Bens de terceiros podem ser penhorados

O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que a prova documental inequívoca de que os bens penhorados pertencem a terceiros pode fazer-se a partir de indicadores que, embora não demonstrem diretamente essa titularidade, assegurem, de forma suficiente, que aqueles não pertencem ao executado.

O caso

No âmbito de uma execução contra ela intentada, para cobrança de uma dívida, a devedora viu serem penhorados diversos bens existentes na casa onde morava, incluindo eletrodomésticos, uma aparelhagem, um amplificador, uma mesa e uma arca.

Perante essa penhora, ela opôs-se à mesma alegando que os bens penhorados pertenciam em parte à proprietária da casa que lhe estava arrendada e em parte ao seu namorado, também ele arrendatário, que os tinha trazido consigo da Holanda, de onde era natural. Fê-lo apresentando o contrato de arrendamento onde constava que o imóvel tinha sido arrendado com máquina de lavar roupa e máquina de lavar loiça, e o contrato de seguro dos bens que o namorado fizera aquando do seu transporte para Lisboa.

Mas o tribunal entendeu que esses documentos não provavam, de forma inequívoca, que os bens penhorados não fossem da executada e julgou improcedente a oposição, decisão da qual esta recorreu para o TRL.

Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa

O TRL julgou procedente o recurso, revogando a decisão recorrida e determinando o levantamento da penhora sobre os bens em causa, ao decidir que a prova documental inequívoca de que os bens penhorados pertencem a terceiros pode fazer-se a partir de indicadores que, embora não demonstrem diretamente essa titularidade, assegurem, de forma suficiente, que aqueles não pertencem ao executado.

O agente de execução deve proceder à penhora de bens móveis não sujeitos a registo encontrados em poder do executado, por se presumir que estes lhe pertencem, cabendo, depois, ao executado ou a terceiro ilidir, querendo, essa presunção perante o juiz mediante a apresentação de requerimento acompanhado da prova documental donde resulte manifesto o direito do terceiro sobre os bens penhorados.

Nesse sentido, dos documentos apresentados terá de resultar, inequivocamente, que tais bens pertencem a terceiro ou que esse terceiro sobre eles tem um direito real menor de gozo que implique a sua usufruição.

Não obstante, estando em causa bens não sujeitos a registo, essa prova documental inequívoca terá de fazer-se, as mais das vezes, a partir de indicadores que, não constituindo embora demonstração direta da titularidade dos mesmos por terceiros, assegurem, de forma suficiente, que estes não pertencem ao executado.

Esse é o sentido útil da norma que, servindo o princípio da economia processual e evitando o recurso aos embargos de terceiro, permite a demonstração expedita pelo executado, por alguém em seu nome ou por terceiro, de que o bem penhorado não deve, afinal, ser afetado pela diligência por não constituir propriedade do executado.

No caso, a executada juntou dois documentos para prova de que parte dos bens penhorados pertenciam à proprietária do imóvel onde foi realizada a penhora e que lhe estava arrendado, e que outra parte pertenciam ao seu namorado com quem vivia, também ele arrendatário da fração.

Ora, resultando do contrato de arrendamento respeitante à fração onde foi levada a cabo a penhora que as máquinas de lavar roupa e loiça penhoradas correspondiam aos bens móveis que equipavam a fração locada, tal evidencia que não pertenciam à executada. Do mesmo modo, resultando do certificado de seguro apresentado que o namorado da executada transferira para a seguradora a responsabilidade emergente de sinistros verificados com o transporte em viatura, da Holanda para Lisboa, de outros bens atingidos pela penhora, tal constitui comprovativo bastante de que esses bens eram dele e não da executada.

Deste modo, concluiu o TRL, que tendo ficado demonstrado que esse bens não pertenciam à executada, devia proceder a oposição, determinando o levantamento da penhora sobre os mesmos.

Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 3625/14.3T8OER-A.L1-7     
Código de Processo Civil, artigos 735.º, 751.º e 764.º

A situação da inadimplência é um problema antigo e segundo pesquisas recentes de marcado, o cenário só está piorando. Considerando os problemas econômicos atuais e alta na taxa do desemprego, não há como ser muito otimista com relação ao futuro do pagamento de dívidas.

