O que é segurança alimentar e nutricional e quais são os desafios encontrados para que a população tenha esse direito assegurado?

Segundo a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – LOSAN (Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006), por Segurança Alimentar e Nutricional – SAN entende-se a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis. Os compromissos assumidos pelo Governo Federal desde 2003, ao objetivar o combate à fome e à miséria no país, trilharam a construção da agenda da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) enquanto uma política de Estado, num amplo processo intersetorial e com participação da sociedade civil, definindo os marcos legais e institucionais dessa agenda – como a criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN); a recriação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA); a instalação da Câmara Intersetorial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN); e a elaboração do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN 2012/2015).

O SISAN foi instituído em 2006 pela Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional com o objetivo de assegurar o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA). Desde a sua criação, avanços legais e institucionais têm garantido a sua construção como estrutura responsável pela implementação e gestão participativa da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricionalem âmbito federal, estadual e municipal. Esta construção se dá de forma paulatina, num trabalho contínuo de dedicação, articulação e priorização política dos setores envolvidos.
O SISAN está cada vez mais forte. As suas instâncias interagem e funcionam plenamente na esfera Nacional (CAISAN, CONSEA e Conferências de Segurança Alimentar e Nutricional).
Todas as Unidades Federativas possuem CAISAN, CONSEA, fizeram a adesão ao SISAN e realizam suas conferências. Parte delas já elaborou seus Planos Estaduais de Segurança Alimentar e Nutricional e as outras estão em diferentes fases de elaboração.

Links para Alimentação Saudável e Qualidade de Vida:

  • GUIA ALIMENTAR PARA A POPULAÇÃO BRASILEIRA
  • CONSENSO DE NUTRIÇÃO ONCOLÓGICA I
  • CONSENSO DE NUTRIÇÃO ONCOLÓGICA II
  • INQUÉRITO BRASILEIRO DE NUTRIÇÃO ONCOLÓGICA
  • CARTA POLÍTICA – SEMINÁRIO 10 ANOS DE LIBERAÇÃO DOS TRANSGÊNICOS NO BRASIL
  • ESTRATÉGIA INTERSETORIAL DE PREVENÇÃO E CONTROLE DA OBESIDADE: RECOMENDAÇÕES PARA OS ESTADOS E MUNICÍPIOS
  • O NUTRICIONISTA E AS POLÍTICAS PUBLICAS

Caderno �Seguran�a Alimentar� 

Renato S. Maluf (CPDA/UFRRJ, Brasil)

Francisco Menezes (IBASE, Brasil)

Com a colabora��o de Susana Bleil Marques (Partes 1

1. Um conceito em disputa e constru��o 

O termo "Seguran�a Alimentar" come�ou a ser utilizado ap�s o fim da Primeira Guerra Mundial. Com a traum�tica experi�ncia da guerra, vivenciada sobretudo na Europa, tornou-se claro que um pa�s poderia dominar o outro controlando seu fornecimento de alimentos. A alimenta��o seria, assim, uma arma poderosa, principalmente se aplicada por uma pot�ncia em um pa�s que n�o tivesse a capacidade de produzir por conta pr�pria e suficientemente seus alimentos. Portanto, esta quest�o adquiria um significado de seguran�a nacional para cada pa�s, apontando para a necessidade de forma��o de estoques "estrat�gicos" de alimentos e fortalecendo a id�ia de que a soberania de um pa�s dependia de sua capacidade de auto-suprimento de alimentos. 

O entendimento de que a quest�o alimentar est� estritamente ligada � capacidade de produ��o manteve-se at� a d�cada de setenta. Na Ia. Confer�ncia Mundial de Seguran�a Alimentar, promovida pela FAO, em 1974, em um momento em que os estoques mundiais de alimentos estavam bastante escassos, com quebras de safra em importantes pa�ses produtores, a id�ia de que a Seguran�a Alimentar estava quase que exclusivamente ligada � e produ��o agr�cola era dominante. Isto veio, inclusive, a fortalecer o argumento da ind�stria qu�mica na defesa da Revolu��o Verde. Procurava-se convencer a todos, de que o flagelo da fome e da desnutri��o no mundo desapareceria com o aumento significativo da produ��o agr�cola, o que estaria assegurado com o emprego maci�o de insumos qu�micos (fertilizantes e agrot�xicos). A produ��o mundial, ainda na d�cada de setenta, se recuperou -embora n�o da mesma forma como prometia a Revolu��o Verde- e nem por isto desapareceram os males da desnutri��o e da fome, que continuaram atingindo t�o gravemente parcela importante da popula��o mundial. 

� neste contexto que come�a a se perceber que, mais do que a oferta, a capacidade de acesso aos alimentos por parte dos povos em todo o planeta mostra-se como a quest�o crucial para a Seguran�a Alimentar. Claro est� que fatores ligados � capacidade de produ��o tamb�m podem ser causadores de agudas crises de inseguran�a alimentar, como as situa��es de guerra e conseq�ente desestrutura��o da capacidade de produ��o, como tem ocorrido em diversos pa�ses da �frica. Ou a situa��o de bloqueio econ�mico, sofrida geralmente por pa�ses que se recusam a se submeter �s pol�ticas das grandes pot�ncias econ�micas e militares. Ou em situa��es de cat�strofes naturais, em que a agricultura e a distribui��o de alimentos nos pa�ses atingidos �, parcial ou totalmente, destru�da. 

A FAO (Organiza��o das Na��es Unidas para a Agricultura e a Alimenta��o) estima que, presentemente, um total  de 800 milh�es de pessoas passa fome, continuamente, em todo o mundo. A maior parte dessas pessoas est� localizada nas partes mais pobres do planeta, em especial na �frica, alguns pa�ses da �sia e da Am�rica Latina. Mas deve tamb�m ser registrado o crescimento de bols�es de mis�ria e fome, mesmo em pa�ses desenvolvidos. Embora a fome e da desnutri��o, sejam as manifesta��es mais cru�is da situa��o de inseguran�a alimentar, e a incapacidade de acesso aos alimentos a sua principal causa, outros aspectos devem tamb�m ser considerados, de maneira que se identifiquem as condi��es necess�rias para que prevale�am melhores condi��es alimentares, seja nos planos locais e nacionais ou no plano global.  

Um primeiro ponto diz respeito � qualidade dos alimentos e sua sanidade. Ou seja, todos devem ter acesso a alimentos de boa qualidade nutricional e que sejam isentos de componentes qu�micos que possam prejudicar a sa�de humana. Estes dois elementos s�o da maior import�ncia em um contexto atual que favorece o desbalanceamento nutricional das dietas alimentares, bem como o envenenamento dos alimentos, em nome de uma maior produtividade agr�cola ou com a utiliza��o de tecnologias cujos efeitos sobre a sa�de humana permanecem desconhecidos.  

Outro ponto refere-se ao respeito aos h�bitos e � cultura alimentar. Exige-se aqui que se considere a dimens�o do patrim�nio cultural que est� intr�nseco nas prefer�ncias alimentares das comunidades locais e nas suas pr�ticas de preparo e consumo. Pretende-se compreender e defender esta heran�a, que � passada de pais para filhos e que possui uma l�gica associada �s condi��es ambientais e sociais daquela comunidade, bem como de sua pr�pria hist�ria. N�o se quer dizer com isto que todos os h�bitos alimentares s�o sempre saud�veis. � preciso haver um aprimoramento desses h�bitos, quando necess�rio, mas sempre atento �s caracter�sticas espec�ficas desses grupos sociais. 

Um terceiro ponto est� na sustentabilidade do sistema alimentar. A seguran�a alimentar depende n�o apenas da exist�ncia de um sistema que garanta, presentemente, a produ��o, distribui��o e consumo de alimentos em quantidade e qualidade adequadas, mas que tamb�m n�o venha a comprometer a mesma capacidade futura de produ��o, distribui��o e consumo. Cresce a import�ncia dessa condi��o frente aos atritos produzidos por modelos alimentares  atuais, que colocam em risco a seguran�a alimentar no futuro.  

Dentro da �tica aqui definida, pode-se afirmar que a seguran�a alimentar est� regida por determinados princ�pios. O primeiro deles � que a seguran�a alimentar e a seguran�a nutricional s�o como �duas faces da mesma moeda�, n�o podendo se garantir uma delas sem que a outra tamb�m esteja garantida. O segundo princ�pio est� no fato de que somente ser� assegurada a seguran�a alimentar e nutricional atrav�s de uma participa��o conjunta de governo e sociedade, sem que com isto se diluam os pap�is espec�ficos que cabe a cada parte. Por fim, � preciso que se considere o direito humano � alimenta��o como primordial, que antecede a qualquer outra situa��o, de natureza pol�tica ou econ�mica, pois � parte componente do direito � pr�pria vida.  

A quest�o alimentar mexe com interesses diversos e at� contr�rios, o que faz com que a defini��o do significado da seguran�a alimentar se transforme em um espa�o de disputa. Al�m do mais, n�o � um conceito j� estabelecido, mas em constru��o. Visto sob estes dois aspectos fica clara a import�ncia da elabora��o de uma argumenta��o s�lida, fundamentada nos princ�pios j� enunciados e que se faz a partir de um debate amplo e ao mesmo tempo consistente.  

Dentro dessa perspectiva prop�e-se uma concep��o que busca ser suficientemente abrangente para dar conta de todas as preocupa��es antes assinaladas e tamb�m intersetorial, ou seja, em que cada categoria trabalhada esteja em direta articula��o com as demais, formando um conjunto que somente adquire seu sentido pleno, quando compreendido de uma forma integrada. 

Seguran�a Alimentar e Nutricional � a garantia do direito de todos ao acesso a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente e de modo permanente, com base em pr�ticas alimentares saud�veis e respeitando as caracter�sticas culturais de cada povo, manifestadas no ato de se alimentar. Esta condi��o n�o pode comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, nem sequer o sistema alimentar futuro, devendo se realizar em bases sustent�veis. � responsabilidade dos estados nacionais assegurarem este direito e devem faz�-lo em obrigat�ria articula��o com a sociedade civil, dentro das formas poss�veis para exerc�-lo.

2. Seguran�a alimentar como direito � alimenta��o 

A premissa de considerar o direito � alimenta��o como primordial requer, desde logo, sua incorpora��o ao debate hoje travado em torno dos direitos econ�micos, sociais e culturais, mas e tamb�m promover atrav�s de iniciativas que exijam dos estados nacionais e dos organismos multilaterais a observ�ncia desses direitos. 

O direito � alimenta��o e � prote��o contra a fome � h� muito tempo reconhecido em acordos internacionais (multilaterais e regionais). O artigo 25 da Declara��o Universal dos Direitos Humanos das Na��es Unidas estabelece claramente a seguran�a alimentar entre os direitos humanos fundamentais. Contudo, ainda n�o se disp�e de mecanismos que o tornem efetivo. 

Uma das propostas para a formaliza��o do direito � alimenta��o � a de criar um c�digo de conduta para reger o comportamento dos que est�o implicados na realiza��o do direito � alimenta��o, cujo conte�do legal e os compromissos dos Estados constariam da conven��o internacional relativa aos direitos econ�micos, sociais e culturais. Na mesma dire��o vai a proposta de uma conven��o global de seguran�a alimentar no �mbito das Na��es Unidas que a coloque em alta prioridade nas leis internacionais e a fa�a respeitada por todos os organismos, particularmente a OMC, ao mesmo tempo apoiando os planos nacionais de seguran�a alimentar. Trata-se, contudo, de um processo longo e complexo de mobiliza��o de energia pol�tica e de negocia��o 

3. Seguran�a Alimentar como eixo estrat�gico de desenvolvimento 

As estrat�gias de desenvolvimento centradas na seguran�a alimentar aqui sugeridas contribuem na implementa��o do direito � alimenta��o antes referido. A proposi��o de colocar a seguran�a alimentar como um eixo estrat�gico de desenvolvimento, pressup�e o reconhecimento de que h� uma quest�o alimentar nos processos de desenvolvimento que se deve a tr�s fatores. Primeiro, estar adequadamente alimentado constitui um direito humano b�sico enquanto condi��o vital da exist�ncia. Segundo, o conjunto de atividades ligadas � produ��o, distribui��o e consumo de alimentos (o sistema alimentar) desempenha um papel central na configura��o econ�mica, social e cultural dos pa�ses. Terceiro, as quest�es ligadas aos alimentos e � alimenta��o sempre foram fonte de preocupa��es e de mobiliza��es sociais, e objetos permanentes das pol�ticas p�blicas. 

As estrat�gias econ�micas e as pol�ticas p�blicas derivadas desta concep��o diferenciam-se bastante dos enfoques convencionais sobre a quest�o alimentar, ao sugerir uma perspectiva que ultrapassa os limites tanto dos enfoques setoriais (agr�colas ou nutricionais) como das a��es simplesmente suplementares ou compensat�rias. Ao conceito de seguran�a alimentar � atribuido um estatuto analogo ao conferido � eq�idade social e � sustentabilidade, todos eles colocados como objetivos nucleadores de politicas publicas. 

Habitualmente, a �nfase � posta na disponibilidade de renda como o determinante principal do acesso adequado aos alimentos e, conseq�entemente, da seguran�a alimentar; sendo a disponibilidade de renda uma express�o do grau de eq�idade social. A capacidade de adquirir alimentos, por sua vez, impactaria a produ��o e o consumo. Nestes termos, o equacionamento da insufici�ncia de renda (ou da pobreza) mediante, por exemplo, pol�ticas de emprego e de sal�rios permitiria o consumo dos alimentos e estimularia a produ��o destes bens. 

