Memórias Póstumas de Brás Cubas é uma das mais importantes obras de Machado de Assis. Publicado em 1881, é considerado um marco na literatura brasileira, pois inaugurou o movimento artístico do realismo no Brasil. Show
Trata-se de uma autobiografia de Brás Cubas, narrador-personagem, que nos conta, em 1ª pessoa, a história de sua vida a partir de suas memórias – póstumas, pois é depois de morto que ele relembra aquilo que viveu. O fato de estar já falecido também contribui para que o personagem narre os fatos sem medo de represálias ou julgamentos, fazendo uso de uma ironia mordaz. Como de praxe nos romances e contos de Machado de Assis, o enredo é banal e cotidiano, mas é a partir desses acontecimentos aparentemente sem relevância que o autor trabalha, fazendo uso do deboche, temas universais e pertinentes à sociedade brasileira. Contexto históricoBrás Cubas nasceu em 1805 e faleceu em 1869, ano em que escreveu, portanto, suas memórias. Com a chegada da família real, em 1808, o Rio de Janeiro tornou-se a corte oficial, urbanizando-se. O Brasil do século XIX era agrário, patriarcal e escravocrata. A alta sociedade carioca era composta de proprietários rurais senhores de escravos – parcela da qual fazia parte o próprio Brás Cubas. A temática da escravidão é abordada no romance, com especial destaque para os trechos relativos à infância do narrador:
O livro foi publicado em 1881, época em que os ideais do romantismo, tendência artística predominante no início do século, já se viam em franca decadência: as aspirações de liberdade e sentimentalidade foram substituídas pela objetividade e pelo cientificismo, isto é, a crença no progresso a partir do desenvolvimento científico. Cresciam na Europa a industrialização e os centros urbanos, transformando drasticamente a maneira como os cidadãos viviam e interagiam com o meio. A arte, acompanhando os passos da modernização e à luz da ciência, passou a optar por uma representação objetiva da realidade. Nascia, portanto, o realismo, uma escola analítica, que privilegiava, entre outros aspectos, a abordagem psicológica das angústias humanas e daquilo que há de menos ideal e mais vil em nossa espécie – e é esse o caso de Memórias Póstumas. Leia também: Mario Quintana: o poeta das coisas simples Personagens
Veja também: Carlos Drummond de Andrade: um grande nome da poesia brasileira Resumo e análise da obraÉ célebre a dedicatória das Memórias Póstumas de Brás Cubas: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”. Já na primeira página do romance, portanto, fica evidente o pessimismo e a ironia que atravessam a obra, estruturada em 160 microcapítulos, uma marca estilística de Machado de Assis. Brás Cubas inicia a narrativa de suas memórias pelo momento em que ele morreu, e não pelo seu nascimento – uma primeira sugestão da inversão de valores que delineia o personagem. Depois de morto, ele resolve contar a história de sua vida, selecionando os acontecimentos que entende como mais relevantes. Trata-se de uma narrativa de fragmentos, digressiva e psicológica, pois Brás Cubas não segue uma linearidade fixa ao mencionar os episódios de sua vida: começa pela descrição do funeral, depois menciona o que o levou a adoecer e o delírio que teve antes de expirar, e passa então a narrar episódios de sua infância. O livro estrutura-se, portanto, na ordem em que os fatos lhe vêm à memória e privilegia a abordagem psicológica, sendo carente em descrições de paisagens e rico em descrições da interioridade do personagem. Veja:
Nota-se, no trecho acima, algo que se repete ao longo de toda a narrativa: o narrador dirige-se diretamente ao leitor, um recurso narrativo que é marca das obras machadianas e que aproxima o leitor daquilo que está sendo narrado, como se fosse uma conversa. Criança rica, foi mimada pelos pais e pelos parentes – tio João e tio Idelfonso (que era cônego). Filho de abastados proprietários de terras, foi uma criança travessa e maldosa: maltratava os escravos e não respeitava os adultos. A infância não idealizada é um dos aspectos que apontam para o realismo na obra de Machado: longe de toda pureza, Brás Cubas era apelidado “menino-diabo” e suas maldades eram acobertadas por seu pai. Quando rapaz, apaixonou-se por Marcela, moça de muitos rapazes e de muitos interesses financeiros. “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos réis; nada menos.”, diz Brás Cubas. Há uma clara diferença com os textos românticos: o amor, aqui, nada tem de idealizado, mas é até contabilizado