fico � fundamental para o desenvolvimento da China, uma virtual declara��o de independ�ncia de Taiwan possivelmente seria a �nica coisa capaz de levar a China � uma guerra na atualidade. Como destaca Jacques (2009:210):

Uma das mais fundamentais caracter�sticas da pol�tica chinesa diz respeito � grande �nfase colocada na unidade do territ�rio. Isso permanece de longe a quest�o mais importante na vida pol�tica chinesa. Sua origem repousa n�o no curto per�odo em que a China tornou-se um estado-na��o, mas na experi�ncia e na id�ia da civiliza��o chinesa. O fato de que a China tenha passado tanto tempo de sua hist�ria sob v�rios graus de desuni�o, e a um custo t�o elevado, ensinou aos chineses que a unidade � sacrossanta...todo chin�s � parte da civiliza��o chinesa e portanto da China. N�o se trata de uma quest�o de escolha.

A China � um pa�s socialista. Em que pese a import�ncia cada vez maior do setor privado e dos mecanismos de mercado na gera��o da renda e do emprego na China, isso n�o quer dizer que a China esteja necessariamente enveredando para a restaura��o ou instaura��o do capitalismo. Como afirma Arrighi (2007: 17), �[...] a confus�o que cerca as reforma de Deng � sintom�tica dos equ�vocos a cerca da rela��o entre economia de mercado, capitalismo e desenvolvimento econ�mico.� Ainda segundo o autor, �A despeito da expans�o das trocas de mercado em busca do lucro, a natureza do desenvolvimento da China n�o � necessariamente capitalista� (ARRIGHI, 2007: 24) uma vez que �O capitalismo apenas triunfa quando ele se torna identificado com o Estado� (ARRIGHI, 2007: 92) o que, evidentemente, n�o � caso da China, que n�o possui uma classe capitalista no poder. �At� que o princ�pio do igual acesso � terra continue a ser reconhecido e implementado, n�o � tarde demais para que a a��o social na China contempor�nea oriente a evolu��o em uma dire��o n�o-capitalista.�(ARRIGHI, 2007: 24).Em que pese a emerg�ncia de uma pr�spera classe empresarial, o poder pol�tico na China permanece firme nas m�os do Partido Comunista Chin�s e os setores chave da economia chinesa permanecem como propriedade estatal. Com a pol�tica de reforma e abertura iniciada em 1978, aprofundada com a implanta��o da estrat�gia de �economia socialista de mercado�, a partir de 1992, o Partido Comunista Chin�s conseguiu conduzir a transi��o da economia chinesa para uma economia de mercado sob o seu comando pol�tico. Manteve, assim, as caracter�sticas essenciais do modelo pol�tico implantado na revolu��o de 1949, baseado na propriedade p�blica dos meios de produ��o e no controle do Estado sobre a estrat�gia de desenvolvimento.

A China � um pa�s em desenvolvimento. Os avan�os sociais e econ�micos da China, particularmente a partir do processo de reforma e abertura iniciado em 1978, foram enormes e logram tirar da pobreza mais de 400 milh�es de pessoas. Mas a China continua a ser um pa�s relativamente pobre, com uma renda per capita de apenas 4.400 d�lares, menos que a metade da renda per capita do Brasil. Mesmo na condi��o de pa�s em desenvolvimento a China tem sido muito ativa na ajuda a outros pa�ses em desenvolvimento, particularmente os mais pobres, mas � preciso considerar a dura tarefa que a China tem para oferecer emprego e condi��es adequadas de vida para cerca de 20% da humanidade.

A China � uma pot�ncia regional. Em que pesem as crescentes responsabilidades globais a que a China � chamada pela sua condi��o de pot�ncia � preciso considerar que a China �, sobretudo, uma pot�ncia regional, cujas principais preocupa��es geopol�ticas dizem respeito � defesa da integridade e unifica��o territorial e � manuten��o de um ambiente de coopera��o m�tua no Leste e Sudeste da �sia. Essa coopera��o regional se traduz tanto na crescente integra��o econ�mica com os pa�ses de Leste e Sudeste da �sia, quanto no esfor�o empreendido nos �ltimos anos para resolver pacificamente disputas hist�ricas de fronteiras cuja origem est� na forma arbitr�ria como as pot�ncias colonialistas, particularmente a Inglaterra, estabeleceram os limites de suas ex-col�nias na �sia no s�culo passado. As principais disputas de fronteira foram resolvidas de forma pac�fica.A integra��o econ�mica entre a China e seus vizinhos do Leste e Sudeste Asi�tico pode ser constatada n�o s� pelo crescente volume de com�rcio bilateral, mas, sobretudo, pelos elevados d�ficits comerciais que a China apresenta no com�rcio com seus vizinhos. Em 2011, a China apresentou d�ficit no com�rcio com Taiwan (US$ 89,81 bilh�es), Cor�ia do Sul (US$ 79,79 bilh�es), Jap�o (US$ 46,29 bilh�es), Mal�sia (US$ 34,25 bilh�es), Tail�ndia (US$ 13,34 bilh�es), Filipinas (US$ 3,75 bilh�es) e Indon�sia (US$ 2,08 bilh�es).Evidentemente ainda h� pend�ncias, particularmente, em torno da soberania do Mar do Sul da China envolvendo o Vietn�, Filipinas, Mal�sia e Brunei e cujas repercuss�es t�m alcance global. O Mar do Sul da China tem import�ncia econ�mica e estrat�gica que transcende os interesses regionais. Conforme destaca Pereira (2003), todas as rotas mar�timas que ligam o Nordeste Asi�tico e a zona Ocidental do Pac�fico ao Oceano �ndico e ao Oriente M�dio atravessam o Mar do Sul da China; mais de 80% do petr�leo com destino ao Jap�o, Cor�ia do Sul e Taiwan � transportado via Mar do Sul do China. Al�m disso, pensa-se que o Mar do Sul da China poder� conter uma larga variedade de recursos energ�ticos, incluindo petr�leo e g�s natural, e minerais. Segundo Hill (2012):