Este enfoque capta um lado do problema, sem d�vida essencial, mas n�o todo ele. Isto porque a quest�o alimentar mant�m uma rela��o de m�tua determina��o com a eq�idade social, n�o sendo apenas uma resultante desta �ltima. Assim, o tratamento dos v�rios aspectos envolvidos na quest�o alimentar tamb�m contribui para uma maior eq�idade social. A rela��o entre ambas � um reflexo e, ao mesmo tempo, contribui para a configura��o do padr�o de desenvolvimento s�cio-econ�mico vigente numa sociedade. Assim, se o requisito de renda monet�ria e o enfrentamento da pobreza contribuem para a seguran�a alimentar, n�o � menos verdade que as formas sociais em que se organiza a produ��o dos alimentos e as condi��es em que se d� o acesso a estes bens s�o tamb�m determinantes da eq�idade social. 

Para alterar as referidas formas sociais e condi��es de acesso � preciso promover profunda reorienta��o nas estrat�gias de desenvolvimento em vig�r na maioria dos pa�ses do Terceiro Mundo, que est�o em vis�vel contradi��o com os objetivos da seguran�a alimentar e da eq�idade social. Mesmo naqueles pa�ses onde h� crescimento econ�mico, este tende a ter um forte componente de exclus�o social. Associar crescimento econ�mico com crescente eq�idade social talvez seja o principal desafio para a formula��o de estrat�gias econ�micas que tenham em conta raz�es de justi�a social e de sustentabilidade ambiental.  

Esta perspectiva tende a atribuir maior relev�ncia aos mercados dom�sticos e � produ��o de bens de consumo generalizado, caso em que os alimentos e o sistema agroalimentar desempenhariam um papel central e o objetivo da seguran�a alimentar adquiriria seu significado pleno. O potencial para caminhar nesta dire��o � sem d�vida maior para os pa�ses onde a promo��o de crescente eq�idade social e a conseq�ente inclus�o dos atuais exclu�dos resultariam, pela dimens�o da sua popula��o, num mercado interno com porte significativo.  

Uma importante conseq��ncia deste enfoque � que as pol�ticas de seguran�a alimentar teriam como universo o conjunto da popula��o, e n�o apenas os segmentos em situa��o de pobreza extrema, e como campo de interven��o os determinantes das condi��es de acesso (trabalho e renda) e de produ��o (estrutura produtiva, disponibilidade e pre�os) dos alimentos b�sicos. 

4. Pobreza e seguran�a alimentar 

A pobreza ocupa o lugar de determinante principal da inseguran�a alimentar, isto �, do n�o acesso regular a uma alimenta��o adequada, dando origem aos fen�menos da fome e da desnutri��o. Assim, as pol�ticas e programas de seguran�a alimentar t�m que ser capazes de apoiar estrat�gias de desenvolvimento de m�dio e longo prazo na dire��o indicada anteriormente, ao mesmo tempo em que se implementam a��es ou instrumentos de transfer�ncia de renda e de alimentos com natureza suplementar ou emergencial para fazer frente �s car�ncias imediatas geradas pela pobreza. Outras fontes de inseguran�a alimentar causadoras de situa��es emergenciais s�o a ocorr�ncia de guerras e conflitos armados e os embargos impostos aos pa�ses, e tamb�m nestes casos os segmentos mais pobres s�o os mais fortemente afetados.  

A retomada das discuss�es sobre as desigualdades sociais favorece o enfrentamento da problem�tica alimentar sobretudo em rela��o �s car�ncias agudas. Por�m, � preciso evitar que a quest�o alimentar fique inteiramente subordinada ao tema da pobreza e seu tratamento reduzido � disponibilidade de renda monet�ria. O objetivo de uma vida saud�vel sob modelos sociais equitativos e sustent�veis requer muito mais do que disp�r de renda para adquirir alimentos. 

Os pa�ses do Terceiro Mundo apresentam um quadro mais ou menos generalizado de i) concentra��o de renda, ii) n�veis crescentes de pobreza urbana e iii) incid�ncia decrescente da pobreza rural, ainda que o meio rural apresente os �ndices mais elevados. Estas tend�ncias manifestaram-se num ritmo mais r�pido na Am�rica Latina, em rela��o ao que se verifica na �frica e na �sia. A referida redu��o no n�mero absoluto de pobres rurais se d� em fun��o principalmente da migra��o rural-urbana. A fome, consequ�ncia da pobreza, afeta, desde logo, a popula��o rural onde se localizam cerca de 3/4 do total de subnutridos do mundo, por�m, o fen�meno da urbaniza��o estende-a �s cidades. 

Os estilos de desenvolvimento que emergem p�s-ajuste estrutural tendem a gerar mais desigualdades que os anteriores -ainda que se possa verificar alguma redu��o na pobreza relativa- e ampliam a import�ncia das pol�ticas sociais baseadas em redes de seguran�a social com cobertura universal. Mesmo nos pa�ses (como os da Am�rica Latina) que apresentaram uma gradual melhora em indicadores como os de mortalidade infantil e de desnutri��o, a inseguran�a alimentar ainda afeta a maioria dos pa�ses e uma parcela significativa de suas popula��es. 

O consumo alimentar constitui-se num indicador fundamental para a caracteriza��o da pobreza. Na maioria dos pa�ses, os gastos necess�rios para uma fam�lia adquirir o que se considera uma �cesta b�sica de alimentos� s�o a principal (em alguns lugares, a �nica) refer�ncia para determinar o valor do sal�rio-m�nimo e, quando existe, a linha oficial de pobreza e de indig�ncia. A atualiza��o da no��o de �cesta basica� � uma necessidade colocada em muitos paises. Al�m do que, � indispensavel acrescentar � renda monetaria o acesso a bens e servi�os n�o-monetarios (saneamento basico, alimenta��o escolar, etc.) que tamb�m determinam a condi��o alimentar e o bem-estar da popula��o. 

No espa�o urbano, al�m das iniciativas relativas �s oportunidades de trabalho e � gera��o de renda, as pol�ticas e programas de seguran�a alimentar envolvem um conjunto variado de a��es tanto no sentido de enfrentar car�ncias nutricionais como no de assegurar a qualidade dos alimentos e de tornar mais saud�veis os h�bitos alimentares.  

A pobreza rural, a fome nos campos e o �xodo resultam, em grande medida, da fal�ncia da atividade produtiva rural de pequena e m�dia dimens�o, com detaque � produ��o agricola, ao que se somam outros fatores. As rendas n�o-agricolas rurais ou urbanas, que integram a reprodu��o das familias rurais, podem dar importante contribui��o para os que disp�em de recursos para desenvolv�-las (turismo rural, artesanato, trabalho qualificado, etc.), por�m, frequentemente, elas se constituem em fonte precaria de recursos alternativos (ocupa��es de baixa remunera��o). Acrescente-se a quest�o das expectativas futuras dos jovens filhos dos agricultores, elemento chave para qualquer estrat�gia voltada �s familias rurais. As transfer�ncias de renda pela extens�o de direitos sociais ao campo (previd�ncia rural) t�m grande potencial de retirar da pobreza as fam�lias rurais afetadas pelo �xodo dos mais jovens. 

Por �ltimo, sugere-se adotar um enfoque espacial que valorize as din�micas dos territ�rios,  de modo a evidenciar a intera��o entre o urbano e o rural presente em muitos casos, e as redes sociais essencias � reprodu��o das familias neles localizadas.  

5. Produ��o de alimentos e eq�idade social 

A �nfase conferida �s condi��es de acesso aos alimentos pelas fam�lias como condicionante para a seguran�a alimentar n�o significa dar como equacionada a quest�o da produ��o agroalimentar, principalmente quando se vai al�m da mera oferta ou disponibilidade de alimentos para considerar os aspectos sociais, econ�micos, espaciais e ambientais da produ��o e do abastecimento alimentar. Al�m do que, ambos os aspectos -acesso e disponibilidade- est�o presentes, conjuntamente, quando se trata da agricultura realizada em bases familiares (agricultores familiares ou como camponeses) ou comunit�rias (ind�genas e outras), e dos pequenos empreendimentos urbanos fornecedores de alimentos.  

A revis�o das atuais estrat�gias de desenvolvimento na dire��o aqui sugerida resultaria no fortalecimento dos mercados dom�sticos e da produ��o de bens de consumo massivo, onde est� inclu�do o sistema agroalimentar. Mais do que isto, os estimulos provenientes do mercado interno s�o em parte oriundos da pr�pria capacidade de gera��o de emprego no conjunto das atividades de produ��o e distribui��o dos alimentos. Nestes termos, o sistema agroalimentar pode se tornar econ�mica e estrat�gicamente importante e, portanto, uma prioridade das pol�ticas p�blicas.  

O fato das atividades agroalimentares concentrarem parte significativa da atividade econ�mica e da popula��o ativa na maioria dos paises quer dizer que tamb�m � grande a contribui��o das referidas atividades �s caracter�sticas perversas de suas sociedades. Como exemplo pode-se mencionar a concentra��o da propriedade da terra e a extens�o da mis�ria rural, as prec�rias condi��es vigentes nos pequenos e m�dios emprendimentos comerciais e industriais urbanos, os sal�rios m�dios relativamente mais baixos da ind�stria alimentar, e os impactos ambientais do padr�o tecnol�gico predominante.  

A supera��o de tais caracter�sticas e a busca de maior efici�ncia e qualidade sob padr�es n�o socialmente excludentes tornam-se, ent�o, elementos cruciais. Nesta dire��o atuariam os programas de reforma agr�ria e de fortalecimento da agricultura familiar e das comunidades ind�genas, a regulariza��o das rela��es de trabalho no campo e a previd�ncia social rural, a revis�o do pacote tecnol�gico, as alternativas de agroindustrializa��o de pequena e m�dia escala, o aprimoramento do pequeno varejo, etc. 

As condi��es em que se d� o acesso aos alimentos pela popula��o � tamb�m determinada pelas formas sociais sob as quais os alimentos s�o produzidos e ofertados -tipo de explora��o agr�cola, grau de concentra��o econ�mica do processamento agroindustrial e da distribui��o comercial, padr�es de concorr�ncia nos mercados de alimentos, etc. Tr�s aspectos devem ser destacados a respeito. O primeiro refere-se ao crescente controle exercido pelas grandes corpora��es agroindustriais e comerciais nos mercados de mat�rias-primas e de produtos finais, e a articula��o estreita entre as etapas produtivas, de distribui��o e de consumo dos alimentos. Os padr�es de consumo (em certa medida impostos) orientam cada vez mais a produ��o desses bens, inclusive na etapa agr�cola. Estas caracter�sticas limitam, mas n�o impedem, a implementa��o de estrat�gias alternativas para assegurar a possibilidade de escolha pelos consumidores, e a reprodu��o em condi��es dignas de um amplo conjunto de pequenos e m�dios empreendimentos rurais e urbanos. 

Os processos de segmenta��o dos mercados de alimentos e de diferencia��o de produtos criam novas possibilidades como por exemplo os produtos artesanais, os produtos org�nicos ou agro-ecol�gicos e os produtos com denomina��o de origem.  

O segundo aspecto diz respeito � ao principal pressuposto da seguran�a alimentar, a saber, disp�r de poder de compra para adquirir alimentos em quantidade e qualidade adequadas, por�m, de um modo que reduza o peso relativo dos gastos com alimenta��o na renda familiar. Este objetivo depende dos instrumentos que promovem a eleva��o da renda monet�ria e sua distribui��o equ�nime (emprego-trabalho, sal�rios e outras rendas do trabalho, e tributos). Contudo, ele depende tamb�m do custo relativo dos alimentos pois este �ltimo � um dos principais determinantes da renda real das fam�lias, principalmente, dos estratos de menor renda. Iniciativas para reduzir os custos da alimenta��o incluem o aumento da produtividade agr�cola com base em t�cnicas social e ambientalmente adequadas, a redu��o do elevado n�vel de perdas, o enfrentamento de gargalos na infra-estrutura de transporte e armazenamento, e a aproxima��o de produtores e consumidores em mercados regionais.  

O terceiro aspecto refere-se � tens�o, comumente encontrada entre os objetivos de assegurar uma renda m�nima aos pequenos produtores rurais e o de preservar o poder de compra dos consumidores. Ela se manifesta de forma mais dram�tica nos pequenos pa�ses de baixa renda com mercado interno reduzido. A combina��o de instrumentos de prote��o da produ��o interna e de subven��o de pre�os e cr�dito, somados a acordos preferenciais que permitiam destinar parte da produ��o aos pa�ses industrializados, foi sendo gradativamente abandonada pelo custo fiscal do protecionismo, pela disponibilidade de alimentos importados baratos (via ajuda alimentar e liberaliza��o comercial unilateral), e pela revis�o dos acordos preferenciais. 

Nos pa�ses em que a popula��o rural constitui a maior parcela da popula��o, os instrumentos de prote��o da produ��o agroalimentar local adquirem maior import�ncia. Os recursos dispon�veis podem dirigir-se tanto aos produtos essenciais de mercado interno como aos de exporta��o, segundo sejam as melhores possibilidades de gera��o de renda aos agricultores e o abastecimento do mercado interno. Em todos os casos, colocam-se como ferramentas essenciais o associativismo entre produtores e sua capacita��o para agregar valor aos seus produtos, a redu��o da intermedia��o mercantil e o estabelecimento de bases mais equ�nimes de negocia��o entre ambos agentes; mas o enfrentamento do mercado pode, em alguns casos, colidir com a conserva��o de valores das sociedades rurais como ocorre na �frica. 