em dinheiro. Ao saber do montante gasto, o pai de Brás Cubas enviou-o para Coimbra, para que estudasse Direito e se tornasse um homem menos frívolo. Mas a mediocridade de espírito do privilegiado Brás Cubas manteve-se: decorou uma ou outra expressão latina e saiu da universidade tão medíocre quanto era antes. De volta ao Brasil, conheceu Eugênia, moça bela, a única personagem de caráter honrado e sólido em todo o romance. Brás Cubas mostrou-se interessado por ela – mas a moça era filha de mãe solteira, sem pai declarado, e pobre, impeditivos para realização de um casamento com alguém da estirpe social de Brás. Ele, aventureiro, seduz a moça e ela lhe concede um beijo. Mas ao descobrir que Eugênia tem uma perna maior do que a outra, desaparece, por considerar ridícula a ideia de se casar com uma moça coxa. Sendo o sonho do pai de Brás Cubas vê-lo no cargo de ministro, arranja-lhe como pretendente a moça Virgília, parte de família de grande prestígio social, o que lhe alavancaria a carreira na política. Mas Brás Cubas, apático e indiferente à situação, acaba perdendo a noiva e o cargo para Lobo Neves. Os dois reencontram-se depois de algum tempo e tornam-se amantes. Para abafar os escândalos do adultério, arranjam uma casa e empregam D. Plácida, uma senhora que não tinha onde viver nem como se manter, para ajudar a acobertar os encontros do casal. Ela, por sua vez, considera-se envergonhada, mas não tem outra opção a não ser aceitar esse emprego – mais uma vez o tema da exploração está presente, bem como a dependência financeira que rege todas as escolhas e relações. Os burburinhos a respeito do adultério não cessam, então Sabina, irmã de Brás, arranja-lhe a moça Eulália para que os dois se casem. Esta, por obra do acaso, adoece e morre antes do casamento. Diante de uma velhice solitária e sem nenhum feito relevante na vida, Brás Cubas vê-se rodeado com uma “ideia genial”: a de criar um emplasto que combatesse a hipocondria e sanasse a melancolia da humanidade. No entanto, a proposta não era filantrópica – ele queria ver seu nome impresso em todos os frascos: “Emplasto Brás Cubas”. Foi com essa ideia que o protagonista contraiu uma gripe que não tratou corretamente e agravou-se, levando à pneumonia que o matou. Veja o capítulo final, que se encerra com o mesmo pessimismo da dedicatória que abre o livro:
Como ele mesmo diz, “coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto”: Brás Cubas é um exemplar de senhor de terras, alguém que viveu e usufruiu de todos os privilégios sociais. Vê-se, pelo saber enciclopédico em que ele tece a narrativa, que teve acesso ao que de melhor a sociedade produziu em termos culturais – frequentou as melhores escolas e universidade, mas isso não o transformou em um homem de caráter. Cada uma das relações que Brás Cubas estabelece com as personagens é pautada em interesses financeiros e em convenções sociais – incluindo a paixão por Virgília, que jamais abandonaria o marido e seus altos recursos e posição social. A partir da autobiografia de Brás Cubas, Machado de Assis aborda temas universais de sua época, desmascarando a hipocrisia, a relatividade da moral e das convenções sociais, a dualidade filosófica da essência e aparência, sempre retratados sob a pena da ironia e do humor sarcástico. Quais são as características da obra Memórias Póstumas de Brás Cubas?“Memórias póstumas de Brás Cubas”, publicado em 1881, é uma das principais obras do escritor Machado de Assis. A publicação desse romance é considerada o marco inicial do Realismo no Brasil, e seu autor, por consequência, é reconhecido como o pai de tal movimento em terras brasileiras.
Quais são as principais características do estilo machadiano presentes na obra Memórias Póstumas de Brás Cubas?Crítica à burguesia e à sociedade de maneira geral; Ironia; Metalinguagem; Diálogo direto com o leitor.
O que caracteriza o realismo do Machado de Assis?O Realismo no Brasil teve início no ano de 1881, quando Machado de Assis (1839-1908), que, até então, era um escritor romântico, publicou a obra realista Memórias póstumas de Brás Cubas. Dessa forma, o autor mostrava o seu desencanto com a estética romântica e o conservadorismo que ela representava.
Qual o tipo de realismo da obra?Caracterizava-se por uma visão de mundo objetiva e comprometida com a realidade, como oposição ao romantismo, escola que valorizava a idealização da vida e a fantasia.
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Diferenças entre realismo e romantismo.. |