A recente decis�o dos Estados Unidos de iniciar o desengajamento das guerras no sul da �sia e no Oriente M�dio e concentrar-se no Leste da �sia (�o piv��, como foi apelidado) parece ser um esfor�o para confrontar a China com rela��o a suas estridentes afirma��es de soberania no Mar do Sul da China.

Dentre os principais desafios da pol�tica externa da China, certamente a necessidade de manter uma rela��o construtiva e est�vel com os Estados Unidos � a mais dif�cil, delicada e principal delas. Primeiro porque a ascens�o da China representa um desafio real � hegemonia americana na �sia e aos seus interesses econ�micos. A China insiste na tese da multipolaridade, mas s�o muitos os que defendem, principalmente nos Estados Unidos, a tese do chamado G2, ou seja, uma nova vers�o do mundo bipolar, mas tendo a China com rival estrat�gico dos Estados Unidos. � mais ou menos nesses termos que os Estados Unidos atualmente definem sua rela��o com a China.� inevit�vel, portanto, que os Estados Unidos vejam com suspei��o o fortalecimento econ�mico e militar da China e encarem o discurso da China em defesa do desenvolvimento pac�fico como mero exerc�cio de ret�rica para n�o chamar aten��o sobre seu fortalecimento. Segundo porque os Estados Unidos s�o o �nico pa�s do mundo com capacidade real de criar dificuldades importantes para o desenvolvimento chin�s num futuro previs�vel, seja por meio de agress�es militares, seja pela depend�ncia que a China ainda tem em rela��o ao mercado americano como destino de boa parte de suas exporta��es,seja pela depend�ncia da China em rela��o a empresas americanas como fornecedores de tecnologia de ponta, seja pela capacidade dos Estados Unidos de articular alian�as regionais na �sia que possam de alguma forma desestabilizar o ambiente regional de coopera��o que a China tenta construir. Em 2011, os EUA foram o principal parceiro comercial da China, com corrente de com�rcio de US$ 446,65 bilh�es e saldo positivo para a China de US$ 202,34 bilh�es. Evitar a confronta��o com os Estados Unidos, sem, no entanto, mostrar-se fraca ou subserviente frente � arrog�ncia americana � o fio na navalha sobre o qual a pol�tica externa chinesa precisa caminhar. Conforme destaca Hill (2012),

Quarenta anos atr�s, os chineses preocupavam-se com as maquina��es sovi�ticas para isolar o seu pa�s. Hoje, h� uma preocupa��o atualizada � expressada nos blogs chineses e por uma crescentemente assertiva jovem gera��o � que o governo da China est� deixando os Estados Unidos fazerem a mesma coisa.

Nesse sentido a estrat�gia de desenvolvimento pac�fico, longe de representar um slogan vazio, � uma estrat�gia cuidadosamente considerada e cujos pilares principais foram expostos neste artigo.

Bibliografia

ARRIGHI, G. Adam Smith in Beijing.London: Verso, 2007.

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Como o processo de globalização beneficiou a economia chinesa?

Graças a uma dinâmica de crescimento sustentado comparável, em intensidade, à do Japão entre 1950 e 1975 (mais de 9% ao ano), a China se tornou a primeira economia em paridade de poder de compra (PPC) e a segunda em taxas de câmbio correntes.

Como a China influencia a globalização?

Graças ao seu desempenho, a economia chinesa tem contribuído com cerca de 25 a 35% do crescimento mundial na última década (o dobro da participação dos EUA). A China tem 40% do mercado global de contêineres (ante 18% dos EUA), e 7 dos 10 principais portos marítimos mundiais (o maior dos EUA é o de Los Angeles, o 17º).

Por que dizer que a China é um país que integra o processo de globalização?

O país tem exercido grande influência política, militar e econômica no cenário regional e internacional graças a fatores determinantes, como grande extensão de seu território (ocupa o terceiro lugar em dimensão), elevadíssimo número de habitantes (cerca de 1,3 bilhão, o mais populoso do mundo) e dinamismo de sua ...

Por que podemos dizer que a globalização é um desafio?

Resposta verificada por especialistas A globalização tem um ponto negativo muito importante, que é a desigualdade e a má distribuição de renda. Deste modo, países como o Brasil que estão em escala emergente, apesar de seu crescimento, ainda tem um alto nível de pobreza e carência em diferentes setores.