A �equa��o africana� p�s-independ�ncia (esfor�os em culturas rent�veis, popula��o rural auto-suficiente, moderniza��o da produ��o de v�veres e alimenta��o das cidades a baixo custo via importa��o ou ajuda externa) viu-se comprometida a partir dos anos 70, gerando fome, migra��o e �xodo rural. A auto-sufici�ncia foi, ent�o, incorporada como objetivo perseguido oficialmente pelos Estados, mesmo que tenham recorrido amplamente � ajuda alimentar. Os investimentos naquela dire��o nem sempre foram bem sucedidos, como foi o caso dos projetos de arroz irrigado em alguns pa�ses cujo custo impediu-o de competir com o produto importado. A hist�ria posterior � comum �s demais regi�es do mundo, com a progressiva retra��o do Estado, a abertura comercial e os impactos do ajuste estrutural, ao que se acrescenta a situa��o atual de forte depend�ncia de ajuda alimentar. As v�rias propostas atuais para este continente apontam para estrat�gias assentadas na prote��o do mercado interno, na combina��o da produ��o de v�veres com culturas de exporta��o e na profissionaliza��o dos agricultores. 

A refer�ncia ao continente africano facilita introduzir a quest�o de g�nero presente na seguran�a alimentar, que se manifesta no papel central desempenhado pelas mulheres na obten��o, na prepara��o e na parti��o dos alimentos entre os membros da fam�lia. O papel das mulheres como produtoras � especialmente grande na �frica, pois chegam a produzir 50-60% dos alimentos em muitos pa�ses. Na condi��o de produtoras, �s mulheres deve ser assegurado acesso igual aos recursos produtivos (terra, cr�dito, assist�ncia t�cnica, etc.). 

As a��es p�blicas de abastecimento podem contribuir de v�rios modos para promover a produ��o e a distribui��o dos alimentos sob formas sociais mais equitativas. Ao apoiar pequenos e m�dios empreendimentos rurais e urbanos dedicados ao cultivo, transforma��o e comercializa��o de produtos agroalimentares amplia-se, ao mesmo tempo, a disponibilidade de alimentos de qualidade de um modo menos custoso, valorizando a diversidade nos h�bitos de cultivo e de consumo. Uma segunda contribui��o das a��es de abastecimento relaciona-se com o acesso aos alimentos por todos os segmentos da popula��o, em condi��es apropriadas em termos da quantidade, pre�o e qualidade dos alimentos, e da composi��o da cesta de consumo. Enquadram-se, aqui, as a��es nas esferas da intermedia��o mercantil e do com�rcio de varejo, no consumo de alimentos preparados (refei��es prontas e outras formas), na organiza��o de compras comunit�rias e na promo��o de programas de distribui��o de alimentos. 

A conex�o entre o abastecimento e a produ��o agroalimentar reflete tamb�m uma estrat�gia de �juntar as duas pontas�, quais sejam, os produtores agr�colas e os consumidores, por�m, evitando-se o risco de que produtores agr�colas venham a se tornar comerciantes. Naturalmente coloca-se a quest�o de como a intermedia��o comercial, mesmo reduzida,  desempenha o seu papel e quais instrumentos regulat�rios devem estar dispon�veis para permitem evitar que os interesses comerciais se sobreponham aos de produtores e consumidores. O funcionamento do mercado de produtos agroalimentares deve ser objeto de regula��o p�blica, enquanto que o poder p�blico deve investir no fortalecimento dos pequenos e m�dios empreendimentos com vistas a promover um modelo de desenvolvimento socialmente justo. Chama a aten��o o papel dos servi�os de abastecimento como geradores de ocupa��o a um n�mero consider�vel de pessoas. 

Uma refer�ncia especial deve ser feita � proposta de estimular o desenvolvimento dos circuitos regionais de produ��o, distribui��o e consumo de alimentos. Estes circuitos formam-se no �mbito das regi�es no interior dos pa�ses ou no entorno dos n�cleos urbanos de m�dia dimens�o, sendo constitu�dos da agricultura de base familiar, de pequenas empresas cooperativas ou privadas de beneficiamento e de processamento de mat�rias-primas agr�colas, e de empreendimentos urbanos industriais e comerciais tamb�m de pequeno porte ligados � transforma��o, distribui��o e consumo de produtos alimentares. Os bens t�picos dos circuitos regionais s�o express�es de diversidade pois s�o produtos tradicionais de uma regi�o, refletem h�bitos de consumo peculiares e guardam rela��o com uma dada base de recursos naturais.  

Criar condi��es favor�veis � consolida��o de tais circuitos envolve, entre outras iniciativas, aquelas voltadas � melhorar a qualidade e � aumentar o valor agregado dos produtos oriundos da agricultura de base familiar, e � capacita��o dos agentes produtivos e comerciais. Esta � uma forma de, simultaneamente, a) promover atividades econ�micas em bases equitativas e sustent�veis, b) ampliar a oferta de alimentos de um modo que expressa a diversidade de h�bitos de consumo e c) induzir a concorr�ncia em mercados controlados por grandes corpora��es agroalimentares.  

As a��es no sentido de promover e fortalecer o processamento de alimentos em unidades de tipo artesanal (pequenas agroind�strias e ind�strias caseiras) e o com�rcio varejista de alimentos de pequena escala devem basear-se no requisito de qualidade dos produtos (e regularidade da produ��o), j� que n�o se est� sugerindo a preserva��o de um com�rcio local ou regional marginal (ou ilegal) com produtos de baixa qualidade. Ao contr�rio, pretende-se superar a perversidade contida nos modelos excludentes em que um n�mero expressivo de produtores e fornecedores em condi��es prec�rias ofertam alimentos com pouca qualidade a um contingente tamb�m expressivo de consumidores de baixa renda. O desafio consiste em ter uma a��o p�blica que, em lugar da mera puni��o, promova a passagem de pequenos produtores e fornecedores ao mercado formal, em paralelo � educa��o alimentar e � defesa dos direitos do consumidor. Na verdade, aqui se localizam algumas das principais demandas e possibilidades de a��es p�blicas locais e regionais voltadas � oferta e ao consumo de alimentos com seguran�a alimentar. 

6. Seguran�a alimentar, agricultura familiar e desenvolvimento local

A atividade agr�cola continua sendo a mais importante fonte de renda (e de alimentos) para a maioria das unidades familiares rurais. Uma caracter�stica importante das iniciativas que promovem a produ��o agroalimentar � a de que elas  possibilitam enfrentar, em simult�neo, tanto a necessidade de criar oportunidades de trabalho e de apropria��o de renda a essas fam�lias, como a de ampliar e melhorar a oferta de alimentos em �mbito regional e nacional.  

Generaliza-se, hoje, a perspectiva de agregar valor aos produtos oriundos da agricultura realizada em bases familiares, atrav�s do processamento agroindustrial e da incorpora��o de servi�os a esses bens com base em empreendimentos de pequena e m�dia escalas. Amplia-se, tamb�m, a ado��o de marcas ou de selos de qualidade com v�rios apelos (produtos coloniais, "da ro�a", da agricultura org�nica ou agroecol�gios, etc.). 

As quest�es de mercado despontam, em geral, como o principal determinante das possibilidades de �xito dos programas de apoio � produ��o agroalimentar, ao lado do acesso ao cr�dito em condi��es adequadas. 

Destaque especial deve ser dado ao chamado mercado institucional que engloba as compras governamentais de alimentos para serem utilizados em programas e organismos p�blicos (alimenta��o escolar, hospitais, pres�dios, distribui��o de cestas b�sicas, etc.). Alguns deles, como a alimenta��o escolar, t�m papel central no acesso aos alimentos por uma parcela vulner�vel e numericamente expressiva da popula��o. Em pa�ses onde as compras governamentais s�o significativas e conta-se com uma gest�o transparente, a participa��o de pequenos e m�dios fornecedores -notadamente, as associa��es de pequenos produtores agr�colas- nos programas p�blicos de alimenta��o, dos quais sempre estiveram exclu�dos, pode constituir-se em importante instrumento de alavancagem para estes produtores. 

O associativismo, em suas distintas formas, cumpre um papel vital nos projetos envolvendo pequenos e m�dios produtores. A experi�ncia demonstra que o grau de associativismo � fortalecido pelos la�os comunit�rios entre os participantes e pela valoriza��o das redes de economia solid�ria, sobretudo na gest�o do cr�dito e na comercializa��o da produ��o. Estes elementos permitem tamb�m amenizar os impactos das interrup��es de programas em fun��o da renova��o dos mandatos na administra��o p�blica. 

Cabe mencionar, ainda, que abordar a produ��o mercantil n�o implica desconsiderar o papel que cumpre a produ��o para auto-consumo como componente da reprodu��o das fam�lias rurais e, portanto, da sua seguran�a alimentar. Tida como sin�nimo de atraso pelos adeptos da moderniza��o fundada na especializa��o produtiva, a presen�a da produ��o para auto-consumo sempre constituiu-se num importante instrumento de prote��o frente �s incertezas e oscila��es da produ��o mercantil. A inexist�ncia de condi��es de produ��o para auto-consumo pela car�ncia de recursos (�gua, �rea �til, etc.), ou a perda destas condi��es devida a op��es como a da especializa��o produtiva, s�o causas de insufici�ncia alimentar que se somam aos indicadores de pobreza rural medidos em termos da renda monet�ria. 

Em muitos pa�ses tem sido registrada uma direta correla��o entre o acesso � terra e aos alimentos no meio rural. Ou seja, aonde se realizou um processo de reforma agr�ria e esta se manteve com razo�vel grau de consolida��o, a situa��o alimentar e nutricional dessas popula��es mostra-se adequada. Em sentido inverso, aonde permanece a terra concentrada e com contingentes elevados de trabalhadores rurais e suas fam�lias sem terra, � grave a situa��o de inseguran�a alimentar. Acrescente-se que o retrocesso ou a revers�o dos programas de redistribui��o de terras na maioria dos pa�ses onde eles foram implementados em d�cadas passadas vem causando impactos sociais negativos maiores do que a pen�ria a que haviam sido relegados os benefici�rios destes programas.  

O Brasil � o exemplo mais vivo desse �ltimo caso, n�o tendo ainda realizado uma ampla reforma agr�ria, como requer sua situa��o fundi�ria. A determina��o de uma situa��o de inseguran�a alimentar est� diretamente relacionada com essa situa��o de conflito e exclus�o no campo. Do enorme contingente de 30 milh�es de pessoas que passam fome neste pa�s, metade est� na �rea rural, embora apenas 21% de sua popula��o total viva no campo. Estudos recentes t�m revelado que em assentamentos de reforma agr�ria no Brasil, que j� possuem razo�vel grau de consolida��o, o estado nutricional encontrado chega a ser superior �quele disfrutado pela agricultura familiar convencional. Em contraposi��o, nos acampamentos de sem-terra em �reas ocupadas, que ainda n�o foram reconhecidas e, portanto, n�o se encontram em condi��es de produzir, o quadro de desnutri��o � gravissimo. 

A reforma agr�ria propicia quatro favor�veis impactos sobre a seguran�a alimentar:

a)      � uma importante pol�tica de gera��o de trabalho e renda, aumentando a possibilidade de acesso aos alimentos que s�o adquiridos para consumo;

b)      Cria as condi��es para que as fam�lias possam produzir os pr�prios alimentos que v�o consumir;

c)      Fortalece a chamada �seguran�a alimentar local� atrav�s da garantia de produ��o de alimentos para as �reas pr�ximas,

d)      As op��es produtivas usualmente adotadas pela agricultura reformada tendem ao cultivo de alimentos b�sicos integrantes da tradi��o dos agricultores.

Diante dessas evid�ncias pode-se afirmar que a reforma agr�ria, em pa�ses aonde ainda n�o foi realizada ou precisa ser retomada, pode ser um meio fundamental para a redu��o da inseguran�a alimentar. 

Dedicar-se � produ��o de alimentos para o mercado interno e, mesmo, para exporta��o, n�o se constitui na �nica e obrigat�ria alternativa visando promover a seguran�a alimentar das fam�lias no meio rural. Esta pode ser obtida atrav�s da explora��o de produtos n�o-alimentares, de atividades rurais n�o-agr�colas e de ocupa��es urbanas, todas com o objetivo de assegurar trabalho e renda �s fam�lias rurais que s�o, no mais das vezes, pluriativas. 

A oferta de bens privados, por sua vez, n�o � a �nica rela��o mantida pelos agricultores com a sociedade, pois esta abrange um conjunto de outras fun��es caracterizadas como bens p�blicos tais como a preserva��o da paisagem, a diversidade agrobiol�gica, a heran�a cultural e a pr�pria seguran�a alimentar. Para contemplar as m�ltiplas fun��es a serem preenchidas pela agricultura -a multifuncionalidade da agricultura- � preciso estabelecer um novo pacto entre os agricultores e a sociedade que espera respostas dos primeiros sobre o territ�rio, a qualidade e a �tica. Este �ltimo ponto � t�o mais importante quando se considera que nem toda a agricultura � multifuncional, j� que h� a agricultura especializada que, ali�s, constitui-se na principal benefici�ria das pol�ticas de subven��o p�blica. A multifuncionalidade � uma no��o que abrange todos os aspectos e servi�os n�o-comerciais associados a uma agricultura de fato capacitada (self-reliant) e sustent�vel. Como se ver� adiante a utiliza��o desta no��o como instrumento de pol�ticas p�blicas tem provocado repercuss�es nas negocia��es comerciais internacionais. 

Ressalte-se, ainda, o papel ativo que pode (e deve) ser exercido pelas administra��o p�blica no n�vel local desencadeando processos, em lugar de apenas responder �s solicita��es de agentes econ�micos, grupos sociais ou cidad�os individuais. Esse papel ser� mais relevante quando as administra��es melhor assumirem sua condi��o de  agentes promotores de desenvolvimento no �mbito local ou regional, tendo a seguran�a alimentar como um dos eixos estrat�gicos de interven��o. 