No entanto, há cenários que deixam as coisas ainda mais difíceis, trata-se da hipótese de o devedor, maliciosamente, transferir seus bens para terceiros, com o intuito de não pagar suas dívidas e proteger seu patrimônio.

Se já houve a propositura, por parte do credor, de uma ação de execução da dívida, a transferência dos bens para terceiros pode configurar o que chamamos de fraude à execução, e o juiz pode determinar que a transferência seja desfeita.

O que é fraude à execução?

Esse problema é mais recorrente do que se imagina, e prevê uma má-fé do devedor, que por meio de estratégias fraudulentas, age para não ter seus bens penhorados para o pagamento de suas dívidas.

Nesse cenário, considera-se fraude à execução quando o devedor se desfaz de seus bens enquanto há uma ação de execução contra si, o intuito é não ter bens em seu nome para o adimplemento da dívida, lesando o devedor.

Na hipótese de o credor conseguir provar que a venda dos bens do devedor configura fraude à execução, é possível que a alienação realizada seja anulada e o bem volte à titularidade do devedor, possibilitando sua penhora para pagamento da dívida.

No entanto, é possível que o devedor tenha se antecipado e transferido os bens antes do ajuizamento de qualquer ação, aí as coisas ficam um pouco mais complicadas, mas ainda sim possíveis.

Nessa situação, cabe ao devedor analisar com cuidado a vida do devedor. Isso porque, é possível que pela forma como o devedor se apresenta à sociedade, seja notado alguns traços que indicam que a transferência de bens foi fraudada.

Pensa na situação da transferência de um automóvel para o filho que é menor de idade, ou que não possua carteira de habilitação. Por certo que esse cenário é suspeito e pode ser investigado, ainda mais se for notado que o devedor está fazendo uso recorrente do automóvel.

Pode ocorrer ainda do automóvel ser transferido a um terceiro, estranho ao devedor, mas a posse do mesmo continua com ele, sendo possível atestar que o devedor está fazendo uso normal do veículo.

Situações dessa natureza podem ser indicativos de que o devedor utilizou de meios fraudulentos para não pagar suas dívidas e pode ser responsabilizado por isso. A estratégia de quem decide agir de má-fé e não pagar suas dívidas não consiste apenas na venda de bens, mas inclui também a doação, o que acaba facilitando um pouco mais a vida do credor para provar o alegado. Se o devedor tem uma quantia considerável a ser paga para terceiros, como pode doar voluntariamente seus bens?

Além do mais, é possível que o devedor poste em suas redes sociais, por exemplo, uma vida totalmente incompatível com o padrão de vida que alega ter, ostentando itens de luxo e uma vida que não condiz com a escassez de bens que alega. Nesses casos, é possível que o devedor seja intimado a se justificar e explicar a situação.

Fato é que, essas situações externas podem ser indicativos fortes de que está ocorrendo uma fraude por parte do devedor, sendo possível essa alegação em juízo e uma análise mais criteriosa da situação.  

Pode penhorar bens em nome de outra pessoa?

É permitida, com algumas restrições, a penhora de bens de terceiros, por exemplo, os pais de uma pessoa que contraiu uma dívida que deu origem a uma ação executiva, que, por sua vez, culminou numa penhora sobre os respetivos bens.

Pode penhorar bem de terceiro?

PENHORA DE BEM EM NOME DE TERCEIRO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇAO DA EXISTÊNCIA DE FRAUDE OU DA PROPRIEDADE PELO DEVEDOR.... O juiz deve cumprir a lei e ela não permite que a penhora alcance bens de terceiros, alheios ao processo.

Pode penhorar veículo em nome de terceiro?

O fato de o veículo se encontrar registrado em nome de terceiro não obsta seja penhorado, porque a propriedade dos bens móveis se transmite pela tradição, máxime quando comprovado que o bem se encontra na posse dos executados, criando presunção juris tantum.

O que fazer quando o devedor coloca os bens em nome de terceiros?

Basta que se evidencie a intenção de fraude contra o credor. Muitas vezes, o direito adquirido em uma sentença não é cumprido pelo devedor, sendo necessário o ajuizamento de um processo de execução como forma de satisfazer o crédito com mais eficácia.