7. Contexto internacional da seguran�a alimentar 

A rela��o entre seguran�a alimentar e as estrat�gias e pol�ticas de desenvolvimento envolve aspectos que se encontram sob impacto da nova ordem internacional.  

Tr�s elementos se destacam neste contexto. O primeiro refere-se aos novos mecanismos de regula��o do com�rcio agroalimentar mundial, marcados at� agora pela incerteza acerca dos rumos da liberaliza��o comercial e do protecionismo no �mbito da OMC. Um dos elementos de controv�rsia refere-se � considera��o da seguran�a alimentar (no sentido de food security) como um tema comercial ou n�o comercial. Em paralelo, amplia-se a import�ncia da regulamenta��o voltada � seguran�a dos alimentos (food safety), cujas repercuss�es v�o at� a esfera da produ��o rural. 

O segundo elemento � a constitui��o de blocos econ�micos regionais que apresentam distintos graus de integra��o e tamb�m diferentes possibilidades em termos da ado��o de estrat�gias de desenvolvimento e de seguran�a alimentar. As iniciativas no �mbito do Terceiro Mundo, at� o momento, revelam  que a condi��o de �bloco perif�rico� coloca limites � formula��o e � ado��o de pol�ticas supra-nacionais soberanas acordadas entre seus membros. O Mercosul, por exemplo, � integrado por um pa�s (Brasil) com elevada desigualdade social e expressivo contingente populacional com acesso irregular ou insuficiente aos alimentos, num bloco que se destaca como grande exportador de produtos agroalimentares. 

O terceiro elemento diz respeito �s tend�ncias do sistema agroalimentar crescentemente internacionalizado, que se caracterizam pela coexist�ncia de processos de padroniza��o e de diferencia��o na produ��o e no consumo de alimentos. Assim, de um lado, temos os processos bastante conhecidos de concentra��o da produ��o agroalimentar (e da propriedade da terra) que amea�am as agriculturas de base familiar e camponesa, mesmo em regi�es e cadeias produtivas onde ela tem presen�a tradicional. Por outro lado, assiste-se � cria��o simult�nea de novas oportunidades de mercado, muitas delas acess�veis ao pequenos agricultores que ainda t�m nos alimentos uma importante fonte de renda. 

A mera exposi��o � competi��o internacional n�o � o caminho para a busca de maior efici�ncia produtiva, devido aos componentes �esp�rios� desta competi��o e a natureza intrinsecamente excludente da din�mica das economias capitalistas. Vale mencionar a perman�ncia da pr�tica de dumping por parte dos pa�ses industrializados, mesmo que sob formas legitimadas pelas regras atuais de com�rcio. O fato dos pre�os praticados nos mercados internos, e n�o os custos de produ��o, serem a refer�ncia para caracterizar a pr�tica de dumping (exporta��o a pre�os inferiores aos praticados no mercado interno) acaba por facilitar esta pr�tica. As subven��es destinadas aos agricultores com o sentido de assegurar que eles recebam um pre�o superior aos pre�os internos (como no caso europeu) possibilitam, quando os pre�os internos s�o menores ou iguais aos internacionais,  que a exporta��o se fa�a a um pre�o abaixo do custo expresso nos pre�os recebidos pelos agricultores, mas nos n�veis praticados no mercado interno, sem que se caracterize dumping. 

O enfoque baseado na autocapacidade alimentar, abordado adiante, tamb�m valoriza implicitamente a op��o de submeter os sistemas produtivos nacionais a press�es competitivas como elemento indutor de efici�ncia (�s vezes chamada de moderniza��o). Por�m, � f�cil constatar que parcela importante da agricultura de base familiar pode ser v�tima da maior efici�ncia e capitaliza��o, no que se poderia denominar de �armadilha da moderniza��o�. 

A principal conclus�o desta breve abordagem do contexto internacional � que, mesmo que se admita um maior grau de abertura externa dos pa�ses por raz�es que extrapolam a dimens�o meramente econ�mica, sustenta-se que os objetivos e pol�ticas de desenvolvimento -entre os quais se insere o da seguran�a alimentar- devem prevalecer sobre os objetivos e pol�ticas estritamente comerciais, e orientar os esfor�os de regulamenta��o do com�rcio internacional. Ao considerar a ordem internacional � inevit�vel incorporar quest�es de soberania � no��o de seguran�a alimentar, valendo-se do princ�pio da soberania alimentar que se fundamenta no car�ter essencial e politicamente sens�vel dos alimentos e nos aspectos culturais associados a estes bens. Tomando a defini��o proposta na Declara��o de Yaound� (1996), a soberania alimentar dos povos se exprime na capacidade dos Estados e das pessoas de:

- produzir os alimentos necess�rios � popula��o em todas as regi�es do mundo, de modo a reduzir a depend�ncia ligada � ajuda alimentar;

- controlar, conservar e utilizar seus recursos gen�ticos e seus conhecimentos pr�prios;

- garantir a disponibilidade e o acesso de todos a uma alimenta��o sadia, diversificada e que respeite a diversidade das culturas e h�bitos alimentares;

- tomar decis�es de modo aut�nomo concernentes a suas pol�ticas agroalimentares 

A busca de algum grau de auto-sufici�ncia na produ��o de alimentos b�sicos constitui-se num princ�pio ainda v�lido de soberania alimentar a ser adaptado ao ambiente atual de maior abertura econ�mica. 

As iniciativas de integra��o econ�mica regional que explorem as complementariedades e regulem os conflitos entre os pa�ses-membros podem contribuir nesta dire��o desde que elas n�o se limitem a simplesmente reproduzir as demandas por liberaliza��o comercial. Mesmo a importa��o de alimentos, em algumas circunst�ncias, serve como instrumento auxiliar na regula��o dos mercados. 

Argumentos de (in)efici�ncia s�o a justificativa b�sica para desqualificar quest�es como as que s�o aqui levantadas sob o r�tulo da soberania e da seguran�a alimentares, em favor de uma estrat�gia de inser��o internacional com benef�cios incertos e restritos a pequena parcela da popula��o. A efetiva��o do direito � alimenta��o tem, entre seus componentes, o exerc�cio soberano de pol�ticas de seguran�a alimentar que se sobrep�em aos supostos princ�pios de �boa economia� ou � l�gica mercantil estrita. 

Com rela��o � ajuda alimentar destinada aos paises mais pobres, sabe-se que ela serviu de instrumento comercial para os paises donantes, e que gera impactos significativos sobre os sistemas agroalimentares nacionais dos paises que a recebem, especialmente sobre os pequenos produtores. O recurso de alguns Estados � ajuda alimentar como forma menos custosa de prover alimentos � sua popula��o prejudica os esfor�os dos agricultores de satisfazerem as necessidades de v�veres de uma popula��o crescente, que se v� agravada pela repercuss�o sobre os pre�os internos quando ocorre a venda dos produtos recebidos � t�tulo de ajuda alimentar. Nota-se, tamb�m, o isolamento da ajuda alimentar das demais a��es de integra��o, quando os benefici�rios daquela ajuda integram os mais desprovidos. 

As propostas atuais caminham no sentido de constituir um sistema de ajuda alimentar que incorpore uma concep��o de cidadania dos seus beneficiarios e que contribua � autonomia destes paises no m�dio prazo. Menciona-se, por exemplo, os programas nos quais os recursos s�o destinados a construir infraestrutura, adquirindo-se cereais em regi�es proximas com excedente para a forma��o de estoques geridos pela comunidade que seria treinada para recomp�-los e para comercializar sua propria produ��o. Refer�ncia especial deve ser feita � renova��o em curso da Conve��o de Lom� -maior programa de ajuda alimentar do mundo, entre a Uni�o Europ�ia e pa�ses da Africa, Caribe e Pac�fico- que prev� exporta��es favorecidas � Europa e um fundo de financiamento de programas de desenvolvimento. 

8. Seguran�a alimentar e com�rcio internacional 

Organismos internacionais como a OMC e a pr�pria FAO vem substituindo aquilo que consideram como uma preocupa��o excessiva com a auto-sufici�ncia alimentar (food self-sufficiency) por estrat�gias fundadas na autocapacidade alimentar (food self-reliance). Esta nova diretriz vale-se da j� referida �nfase nos problemas de acesso aos alimentos como sendo o principal condicionante da seguran�a alimentar dos pa�ses e das fam�lias, privilegiando-se a capacidade dos pa�ses acessarem os alimentos -que estariam dispon�veis em quantidade suficiente em termos globais- pela via do com�rcio internacional ou, no limite, via ajuda alimentar. 

Reedi��o de antigas teses sobre as potencialidades do com�rcio internacional, reafirmadas nos recentes acordos firmados no �mbito da OMC, esta perspectiva recebeu a ades�o, mesmo que com ressalvas, da pr�pria FAO. Esta sugere em seus documentos o ajuste � realidade de interdepend�ncia global pela ado��o de estrat�gias voltadas "para fora" e uma abordagem orientada para a liberaliza��o dos mercados dom�sticos e internacionais, acompanhadas de pol�ticas nacionais que assegurem que os efeitos positivos do com�rcio internacional na renda e no emprego atinjam os segmentos mais pobres e que estes estejam protegidos dos efeitos negativos da maior abertura comercial. As ressalvas dirigem-se aos efeitos da liberaliza��o dos mercados na distribui��o espacial da produ��o e do consumo globais e na estabilidade dos pre�os, e � eventual eleva��o dos pre�os relativos das mercadorias alimentares com a abertura dos mercados e a redu��o dos subs�dios atualmente vigentes (vista como um est�mulo a ser repassado aos pre�os dom�sticos de modo a encorajar a produ��o). 

O recurso �s importa��es, por seu turno, permitiria satisfazer as necessidades de consumo de forma mais barata do que basear-se na produ��o dom�stica, desde que os importadores possam ter no mercado mundial uma fonte confi�vel e eficiente de oferta e os exportadores disponham de crescentes mercados externos para os seus produtos. Essa proposi��o � acompanhada do reconhecimento de que podem haver raz�es espec�ficas para que alguns pa�ses busquem uma substancial auto-sufici�ncia alimentar. Uma outra ressalva deriva dos receios quanto �s medidas que restringem as exporta��es, aos constrangimentos da capacidade para importar, e aos termos de troca decrescentes para os produtos dos �pa�ses em desenvolvimento�. 

As proje��es da oferta e da demanda globais de alimentos, mesmo que positivas, s�o indicadores de disponibilidade f�sica que n�o d�o conta da l�gica mercantil que preside o acesso aos alimentos, mesmo que por doa��o. Ao que somam problemas de m�todo n�o desprez�veis. N�o por acaso as proje��es sobre o mercado internacional de produtos agroalimentares t�m chegado a conclus�es d�spares em aspectos importantes, especialmente, ap�s a eleva��o real dos pre�os e a redu��o no n�vel dos estoques internacionais de gr�os, ocorridas em 1995/96. Algumas delas sustentam que se interromper� a tend�ncia secular de queda dos pre�os que se apoiava fortemente nos grandes super�vits de produ��o e no elevado n�vel de estoques das na��es industrializadas, dando lugar a um cen�rio futuro de escassez e instabilidade. Outras afirmam que os acontecimentos recentes n�o passaram de abalo tempor�rio rapidamente absorvido pelo mercado, de modo a se restabelecer a situa��o anterior de oferta suficiente e pre�os tendencialmente declinantes. 

Apesar da discrep�ncia entre as proje��es, pode-se concluir que o com�rcio desses produtos se ampliar� nas pr�ximas d�cadas por raz�es de demanda (incrementos de renda e da urbaniza��o) e porque a maioria dos pa�ses em desenvolvimento tornarem-se importadores l�quidos de cereais (sobretudo gr�os forrageiros) e de carnes. � tamb�m �bvio que a amplia��o da capacidade de acesso dos atuais exclu�dos -a consecu��o da seguran�a alimentar- impactaria significativamente os sistemas alimentares, notadamente na esfera agr�cola ou rural. Estimativa de meados da d�cada de 1990 calcula que a demanda insolvente mundial por alimentos implicaria um acr�scimo de 400 milh�es de toneladas de equivalentes-cereais, o que representa 20 vezes o n�vel de ajuda alimentar atual. Nestes termos, um horizonte de m�dio e longo prazos conduziria a discuss�o para a an�lise das condi��es para a amplia��o sustent�vel da oferta mundial de alimentos, trazendo � t�na quest�es relativas aos limites t�cnicos e aos requisitos pol�ticos para tanto. 

Aquele tipo de formula��o induz, muito frequentemente, � falsa contraposi��o �produzir internamente todos os alimentos necess�rios versus especializar-se naqueles produtos em que se � mais competitivo�. Contraposi��o que n�o encontra sustenta��o na hist�ria de como os pa�ses enfrentam a quest�o alimentar, a qual nunca se fez pela op��o por qualquer um dos extremos da contraposi��o. A produ��o dom�stica de alimentos sempre foi econ�mica e politicamente relevante mesmo nos pa�ses muito dependentes do com�rcio exterior, assim como as importa��es de alimentos fazem parte do abastecimento de todos os pa�ses, em maior ou menor grau, como recurso permanente ou eventual. 

A associa��o do objetivo da seguran�a alimentar com um elevado grau de auto-sufici�ncia produtiva nacional dos alimentos considerados essenciais tem uma longa e diversificada hist�ria. A auto-sufici�ncia pode abarcar um n�mero expressivo ou reduzido de produtos, e pode se definir nacionalmente ou no �mbito de blocos supranacionais. Ela n�o implica em exclusiva orienta��o para o mercado dom�stico, como a convencional diferencia��o entre produ��o para mercado interno versus exporta��es enganosamente faria supor; h� in�meros casos em que a auto-sufici�ncia combina-se com a condi��o de pa�s exportador de produtos agroalimentares, em alguns, inclusive, coincidindo os principais produtos de exporta��o e os de consumo interno massivo. 

A quest�o relevante a discutir, em lugar do estabelecimento de dicotomias, � o papel a ser atribu�do aos mercados, em especial, ao com�rcio internacional, para o objetivo da seguran�a alimentar, e tamb�m quais s�o os instrumentos adequados para sua regula��o na dire��o deste e de outros objetivos an�logos. Contrariamente ao que se afirma, o com�rcio internacional n�o tem se revelado um instrumento de seguran�a alimentar, seja como fonte confi�vel e eficiente para os importadores, seja como mercado em expans�o para os exportadores, por dois motivos principais.  

O primeiro motivo � fornecido pelos resultados dos esfor�os de liberaliza��o comercial no �mbito da OMC que, apesar de ainda insignificantes, j� provocaram a eleva��o do componente importado da oferta de produtos agroalimentares na grande maioria dos Terceiro Mundo, em ritmo frequentemente superior ao do crescimento das suas exporta��es. Poucos deles est�o capacitados para exportar produtos manufaturados, segmento onde se concentra o dinamismo do com�rcio de mercadorias. Assim, pode-se concluir que os resultados dos acordos, de fato, tornaram os pa�ses e, especialmente, seus pequenos produtores menos capazes (self-reliant) e sustent�veis. O segundo motivo liga-se aos constrangimentos colocados ao manejo da pol�tica cambial e �s incertezas resultantes da instabilidade financeira que, h� tempos, caracteriza a economia internacional. A pol�tica cambial �, como se sabe, um instrumento vital na determina��o dos fluxos comerciais. 

Dois outros fatores devem ser acrescentados na an�lise do papel do com�rcio internacional para a seguran�a alimentar. Primeiro, a import�ncia espec�fica que � atribu�da � produ��o pr�pria de alimentos faz da quest�o da auto-sufici�ncia um tema politicamente sens�vel na maioria dos pa�ses. Isto � tanto mais verdade quanto maior a dimens�o do pa�s (em termos geogr�ficos e populacionais), caso em que as aquisi��es externas de alimentos limitam-se a alguns produtos particulares e a circunst�ncias excepcionais. Segundo, a crescente onda de resist�ncia social e pol�tica ao predom�nio de uma l�gica mercantil estrita num quadro de �globaliza��o da pobreza� coloca um novo elemento �s negocia��es internacionais sobre com�rcio e outros temas. 

Vale dizer, as formas de regula��o do com�rcio internacional sofrem press�es de dois tipos. A principal delas vai na dire��o de que a OMC aprofunde a perspectiva liberalizante que presidiu os acordos da Rodada Uruguai do GATT e cujos resultados estiveram muito aqu�m do esperado por seus defensores. No caso dos produtos agroalimentares, o enquadramento das pol�ticas de suporte � produ��o dom�stica dever� constituir-se num dos principais objetivos das negocia��es futuras. A outra fonte de press�o s�o os acontecimentos na esfera financeira internacional que podem vir a refor�ar os argumentos dos que defendem a introdu��o de mecanismos protetores anti-especulativos no plano internacional, e dos que apontam a conveni�ncia da ado��o de pol�ticas ativas de apoio � produ��o dom�stica em face da fragilidade das contas externas dos pa�ses do Terceiro Mundo. A referida �globaliza��o da pobreza� atingindo os pa�ses mais avan�ados -sem embargo da sua extrema gravidade nos pa�ses do Terceiro Mundo- poder� tamb�m favorecer uma amplia��o das ressalvas � l�gica mercantil estrita que ora preside os acordos internacionais.  

A tarefa mais complexa constitui-se, sem d�vida, o estabelecimento de novas refer�ncias para a regula��o do com�rcio internacional com base num enfoque onde a seguran�a alimentar deixaria de ser apenas uma ressalva toler�vel ao funcionamento das for�as de mercado. H�, aqui, um elemento de controv�rsia referente � considera��o da seguran�a alimentar (no sentido de food security) como um tema comercial e as formas de inseri-la nos acordos promovidos pela OMC. Na linha de consider�-la como uma preocupa��o n�o comercial (non-trade concerns) integrante dos acordos sobre com�rcio, uma das propostas seria a de criar uma �caixa de seguran�a alimentar� no acordo agr�cola na qual seriam previstas cl�usulas de exce��o ao livre-com�rcio dos alimentos e mecanismos de compensa��es a seus eventuais danos a serem examinados caso a caso. Isto significaria atribuir � seguran�a alimentar um estatuto semelhante ao das chamadas cl�usulas sociais e ambientais. Nesta mesma linha, por�m mais plaus�vel aos moldes atuais da OMC, h� sugest�es de acrescentar uma emenda � �caixa verde� em que est�o previstas as circunst�ncias em que se admite o apoio dom�stico fornecido aos agricultores. 

Este tipo de encaminhamento n�o seria suficiente para os enfoques baseados no direito � alimenta��o, alguns dos quais v�o ao ponto de sustentar que o com�rcio de alimentos essenciais seja retirado do �mbito da OMC. Os alimentos n�o devem ser considerados exclusivamente  como mercadorias e muito menos serem utilizados como instrumentos de press�o para fins pol�ticos ou de conquista de mercados, assim como a quest�o alimentar n�o pode ser reduzida a seus aspectos exclusivamente econ�micos. Mais do que cl�usulas espec�ficas no acordo agr�cola, a introdu��o da seguran�a alimentar na OMC requereria, em primeiro lugar, admitir o direito dos povos alimentarem-se a si mesmos com base em pol�ticas agroalimentares nacionais e regionais, e a desenvolver uma agricultura pr�pria que preencha m�ltiplas fun��es todas elas essenciais para se obter a seguran�a alimentar. Em segundo lugar, haveria que alterar alguns mecanismos gerais, principalmente desde a perspectiva dos pa�ses de baixa renda importadores de alimentos, visando criar estabilidade na oferta de alimentos, apoiar maior diversidade dos sistemas de produ��o e distribui��o de alimentos tornando-os sustent�veis e equitativos no longo prazo, e permitir que os pa�ses protejam os setores mais vulner�veis e mantenham estoques de seguran�a. Em terceiro lugar, os demais acordos da OMC que afetam a seguran�a alimentar devem ser tomados em conta, como s�o os casos do TRIPS, do SPS e de v�rias decis�es ministeriais. Sugere-se, por fim, a cria��o de um Comit� sobre Com�rcio e Seguran�a Alimentar, � semelhan�a do que ja existe sobre ambiente. 

Como conclus�o, sugere-se rejeitar a contraposi��o entre uma estrat�gia voltada para a auto-sufici�ncia e uma baseada na autocapacidade, assim formulada com o objetivo de sustentar a correspondente ado��o dessa �ltima como a mais adequada ao contexto atual. Em primeiro lugar, porque esse enfoque equivoca-se quanto � natureza dos chamados �mecanismos de mercado� e coloca o abastecimento alimentar sob o dom�nio de formas de regula��o privada com pouco, por vezes nenhum, sentido p�blico. Formas de regula��o com um sentido p�blico requerem, ademais, o suporte das ag�ncias de estado e o concurso de organismos e conv�nios internacionais. Nos mercados internacionais � que se revela, da forma mais clara, a dimens�o institucional dos mercados, de modo que fatores como a atua��o dos governos e dos referidos organismos colocam-se como t�o ou mais importantes que os aspectos ligados � efici�ncia produtiva para a determina��o da confiabilidade do mercado internacional como fonte de renda e de abastecimento alimentar. 

Em segundo lugar, porque desconhece a import�ncia espec�fica da produ��o dom�stica de alimentos, e como ela se combina, nos distintos pa�ses, com o com�rcio internacional dos produtos agroalimentares. Admitir o suposto de economia aberta n�o implica abandonar toda e qualquer refer�ncia � auto-sufici�ncia produtiva e aderir, incondicionalmente, ao enfoque da autocapacidade. Trata-se, isto sim, de reconhecer o lugar peculiar e estrat�gico ocupado pela produ��o dom�stica de alimentos, e de atribuir um papel definido, por�m, realista �s trocas internacionais no abastecimento alimentar, em simult�neo � busca por estabelecer novas formas de regula��o das mesmas. 

Em terceiro lugar, por fim, porque o com�rcio internacional, como tal, est� longe de constituir-se em fonte confi�vel de seguran�a alimentar para os pa�ses em geral. 

9. Consumo, seguran�a dos alimentos e direitos do consumidor 

A abordagem do consumo de alimentos deve considerar o grau de heterogeneidade social dos pa�ses, particularmente no Terceiro Mundo onde as desigualdades de renda tendem a ser mais elevadas.  

Os gastos com alimenta��o t�m um peso muito distinto na composi��o das despesas das fam�lias nos diferentes estratos de renda, sendo que o acesso regular e adequado aos alimentos nos estratos inferiores � custoso (absorve parcela significativa da renda familiar) e pode comprometer o acesso a outros bens e servi�os necess�rios a uma vida digna. Este aspecto deve ser contemplado pelas pol�ticas de emprego e renda (particularmente as pol�ticas salarial e previdenci�ria), e as relativas � produ��o. 

Graves problemas por insufici�ncia de alimenta��o provocada por restri��es de renda coexistem com padr�es de consumo t�picos das camadas de renda mais elevada, an�logos aos encontrados nos pa�ses industrializados. Isto implica que as pol�ticas de seguran�a alimentar t�m o duplo desafio de enfrentar, simultaneamente, a car�ncia alimentar (a fome) e os problemas derivados de h�bitos alimentares inadequados (gerando a obesidade e outros). Quanto � primeira, seu car�ter vital faz com que as pol�ticas antes mencionadas sejam acompanhadas de programas de suplementa��o alimentar; j� o segundo tipo de problema requer medidas preventivas educativas frente a um fen�meno que se tornou uma quest�o de sa�de p�blica pois se manifesta inclusive entre as camadas populares. 

Circunst�ncias da vida contempor�nea e os impactos de poderosos instrumentos de propaganda t�m alterado a forma de aquisi��o e de consumo dos alimentos (por exemplo, consumo de produtos elaborados em lugar de produtos in natura) e a pr�pria composi��o da cesta habitual de compras. Preocupa��es quanto � adequa��o nutricional, por sua vez, fazem com que se questione a essencialidade de v�rios produtos de consumo generalizado, reproduzindo o antigo embate entre a imposi��o de preceitos nutricionais versus o respeito a h�bitos alimentares adquiridos.  

A evolu��o do perfil do consumo na dire��o de um padr�o de alimenta��o em que t�m grande ou crescente import�ncia a utiliza��o de alimentos preparados e a refei��o realizada fora do domic�lio nos n�cleos urbanos de m�dio e grande porte acarretam importantes implica��es em termos de a��es e pol�ticas p�blicas de seguran�a alimentar. As refei��es fora do domicilio colocam novas exig�ncias para a a��o do poder p�blico que ultrapassam a convencional atua��o normatizadora e fiscalizadora dos servi�os de alimenta��o. Uma iniciativa que vem ganhando import�ncia � o oferecimento de refei��es de qualidade a pre�os acess�veis atrav�s da implanta��o de restaurantes populares nas zonas centrais das cidades de maior porte. A experi�ncia tem revelado que, al�m do benef�cio aos usu�rios destes restaurantes, sua exist�ncia gera impactos positivos nos servi�os de alimenta��o das zonas onde eles est�o localizados. A concess�o de subs�dio no pre�o da refei��o parece ser um recurso inevit�vel para adequ�-lo � baixa renda dos usu�rios, embora o montante de tal subs�dio seja relativa e absolutamente pouco expressivo em face dos impactos diretos e indiretos dos referidos restaurantes. 

Os atributos de qualidade dos alimentos tornaram-se, tamb�m, um requisito comercial em fun��o da referida demanda crescente por produtos elaborados (isto �, com servi�os neles incorporados), e da preocupa��o com a seguran�a dos alimentos (no sentido de food safety). Esta preocupa��o � acentuada pelo modelo de produ��o e de consumo que promove o distanciamento entre ambas as esferas e o recurso a t�cnicas e insumos produtivos visando o aumento da produtividade e a diferencia��o do bens finais de consumo.  

As normas internacionais relativas aos alimentos s�o de responsabilidade da Comiss�o Internacional do Codex Alimentarius, organismo criado na d�cada de 1960 sob a �gide da FAO e da OMS, atualmente composto por 165 pa�ses. A import�ncia crescente adquirida pelo Codex foi refor�ada por suas delibera��es terem sido admitidas como refer�ncia para as negocia��es comerciais realizadas no �mbito da OMC. Os pa�ses membros comprometem-se a criar comiss�es nacionais do Codex visando estabelecer normas nacionais que venham a ser compat�veis com aquelas deliberadas em n�vel internacional. Tais comiss�es deveriam constituir-se em importante espa�o de participa��o das entidades representativas dos consumidores de modo a contrabalan�ar a enorme influ�ncia nelas exercidas pelas grandes corpora��es internacionais, como vem tentanto fazer a duras penas a Consumers International, �nica organiza��o n�o-gvernamental participante da Comiss�o Internacional do Codex.  

� de se esperar conflitos crescentes frente �s iniciativas para introduzir o princ�pio da precau��o entre as regras que governam o com�rcio mundial de alimentos. Este princ�pio, consagrado em tratados internacionais sobre o meio-ambiente, foi recentemente estendido pela Fran�a para a vigil�ncia sanit�ria dos alimentos em 1998, e tornou-se objeto de delibera��o espec�fica por parte da pela Uni�o Europ�ia, em Fevereiro de 2.000. Ele preconiza que na aus�ncia de certeza cient�fica absoluta sobre os riscos potenciais para a sa�de humana (bem como para o ambiente, os animais e vegetais), a d�vida deve beneficiar os consumidores, ficando os governos autorizados a recorrerem a medidas provis�rias visando proteg�-los, com destaque �s de car�ter sanit�rio e fito-sanit�rio e � suspens�o da comercializa��o do(s) bem(ns) em quest�o. Embora sem se referirem explicitamente ao princ�pio, o acordo da Rodada Uruguai do GATT e o acordo fito-sanit�rio da OMC tamb�m prev�m o recurso a tais medidas, ainda que pondo �nfase em que sejam m�nimos seus impactos sobre o livre-com�rcio. Contudo, as diverg�ncias entre os pa�ses na defini��o deste princ�pio e as suspeitas de sua aplica��o de forma discriminat�ria, somadas � indefect�vel defesa do livre-com�rcio, permitem prever acesa pol�mica sobre a sua ado��o. 

Ainda referente � qualidade dos alimentos as entidades de defesa dos consumidores lutam pela garantia dos seguintes direitos:

a) direito de acesso a alimentos seguros

b) direito � informa��o, inclusive face ao risco de informa��es erradas e mesmo enganosas

c) direito � reclamar e � justa compensa��o por danos

d) direito � uma educa��o alimentar que dote o consumidor de habilidades e conhecimentos que permitam escolher e consumir de forma segura e adequada os alimentos, com vistas � introdu��o de pr�ticas saud�veis de alimenta��o

e) direito de ser escutado, atrav�s da participa��o dos consumidores na formula��o de pol�ticas p�blicas, na avalia��o de normas e regulamentos e na implementa��o de a��es relativas aos alimentos

f) direito a um ambiente saud�vel com vistas a promover um consumo sustent�vel, em fun��o dos impactos ambientais da produ��o, do processamento e do consumo (no aspecto do descarte) de alimentos 

As entidades de consumidores v�m tendo destacado papel em campanhas de seguran�a alimentar, notadamente na mais recente delas ligada aos produtos OGM�s. Contudo, seria fundamental que elas fossem al�m do tema da qualidade dos alimentos consumidos de modo a englobar desde o acesso � terra at� o consumo, incluindo-se a� uma articula��o mais estreita entre campo e cidade. 

Os crescentes requisitos de qualidade dos alimentos e de instrumentos para assegur�-la resultaram na generaliza��o da perspectiva da rastreabilidade dos produtos, que vem sendo rapidamente adotada pelos principais agentes das cadeias agroalimentares, ao mesmo tempo em que aumentaram as exig�ncias em termos da confiabilidade da certifica��o e do registro dos alimentos e da estrutura e do modo de atua��o dos servi�os p�blicos de vigil�ncia sanit�ria. As informa��es prestadas pelo fabricante s�o consideradas suficientes a menos que surjam problemas derivados do uso do respectivo produto. Trata-se de um mecanismo claramente insuficiente para assegurar a qualidade dos mesmos, al�m de n�o ser adequado � realidade dos pequenos produtores em face das exig�ncias estabelecidas nas normas de fabrica��o. 

Seria fundamental que a regulamenta��o e o funcionamento dos servi�os de vigil�ncia sanit�ria buscassem promover atividades de produ��o desses bens em bases mais eq�itativas, em lugar de simplesmente punir os pequenos produtores que n�o se enquadram nas normas dadas. 

10. Sustentabilidade alimentar 

A exemplo da discuss�o conceitual sobre a seguran�a alimentar, o conceito de sustentabilidade tamb�m � fruto de intensa disputa e ainda n�o aparece como uma no��o acabada. Isto vai se refletir, da mesma forma, sobre o entendimento acerca da no��o de agricultura sustent�vel. Para �rg�os como a FAO, ou na declara��o que emergiu da chamada Agenda 21, trata-se de um conjunto de regras ou pr�ticas produtivas, com preocupa��es muito restritas ao aspecto ambiental. Para um conjunto de  ONGs e movimentos sociais que trabalham com o tema, vai-se al�m da quest�o da produ��o agr�cola, compreendendo-se a sustentabilidade em suas dimens�es ambiental, mas tamb�m social, econ�mica e pol�tica. Pensar de forma articulada estas dimens�es permite deslocar o foco dessa discuss�o para o homem, em toda a diversidade que comporta. 

A agricultura como � concebida nos padr�es convencionais gera dois tipos de amea�a � sua sustentabilidade. A primeira se d� atrav�s da intensifica��o da atividade agr�cola, pela ado��o de pr�ticas monocultoras e de uso excessivo de insumos qu�micos e mecaniza��o pesada. A segunda, ocorre pela sobreutiliza��o dos recursos naturais e pela mobiliza��o de ecossistemas extremamente fr�geis. Nos pa�ses em desenvolvimento, em muitos casos, esse esgotamento dos recursos naturais acontece pela press�o exercida por popula��es que s�o v�timas de processos de concentra��o fundi�ria, sendo obrigados a seguir uma l�gica de curt�ssimo prazo para garantir sua sobreviv�ncia imediata. 

No contexto atual em que est� organizada a produ��o de alimentos, no mundo atual, a compatibiliza��o da sustentabilidade com a seguran�a alimentar � um desafio cercado de dificuldades, mas tamb�m carregada de muitas oportunidades. A necessidade de manter a oferta de alimentos em condi��es de atender milh�es de consumidores em cada pa�s traduz a maior dessas dificuldades. A FAO prop�e a intensifica��o da produ��o, com diversifica��o, mas sua viabilidade parece duvidosa, j� que a intensifica��o se faz a partir da especializa��o e da depend�ncia crescente dos insumos industriais. 

O melhor caminho na busca de um sistema alimentar sustent�vel parece ser o fortalecimento da agricultura familiar ou camponesa, enquanto forma��o social mais adequada para garantir a seguran�a alimentar em condi��es sustent�veis. Isto devido �s pr�prias caracter�sticas que lhes s�o inerentes. De um lado, por a sua identifica��o com modelos produtivos que d�o �nfase � diversifica��o da produ��o, . Por outro lado, pela e a maior mobilidade para diferentes destina��es do resultado de seu trabalho, podendo variar entre os extremos de depender exclusivamente de fontes externas do mercado ou recuar at� o completo auto-abastecimento.  

Considere-se, ainda, a maior disposi��o desse produtor em entregar � sociedade os produtos de seu trabalho sem exigir que sua taxa de retorno seja superior ou igual � de outras atividades que poderia exercer, por n�o trabalhar subordinado � l�gica do lucro. Isto possibilita que sua manuten��o na atividade agropecu�ria n�o fique independente de mudan�as conjunturais, o que o faz responder favoravelmente a favorecendo o atributo da estabilidade na seguran�a alimentar. Some-se a estes aspectos, o fato dessa modalidade de agricultura, embora tamb�m utilizando maquinaria e insumos qu�micos, o fa�a em menor grau, valendo-se de outros recursos, como a for�a animal e a aduba��o org�nica. Por isso emprega mais m�o de obra, fortalecendo a equidade e reduzindo a pobreza rural. O recurso da produ��o para autoconsumo, por sua vez, pode atenuar o problema da desnutri��o no meio  rural.  

Dentro da realidade da maior parte dos pa�ses em desenvolvimento, algumas propostas devem ser encorajadas. A primeira refere-se � necessidade de um ordenamento territorial, distinguindo-se as terras impr�prias para a agricultura ou mesmo para outros usos, as terras de uso restrito e aquelas mais indicadas para o cultivo. A segunda orienta��o est� relacionada � concess�o de est�mulos (pre�os de suporte, cr�dito agr�cola, etc.) para aqueles que adotam tecnologias benignas ou de recupera��o ambiental, incentivando-se um modelo agr�cola de base agroecol�gica. 

Mesmo no contexto de primazia do mercado global, que tende a aprofundar o processo de exclus�o da agricultura de base familiar, tamb�m neste �mbito s�o oferecidas oportunidades poss�veis de serem aproveitadas. Expandem-se os mercados de produtos chamados �naturais�, org�nicos ou daquilo que se denomina produtos de �clientela�, cujas variedades encontram especial acolhida nos pa�ses desenvolvidos. 

O encontro de objetivos da sustentabilidade e da seguran�a alimentar tamb�m se define no campo ideol�gico, pela afirma��o da supremacia do direito � alimenta��o e aos recursos naturais enquanto bens p�blicos que devem ser assegurados a todos. E pela identifica��o de que a desigualdade � a causa principal da incapacidade de acesso aos alimentos, bem como elemento desencadeador de pr�ticas de apropria��o de bens naturais, que perdem seu car�ter p�blico para assumirem o papel privado de instrumento para a acumula��o do capital. Esta compreens�o desautoriza a mitifica��o do chamado �livre mercado�. Na busca de consecu��o articulada dos objetivos contidos nas categorias da sustentabilidade e da seguran�a alimentar refor�a-se a necessidade da regula��o dos mercados e o papel indispens�vel do Estado nessa media��o. 

H� que se explorar todas as possibilidades de encontro e concerta��o entre os atores sociais envolvidos com os dois temas, incluindo-se a� agricultores, consumidores, ambientalistas, etc. 

A partir dos sentidos aqui enunciados � que se expressa a id�ia da �sustentabilidade alimentar� como marco te�rico-pol�tico de trabalho, buscando enfrentar articuladamente as preocupa��es com respeito �s diversas dimens�es que se mostram comuns � agricultura sustent�vel e � seguran�a alimentar. 

11. Impactos dos OGMs na Seguran�a Alimentar  

Pode-se afirmar que a luta contra a imposi��o dos Organismos Geneticamente Modificados adquiriu para a seguran�a alimentar mundial um significado de grandes riscos e possibilidades. 

Assiste-se, nos �ltimos anos, a uma aglutina��o, at� ent�o n�o experimentada, dos principais atores sociais que se mobilizam em torno das bandeiras da seguran�a alimentar e da sustentabilidade. O enfrentamento do problema dos OGMs, mais do que em qualquer outra situa��o, vem logrando articular camponeses, ambientalistas, consumidores e mesmo cientistas em prol de um mesmo objetivo. E a preocupa��o despertada na opini�o p�blica mundial surpreende e obriga � revis�o das pr�prias estrat�gias das transnacionais envolvidas com os produtos transg�nicos. Mas este parece ser um embate que est� apenas em seu in�cio, obrigando um atento acompanhamento sobre a movimenta��o daquelas empresas. 

No debate sobre a seguran�a alimentar, � preciso que se enfrente o argumento propagado pelos grupos interessados na produ��o dos transg�nicos de que estes produtos se constituem na solu��o do problema da fome no mundo. Trata-se da mesma fal�cia utilizada no per�odo da �Revolu��o Verde�, quando tamb�m se afirmava que esta acabaria com a fome no mundo. N�o deve ser subestimada a for�a deste recurso publicit�rio empregado pelas transnacionais,  de que os OGMs podem acabar com a fome, sobretudo nos pa�ses n�o desenvolvidos, onde esse problema assume propor��es de calamidade. 

� preciso que esta afirma��o seja energicamente desmentida, mostrando-se que a  fome vai acabar no dia em que estiver superada a exclus�o de milh�es de pessoas e que a estas seja reconhecido e assegurado um direito que � anterior a qualquer outro, que � o de poder adquirir ou produzir alimentos sadios e de qualidade. E devem ser transmitidas as inquieta��es cientificamente reconhecidas, como a amea�a � biodiversidade, a n�o assegurada inocuidade desses alimentos e o oligop�lio que vem se constituindo por tr�s dessas empresas, visando a controlar n�o apenas o mercado de sementes, mas todo o pacote tecnol�gico da produ��o alimentar. 

Ao lado de uma argumenta��o consistente, que coloca os temas centrais da seguran�a alimentar em debate para um vasto p�blico, E� necess�rio, ainda, que se proceda � constitui��o de propostas para o enfrentamento � investida dos transg�nicos. Evidentemente, muito do que � encaminhado em cada pa�s diz respeito �s particularidades locais, mas duas propostas v�m encontrando receptividade mais ampla: a morat�ria para plantio e comercializa��o de transg�nicos e a rotulagem desses produtos.

 A morat�ria dos OGMs baseia-se na constata��o de n�o ter existido o tempo m�nimo necess�rio de investiga��o para poder se afirmar que os transg�nicos s�o inofensivos � natureza e � sa�de. O a�odamento em lan�ar estes produtos no mercado � gerado pela pressa em fazer retornar o capital investido pelas  empresas transnacionais envolvidas nesta aventura, n�o podendo ser aceito pela opini�o p�blica mundial. Por outro lado, � uma proposta que possibilita aos movimentos sociais mobilizados nesta luta ganharem tempo para fazer crescer ainda mais esta mobiliza��o. 

Quanto � rotulagem dos produtos transg�nicos deve-se considerar dois aspectos bastante distintos. De um lado, deve ser tratado como um direito inquestion�vel do consumidor ser informado sobre aquilo que consome. E isto vale para qualquer produto. No caso dos transg�nicos pode se tornar em um embara�o para as ind�strias processadoras de alimentos a obriga��o de declarar a presen�a de componentes geneticamente modificados, embora em muitos pa�ses seja incerta a confiabilidade deste tipo de informa��o. De outro lado, h� que se ter cuidado com a defesa dessa proposta, j� que ela traz em si mesma a admiss�o da permiss�o do com�rcio de alimentos transg�nicos. 

Um ponto ainda a se atentar na luta atualmente travada � a necessidade de denunciar energicamente a utiliza��o de alimentos transg�nicos na ajuda alimentar internacional. Diversas firmas agroalimentares t�m obtido contratos com o Programa Mundial contra a Fome, da FAO/ONU, visando dar uma destina��o aos seus estoques de alimentos geneticamente modificados rejeitados pelos mercados de diversos pa�ses, o que � eticamente inaceit�vel.   

12. Patrim�nio cultural da alimenta��o em risco 

Cada sociedade, ao longo da sua hist�ria, construiu (e continua a construir) um conjunto de pr�ticas alimentares que constituem seu patrim�nio cultural. S�o estas tradi��es, peculiares a cada grupo social, que permitem �s pessoas se reconhecerem como integrantes do mesmo tecido social. Estas escolhas alimentares e estas pr�ticas de cozinha estiveram sempre associadas � regi�o e �s condi��es locais de exist�ncia. Dentre todos os elementos que comp�em a cadeia alimentar s�o as diferentes cozinhas que melhor exprimem as tradi��es e costumes de uma sociedade. 

No final deste s�culo, observa-se uma ruptura radical destes sistemas alimentares. A urbaniza��o acelerada fez com que produtos do mundo inteiro se misturassem, transformando progressivamente os h�bitos alimentares. Os exemplos recentes desta globaliza��o alimentar  s�o o hamburguer e a coca-cola, s�mbolos do que � mais moderno, seguro (enquanto alimento higi�nico), f�cil e r�pido de comer. 

Os efeitos culturais, econ�micos e sociais deste padr�o alimentar s�o sentidos diferentemente segundo as classes sociais. De fato, s�o os grupos mais pobres os mais atingidos por esta massifica��o alimentar. Carecendo de informa��o, s�o os mais atingidos pela propaganda e estrat�gias de marketing. Os pequenos produtores, por sua vez, encontram dificuldades de comercializa��o de seus produtos, os quais n�o disp�em do mesmo apelo publicit�rio. 

De que forma � poss�vel, enquanto cidad�os e consumidores, defender e preservar a diversidade cultural alimentar de uma sociedade ?

Desde logo, � fundamental que cada sociedade possa conhecer sua hist�ria agr�cola e alimentar, e que este patrim�nio seja valorizado enquanto tal. Vale dizer, cada sociedade deve poder compreender que seus h�bitos mais antigos guardam uma identidade. Al�m do que, � preciso destacar que gra�as a esta cultura alimentar elas puderam se manter, durante s�culos, auto-suficientes e com um maior controle sobre a  qualidade de seus produtos alimentares. Uma vez decifrada sua cultura alimentar fica mais f�cil o restabelecimento de algumas pr�ticas alimentares, mesmo que estas tenham sido completamente abandonadas.  

Entretanto, para que este processo seja bem sucedido � fundamental que as sociedades rurais sejam preservadas e ajudadas, com pol�ticas espec�ficas, especialmente no que se refere � agricultura familiar. Os produtos alimentares devem ser transformados localmente e segundo a tradi��o destas regi�es, desenvolvendo-se em simult�neo a��es que estimulem sua. comercializa��o em feiras e mercados regionais e, mesmo, atrav�s das redes de supermercados.  

13. Pr�ticas alimentares e valor nutricional da alimenta��o 

Os alimentos sofreram um processo de grande transforma��o nos �ltimos cinquenta anos. A ind�stria tem alterado perigosamente as caracteristicas inerentes aos alimentos, comprometendo sua qualidade. Neste sentido, o processo agroalimentar passou  a depender de elementos qu�micos tanto na produ��o agr�cola quanto na transforma��o industrial. Como conseq��ncia, o padr�o alimentar apresenta-se com uma grande quantidade de gordura animal, prote�na, sal e a��car e carece de fibras, vitaminas, minerais, carboidratos complexos e �leos vegetais. Observa-se in�meras doen�as relacionadas diretamente a este regime alimentar como diferentes tipos de c�ncer, as alergias, as doen�as do aparelho circulat�rio e a obesidade. As popula��es mais pobres do planeta sofrem n�o apenas da fome (o n�o acesso � alimenta��o) mas tamb�m das doen�as ditas �modernas� relacionadas � qualidade dos alimentos. 

Este processo tem afastado progressivamente os alimentos de sua origem, a terra, tornando-os meros produtos industriais. Observa-se assim uma enorme dist�ncia entre os produtores e os consumidores. Para uma popula��o que � cada vez mais urbana, a escolha dos alimentos mais indicados ao seu bem estar tornou-se um problema. Face a uma imensa variedade de cores e sabores, as escolhas s�o feitas sem que as pessoas tenham todas as informa��es necess�rias. Os crit�rios que guiam as escolhas s�o sobretudo o pre�o, o aspecto e a facilidade de preparo e n�o as qualidades nutricionais dos produtos.  

Quais seriam as alternativas para se conseguir uma alimenta��o saud�vel, ou seja, que pudesse estar adequada �s necessidades dos indiv�duos ?   

Em primeiro lugar � preciso um trabalho de reeduca��o alimentar. O consumidor precisa estar consciente das suas escolhas alimentares bem como das raz�es pelas quais ele consome este ou aquele alimento. � importante estar consciente tamb�m dos efeitos destas escolhas sobre a sua sa�de, o meio ambiente e � reparti��o social da riqueza.  

Uma dieta � saud�vel na medida em que fornece todos elementos necess�rios ao desenvolvimento e a manuten��o do organismo. Assim, � preciso que a dieta seja equilibrada, ou seja, que seja baseada em glic�dios complexos: arroz, batata, macarr�o, farinha e p�o. Que os legumes e frutas sejam privilegiados, fornecendo os minerais, vitaminas e fibras. Que as prote�nas sejam utilizadas com modera��o: carne, peixe, ave, ovo, presunto, leite, queijo e yogurte. Que s�mente pequena quantidade de gordura seja consumida: manteiga, azeite e �leo. Ao mesmo tempo, � fundamental que esta dieta seja de alta qualidade, que os elementos que a comp�em sejam frescos (deve-se evitar os alimentos congelados), naturais (sofrendo o m�nimo poss�vel os efeitos da transforma��o industrial) e integrais (deve-se evitar os cereais n�o integrais e o a��car refinado). Finalmente, � essencial que esta dieta seja gostosa e que respeite os h�bitos alimentares regionais.  

Em segundo lugar, cabe aos consumidores o importante papel de zelar pela manuten��o da qualidade dos alimentos em toda a cadeia alimentar, desde a produ��o agr�cola que deve ser isenta de produtos qu�micos at� a transforma��o industrial, que deve ser realizada sem o comprometimento da qualidade nutricional do alimento. Este aspecto � melhor desenvolvido em outra parte do texto. 

Em terceiro lugar, � necess�rio que os consumidores enquanto cidad�os defendam uma distribui��o mais justa da riqueza. Os impactos socio-econ�micos e ambientais das suas escolhas alimentares precisam ser real�ados.  E� fundamental que todos compreendam que a partir das escolhas alimentares pode-se aumentar o poder das grandes corpora��es alimentares ou, ao contr�rio, pode-se dar importante contribui��o ao desenvolvimento da agricultura familiar que, por sua vez, pode fornecer um alimento seguro, produzido em harmonia com o meio ambiente e revitalizando as regi�es rurais. 

14. Formula��o de pol�ticas p�blicas e participa��o da sociedade civil  

A discuss�o sobre a formula��o de pol�ticas p�blicas de seguran�a alimentar exige considerar a diversidade de situa��es existentes entre os pa�ses, seja pelas diferentes necessidades que neles se expressam, seja pelos graus igualmente diferenciados dos pap�is exercidos pelos estados e dos n�veis de organiza��o social neles encontrados. 

Mas nesta an�lise, pode-se partir de algumas premissas comuns em meio a toda esta diversidade. A primeira premissa refere-se ao car�ter multidimensional e intersetorial que deve ser assumido na gest�o das pol�ticas p�blicas de seguran�a alimentar, conforme j� discutido. A conseq��ncia pr�tica da aceita��o dessa premissa � que o exerc�cio das pol�ticas de seguran�a alimentar deve partir de inst�ncias interministeriais. Superando um entendimento equivocado, da seguran�a alimentar subordinada � produ��o de alimentos e, em conseq��ncia,  tendo sua pol�tica definida no limite restrito do planejamento agr�cola. Ao contr�rio, entendendo a seguran�a alimentar como um dos elementos articuladores das macropol�ticas, a elabora��o e execu��o de suas pol�ticas devem se dar atrav�s de intensa articula��o nos diferentes campos de interven��o do estado, como o agr�cola, a sa�de, a educa��o, o trabalho, a tecnologia, o ambiental e no atual contexto de globaliza��o, as rela��es internacionais, entre outros. 

Uma outra premissa relevante � a que articula as a��es de natureza emergencial com as estruturais, rompendo com falsas dicotomias baseadas na separa��o entre o econ�mico e o social, t�o consagrada dentro dos esquemas neoliberais que produzem a concentra��o da riqueza e a pobreza e depois administram pol�ticas �sociais� para atenu�-las. 

N�o podem ser exercidas pol�ticas de natureza estrutural sem que sejam considerados os efeitos imediatos que ser�o provocados sobre as popula��es que est�o em seu �mbito. Muitos exemplos podem ser dados, entre eles a necessidade de programas de reconvers�o produtiva de agricultores a um modelo diversificado de agricultura, sem colocar em risco sua sobreviv�ncia econ�mica neste per�odo. 

Quanto �s pol�ticas emergenciais, elas se concretizam em programas e a��es p�blicas dirigidas a grupos populacionais espec�ficos, com o objetivo de suplementar car�ncias alimentares e nutricionais e que s�o qualificadas como medidas assistenciais de natureza compensat�ria. Tais iniciativas sempre foram objeto de resist�ncia justamente por apenas amenizarem os efeitos perversos das situa��es de injusti�a social e, para alguns, por dificultarem o enfrentamento e a supera��o dos fatores promotores da injusti�a. Aponta-se, tamb�m, para o fato do assistencialismo constituir-se em campo prop�cio para pr�ticas populistas e demag�gicas, para o desvio de recursos e para a corrup��o. Assim, a admiss�o da exist�ncia destes programas � quase sempre acompanhada de ressalvas ao fato deles precisarem existir e reafirma��es da expectativa de que sejam provis�rios. 

O que aqui se afirma aqui � que as pol�ticas emergenciais de seguran�a alimentar s�o indispens�veis para o enfrentamento de problemas que n�o podem esperar o tempo de resposta de medidas estruturais que devem estar sendo tomadas simultaneamente. E estas medidas emergenciais devem trazer obrigatoriamente componentes ligados a uma transforma��o estrutural das condi��es geradoras das situa��es que as justificam. No que se refere especificamente � distribui��o de alimentos, os programas compensat�rios devem se caracterizar por serem:

a) educativos, em rela��o aos h�bitos e pr�ticas alimentares;

b) organizativos, para a defesa dos direitos de cidadania;

c) emancipadores, visando promover a autonomia e n�o a depend�ncia dos benefici�rios. 

Uma pol�tica de distribui��o de alimentos, por exemplo, deve incluir a cria��o das condi��es e obrigatoriedade das fam�lias �benefici�rias� em ter os filhos  na escola, em constituir conselhos locais com a participa��o dos pr�prios �benefici�rios� para o acompanhamento dessa pol�tica, etc. 

Embora se desenvolvam em contexto bastante distinto, cabe uma men��o aos programas de ajuda alimentar nos pa�ses ocidentais mais avan�ados, inclusive porque seus rumos tendem a repercurtir no restante do mundo. A inseguran�a alimentar pela dificuldade de acesso aos alimentos afeta um contingente significativo da popula��o destes pa�ses, mas raramente � identificada como tal nos programas e indicadores oficiais. Ela se deve sobretudo ao pre�o dos alimentos em face dos demais bens que integram os gastos das fam�lias, sendo tempor�ria e mesmo sazonal (pois se agravando durante o inverno). Sup�e-se que os sistemas de prote��o social cobrem todas as necessidades b�sicas dos mais pobres e as respostas dos governos � quest�o alimentar s�o, quando muito, parciais. Os EUA s�o a principal exce��o, sendo o pa�s com maior percentual (13%) da popula��o atendido por programas de ajuda alimentar, e tamb�m o que tem atua��o mais antiga e programas alimentares mais amplos, por�m, com cortes or�ament�rios recentes que levaram a um maior envolvimento da sociedade civil. � importante notar que o reconhecimento crescente da problem�tica alimentar vem se dando no b�jo de reformas nas pol�ticas sociais cuja orienta��o caracteriza-se pela maior responsabiliza��o dos benefici�rios (e.g., compromisso de retorno ao trabalho), e pelo relativo desengajamento do Estado atrav�s de mecanismos assentados na a��o local e na participa��o das comunidades. 

O princ�pio da aten��o p�blica para assegurar direitos que devem ser universais, como � o caso do direito � alimenta��o suficiente e adequada, sustenta-se mesmo no caso dos programas em que � conveniente buscar uma maior focaliza��o nos respectivos benefici�rios. Por�m, em lugar de contrap�r �universaliza��o versus focaliza��o�, � poss�vel preservar direitos universais e atuar de modo a contemplar os diversos grupos de benefici�rios da a��o p�blica. A focaliza��o dos programas pode ser um elemento de discrimina��o positiva dos benefici�rios, e n�o um pretexto para reduzir o papel do Estado mesmo que sob a justificativa de estabelecer parcerias com a sociedade. Nestes termos, a focaliza��o visando a eq�idade social significa definir prioridades e tratar desigualmente os desiguais, combinando os programas assim orientados com a��es universais que evitem o crescimento dos grupos priorit�rios destes mesmos programas. 

As pol�ticas de seguran�a alimentar devem se constituir em um espa�o privilegiado de exerc�cio do interesse p�blico, o que pressup�e efetivo envolvimento da sociedade civil. Ou seja, n�o se constitui num assunto exclusivamente governamental, devendo garantir a cria��o de novos espa�os institucionais que assegurem a constitui��o de efetivas parcerias e que sejam adequados � articula��o de iniciativas em �reas bastante diversas. 

N�o � simples a constitui��o dessas inst�ncias de concerta��o entre atores sociais diferenciados em sua ess�ncia. Parceria pressup�e trabalhar em prol de um objetivo mais geral que � comum entre as partes envolvidas. Ao mesmo tempo, estas partes n�o s�o iguais (se fossem iguais, n�o seria uma parceria). Elas possuem pap�is diferentes e trabalhar em parceria significa saber articular positivamente as diferentes atribui��es que cabem a cada parte. 

Quem pode ser parceiro, na implementa��o de pol�ticas de seguran�a alimentar? Examine-se inicialmente as rela��es estabelecidas pelo Estado com o setor privado. Este �ltimo apresenta grande e crescente autonomia decis�ria em rela��o ao Estado, al�m de contar freq�entemente com redes internacionalizadas com grande velocidade de negocia��o e de decis�o em quest�es econ�mico-financeiras fundamentais. Por seu turno, a atua��o do Estado � marcada por estruturas administrativas pouco flex�veis e por processos de decis�o que demandam negocia��o profunda com atores que t�m exig�ncias espec�ficas. Tais processos requerem grande disp�ndio de energia pol�tica e podem, por vezes, levar � paralisia decis�ria. Assim, esta modalidade de parceria na �rea da seguran�a alimentar apresenta grandes dificuldades de ser concretizada, ainda mais se considerando que no campo econ�mico, os interesses do setor privado voltam-se preferencialmente aos locais e grupos mais rent�veis. Defronta-se aqui com a situa��o de que, constantemente, este setor doa recursos de um lado enquanto promove danos sociais e ambientais de outro, Cabe, neste caso, a proposi��o de um c�digo de conduta �tica para pautar a rela��o do setor privado com o trabalho social e com as organiza��es n�o-governamentais. 

Quanto �s rela��es de parceria entre o Estado e as organiza��es da sociedade civil, h� que se considerar, inicialmente, a representatividade dos segmentos mais pobres da popula��o em f�runs, conselhos ou outras inst�ncias equivalentes, criadas como espa�os consultivos ou decis�rios dos quais podem se originar a��es em parceria. Assinale-se, que na grande maioria dos casos, ainda n�o existe uma consci�ncia da seguran�a alimentar  na sociedade civil e menos ainda nesses segmentos mais vulner�veis. Al�m disso, freq�entemente inexiste uma tradi��o associativa nessas comunidades, o que n�o se resolve de imediato pela instala��o dessas inst�ncias. Da� resulta que o �de baixo para cima� quase sempre n�o funciona e em muitos lugares estas inst�ncias t�m exist�ncia mais formal do que real. Considere-se, ainda, que sua efetividade depende do grau de converg�ncia de prop�sitos entre os governos e as organiza��es da sociedade civil e do crit�rio de composi��o dos f�runs de negocia��o. A sociedade civil tende a organizar-se sob a l�gica da a��o solid�ria e cooperativa, em contraste com a forte presen�a no interior dos governos de uma l�gica de conflito (em lugar da coopera��o) e de a��o seletiva. Mas todas estas dificuldades n�o anulam o fato de que a constitui��o desses espa�os de parceria e sua regulamenta��o t�m sido importantes para definir espa�os que fogem ao controle do poder local tradicional, e podem assegurar a defini��o de a��es que favorecem as comunidades alvo dessas parcerias. 

Por fim, cabe uma refer�ncia � import�ncia particular do �mbito local no desenho e na implementa��o de a��es e programas p�blicos de suplementa��o alimentar. Isto porque � justamente na identifica��o de grupos populacionais com car�ncias espec�ficas e na atua��o junto a eles que fica mais evidente a relev�ncia das inst�ncias locais. Por esta raz�o � que se verifica a tend�ncia j� bastante generalizada � implementa��o descentralizada de programas alimentares. Sabe-se, ainda, que as situa��es emergenciais de car�ncia alimentar tendem a repercutir diretamente sobre o n�vel da administra��o p�blica mais pr�ximo do cidad�o e sobre as entidades assistenciais ou caritativas locais. Costuma ser tamb�m muito grande o n�mero de iniciativas tomadas no �mbito dos munic�pios ou das comunidades visando propiciar aux�lio alimentar sob a forma de programas p�blicos, da mobiliza��o de redes sociais ou mesmo de atitudes isoladas. Portanto, a atua��o junto a grupos populacionais espec�ficos para enfrentar car�ncias alimentares e para favorecer uma alimenta��o adequada constitui-se numa esfera de atua��o local visando o objetivo da seguran�a alimentar.

Uma agenda relativa � formula��o de pol�ticas p�blicas de seguran�a alimentar e ao estabelecimento de inst�ncias representativas e democr�ticas para sua implementa��o, n�o pode mais se limitar nos planos locais e nacionais. Torna-se priorit�rio pensar esta agenda tamb�m em um escopo internacional. Enumeram-se aqui alguns pontos para esta discuss�o:

-         Como engajar a comunidade internacional para promover o direito humano � alimenta��o?

-         Como subordinar a l�gica e o sistema internacional de regula��o do com�rcio a uma l�gica e um sistema que lhe deve preceder, no campo dos direitos econ�micos, sociais e culturais e que t�m na seguran�a alimentar um de seus principais eixos?

-         Como garantir um sistema de regula��o mundial de estoques dentro da perspectiva da seguran�a alimentar?

-         Como estabelecer um c�digo de conduta internacional que estabele�a novos par�metros para a ajuda alimentar?

-         Como construir inst�ncias globais de articula��o e representa��o da sociedade civil no campo da seguran�a alimentar e como viabilizar sua participa��o nos f�runs de decis�o dessas pol�ticas?

Documentos Consultados

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Fichas de Experi�ncias

A diversidade s�cio-espacial que caracteriza a maioria dos pa�ses implica, obviamente, em problemas e prioridades diferenciadas, bem como em processos distintos de defini��o e encaminhamento dessas prioridades. O recurso � an�lise de experi�ncias em curso, por sua vez, permite identificar as contribui��es ou os elementos apropri�veis dessas experi�ncias que n�o se circunscrevem a uma realidade particular, mesmo que cada um deles carregue as marcas da realidade que os originou. A relev�ncia geral dos aspectos principais de cada experi�ncia e a adapta��o de algumas das solu��es por elas encontradas n�o implica a postura de construir pr�ticas ou modelos indicados como a melhor solu��o (o famoso enfoque das best practices). Ao contr�rio, valoriza-se aqui uma concep��o em que as iniciativas de promo��o de desenvolvimento social, no caso, associadas � promo��o da seguran�a alimentar, constituem a instaura��o de processos em que meios e fins s�o definidos pelas sociedades-comunidades que os vivenciam e que envolvem um forte componente de aprendizado social, processos que extraem energia dos desequilibrios e tens�es que geram, e que devem ser abertos �s diversas poss�veis solu��es e seus resultados n�o intencionais.

2-13) 

[Fichas 1 a 11 - j� em franc�s]
Quadro 1: Causas da inseguran�a alimentar em diversas regi�es do mundo

Africa subsaha-riana

�frica Norte e Oriente M�dio

�sia Ocidental e Sul

China

Sudeste Asi�tico

Jap�o

Tecnologia

x

x

Problemas clim�ticos

x

x

x

x

x

Pol�tica

agr�cola*

x

x

x

x

x

Acesso a insumos

x

Acesso � terra

x

x

Acesso �* �gua

x

x

x

x

Eros�o de florestas, salinisa��o, polui��o

x

x

x

Pre�os

x

x

Abasteci-mento

x

Liberaliza��o

x

x

x

Concentra��o humana

x

x

Sa�de*

x

x

x

Desemprego

Renda

x

x

H�bitos alimentares*

x

x

Qualidade alimentos

Valor nutricional

x

x

x

x

Valor nutricional+

x

x

Minorias*

Soudan

Sahel

India

x

x

G�nero

x

x

x

x

x

Guerra

x

x

x

Timor

Desloca-mentos

Ouganda Rwanda Burundi

x

x

Timor

Desastre econ�mico

Rep. Du Congo

Afghanistan

x

Birmanie

San��es econ�micas

Sierra Leone,

Burundi

e Liberia

Irak

Fome pol�tica*

Soudan

Irak

Afghanistan

Chine

Birmanie

Europa Ocidental

Leste da Europa + Mong�lia e Cor�ia Norte

EUA e Canad�

M�xico

Am�rica Central e Caribe

Pa�ses Andinos

Brasil e Sul

x

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x

x

x

x

Cuba- Haiti

x

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x

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x

alcoolismo Russia

novo padr�o alimentar

Brasil

frutas, cebolas

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x

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x

x

x

x

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x

Yougoslavia

Yougoslavia

Sem Terra

x

Coreia do Norte

Yougoslavia

Cuba

Haiti

Kosovo

             

* Pol�tica agr�cola : Avec notemment les effets des politiques de monocultures pour l'exportation qui se font au d�triment des agricultures vivri�res.(Afrique, Asie).

* Acesso � �gua : Le probl�me de l'eau peut �tre national, ou une question de r�partition. Par exemple au Moyen Orient, l'eau est rare, au Br�sil ce n'est pas un probl�me g�neral mais  l'acc�s aux ressources  est in�galitaire.

* Liberaliza��o: casos analisados em http://www.forumsyd.se/globala.htm

+ Fatores de inseguran�a alimentar provocados pela liberaliza��o: importa��es mais baratas que pre�os locais (Philippines, Madagascar, Ghana, Mexico); acr�scimo dos pre�os dos insumos (id�); prioridade das exporta��es, omiss�o das car�ncias locais (India, Mexico, Philippines, Uruguay, Cambodia); acr�scimo dos sem-terra (vendem �s grandes empresas) (Cambodja); eros�o, polui��o por causa da monocultura para exporta��o (Philippines); diminui��o dos servi�os publicos (Philippines); acr�scimo das migra��os para cidades (desemprego, favelas,..); destabilisa��o do mercado interno (Philippines, Kenya)

+ Fatores de inseguran�a alimentar acentuados pela liberaliza��o: privatiza��o; desemprego massivo (M�xico, India, Sri Lanka); cat�strofe natural (os estados s�o menos implicados); car�ncias nas pol�ticas financeira e econ�mica (Am�rica Central); dificuldades das mulheres; desigualdade no accesso aos recursos de insumos, �gua, terra, tecnologia, etc.)

* Sa�de : Les probl�mes de sant� r�currents de certaines populations entrainent des d�ficiences au niveau de la production des aliments car ils affaiblissent les personnes , ainsi qu'au niveau de l'assimilation des aliments (notemment les enfants malades assimilent tres mal la nourriture qu'ils absorbent). Exemple: Le sida en Afrique, la malaria, contaminations par l'eau non potable, etc.

* H�bitos alimentares : La mani�re de s'alimenter est cause d'ins�curit�. Par exemple, dans le Nord Est du  Br�sil certaines carences pourraient �tre �vit�es si la population concern�e consommait plus d'oignons et de fruits, produits qui existent en quantit� suffisante � cet endroit. Les nouveaux mod�les alimentaires notemment aux Etats-unis (o� un tiers des personnes souffrent d'ob�sit�), et au Canada sont aussi des facteurs d'ins�curit� alimentaires.

* Minorit�s : Constatation que le fait d'appartenir � une minorit� aggrave les chances d'ins�curit� alimentaire. Par exemple, les Noirs aux Etats-Unis, les Intouchables en Inde, les Musulmans en Birmanie, les Chr�tiens et les Animistes au Soudan, les Nomades au Sahel, les Indiens et les Noirs en Am�rique Latine, ...

* Fome pol�tica : Dans certains pays la faim des populations d�coule d'une volont� politique des dirigeants. Ainsi, par exemple, Saddam Hussein accentue la faim en Irak caus�e par le blocus en revendant la nourriture �chang�e contre le p�trole aux pays voisins, afin de financer son maintien au pouvoir, et d'accentuer cette cons�qence du blocus pour en obtenir la lev�e. La faim politique peut aussi �tre le r�sultat d'une volont� d'�liminer une population "genante", comme au Soudan, en Birmanie, en Afghanistan , en ex-Zaire, au Rwanda, au Kosovo ; le but de ces famines peut aussi �tre l'obtention d'argent, de nourriture, de camions gr�ce � une couverture m�diatique qui d�clenche l'arriv�e de l'aide internationale, le pays acquiert alors une visibilit� internationale pr�alable � la reconnaissance politique (Afrique).

Quais os principais desafios para alcançar segurança alimentar?

Dentre os desafios atuais que se colocam para o enfrentamento e a garantia da SAN no Brasil estão as desigualdades sociais, étnico-raciais e de gênero, o acesso e a disponibilidade aos alimentos saudáveis em ambientes não obesogênicos e o consumo de alimentos de qualidade nutricional adequada 13.

Qual o conceito de segurança alimentar e nutricional?

Segundo a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – LOSAN (Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006), por Segurança Alimentar e Nutricional – SAN entende-se a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras ...

Qual a importância da segurança alimentar para a população?

A segurança alimentar também pode ser evidenciada pelo aumento da eficiência na produção agrícola e a redução do desperdício de alimentos. Segundo a FAO, mais de 30% da produção mundial é desperdiçada a cada ano entre as fases de pós-colheita e a venda no varejo.

Qual é a importância da segurança alimentar e nutricional?

Qual é o objetivo da segurança alimentar? Em síntese, a segurança alimentar tem o intuito de assegurar a todos os indivíduos alimentos básicos de qualidade, em quantidades satisfatórias permanentemente e sem afetar o acesso a outras necessidades fundamentais com relação às práticas alimentares saudáveis.