Porque o maratonista brasileiro Vanderlei Cordeiro ganhou a medalha de Pierre de Coubertin?

“A minha primeira maratona foi por acaso”.

A frase é de Vanderlei Cordeiro de Lima, o maior maratonista brasileiro de todos os tempos. Ele é o único do país a conquistar uma medalha na modalidade mais tradicional das Olimpíadas.

Natural de Cruzeiro do Oeste, no interior do Paraná, Vanderlei começou a ganhar destaque em corridas de rua há 25 anos, ao terminar a tradicional corrida de São Silvestre em quarto lugar. A partir dali, sua carreira deslanchou.

Dois anos depois, em 1994, ele teve certeza de que o seu forte eram os percursos de 42 km. Contratado para ser o “coelho” numa maratona na França, ou seja, para iniciar a prova na dianteira e estabelecer o ritmo aos demais competidores, o brasileiro se empolgou e venceu a competição.

“Fui convidado para ser coelho na maratona de Reims. Coelho é o atleta que dita o ritmo da prova e se sacrifica para que os demais façam o resultado e atinjam marcas. Fui contratado para correr 21 km, mas estava me sentindo bem e pensei que poderia correr mais 5 ou 10 km. A partir do km 32 comecei a liderar a prova, fui até o final e ganhei”, conta o atleta.

O triunfo na maratona de Reims surpreendeu o próprio Vanderlei e o seu treinador Ricardo D’Angelo. “Foi ali que realmente eu descobri que essa era a minha prova”.

Nos anos seguintes, conquistou resultados expressivos, como a vitória na Maratona de Tóquio, em 1996, o bicampeonato nos Jogos Pan-Americanos (1999 e 2003) e o título e recorde na Maratona de São Paulo, em 2002. O auge aconteceu nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004.

Um bronze que valeu ouro

A história é conhecida mundialmente. Vanderlei Cordeiro liderava a maratona nas ruas de Atenas até ser agredido por uma manifestante irlandês, que o agarrou no quilômetro 35 e o puxou para fora do percurso.

Porque o maratonista brasileiro Vanderlei Cordeiro ganhou a medalha de Pierre de Coubertin?

Vanderlei Cordeiro exibe a bandeira do Brasil em Atenas, após conquistar o bronze

Imagem: Clive Mason/Getty Images

“Ele avançou numa velocidade repentinamente, não tive nem reação de defesa. Pensei que a pessoa pudesse atentar contra minha vida. Ali você perde as pernas, é um choque muito grande”.

Com a ajuda de torcedores que assistiam à prova, Vanderlei conseguiu se desvencilhar do agressor e voltou a correr, ainda em primeiro lugar. Minutos depois, foi ultrapassado por dois maratonistas e terminou a prova em terceiro.

“Quando cheguei ao estádio do Panathinaikos, era como a conquista de um grande prêmio da minha vida. Não importava a cor da medalha, mas sim o fato de ser uma medalha olímpica”.

O atleta brasileiro poderia ter contestado o resultado final, já que fora prejudicado pelo manifestante. Mas optou por celebrar a conquista do bronze.

“Não teria por que reclamar. Era comemorar e agradecer a Deus e aos deuses olímpicos. Aquilo saiu de dentro do meu coração, pelos valores da superação e da conduta e para mostrar que existe espírito olímpico”, finaliza.

O gesto rendeu a Vanderlei Cordeiro a medalha Pierre de Coubertin, entregue pelo Comitê Olímpico Internacional a atletas que aplicam os ideais do olimpismo em uma situação adversa. Ele recebeu a medalha simbólica em 2015. Um ano depois, foi escolhido para acender a pira olímpica na abertura dos Jogos do Rio.

Vanderlei Cordeiro de Lima foi o escolhido para acender a pira olímpica nos Jogos Rio-2016 Imagem: Jae C. Hong/AP

ESPORTE(ponto final)

A entrevista com Vanderlei Cordeiro de Lima foi realizada pelo ESPORTE(ponto final), um canal produzido a partir de depoimentos de ídolos sobre os grandes momentos do esporte.

A cada semana, novos episódios serão lançados na página especial do ESPORTE(ponto final). E você também pode acompanhar nas mídias sociais: youtube.com/esportepontofinal e facebook.com/esportepontofinal.

A maratona em que o corredor brasileiro deu sua melhor performance foi também aquela em que foi sabotado por uma agressão

Ingredi Brunato, sob supervisão de Thiago Lincolins Publicado em 14/07/2021, às 09h33

Vanderlei Cordeiro de Lima é um dos maiores maratonistas já nascidos em território nacional. Mais do que seu talento, ele é reconhecido por ser um exemplo de espírito esportivo: o dia da maior conquista de sua carreira, em que ele recebeu uma medalha olímpica de bronze, também foi o dia em que o atleta foi agredido no meio da prova. 

O fato de ter continuado a despeito do que lhe aconteceu, e ainda conseguido estar entre os primeiros três colocados impressionou não apenas os espectadores, mas também os jurados do Comitê Olímpico Internacional.

Outros competidores, na situação do brasileiro, poderiam ter ficado com raiva e interrompido a maratona ali mesmo, porém Vanderlei não deixou que o contratempo o fizesse desistir, e ainda teve a energia de comemorar sua colocação quando cruzou a linha de chegada, conquistando o bronze. 

Início da carreira 

Segundo documentado pelo site oficial do atleta, sua paixão pela corrida começou já no início da vida. Isso pois o paranaense, quando jovem, época em que já trabalhava na roça, gostava de cruzar as plantações de café e cana-de-açúcar que ficavam no caminho de sua escola a toda velocidade que conseguia. 

Foi um treinador do colégio de Vanderlei, inclusive, que identificou a aptidão do garoto para maratonas quando ele tinha somente 12 anos. Assim, o brasileiro começou a praticar desde cedo o esporte que terminaria se tornando sua carreira. 

E não demorou muito para que o jovem atleta entendesse que as corridas poderiam virar sua profissão: com apenas 16 anos, seu destaque já o levou a ser convidado para treinamentos mais sérios. 

Ele passou por diversas equipes e treinadores renomados, e em 1994 a preparação começou a dar frutos, que foi quando o corredor teve a oportunidade de participar da Maratona de Reims, na França, onde desempenhou o papel de “coelho”. 

O termo se refere a maratonistas que são contratados pelas organizações para correr apenas metade da prova, estabelecendo uma velocidade média para os atletas que estão de fato competindo. 

A mais famosa maratona 

Em 2004, o paranaense já era um corredor de sucesso internacional, sendo uma das principais apostas do Brasil para ganhar o ouro em sua categoria nas Olimpíadas de Atenas. Tratava-se ainda de uma edição particularmente animadora da competição internacional, por estar ocorrendo no país que inventou as olimpíadas. 

No dia da maratona, o atleta brasileiro teve uma das melhores performances de sua carreira, liderando a prova por mais de uma hora e estando ainda muito à frente dos outros competidores. 

A linha de chegada ficava ao fim de 35 quilômetros, todavia quando faltavam apenas 7 para a tão sonhada vitória, um manifestante irlandês o empurrou, não apenas atrapalhando seu curso mas a própria concentração do corredor. O ocorrido foi relembrado pelo site Olimpíada do Dia em uma matéria de 2020. 

Porque o maratonista brasileiro Vanderlei Cordeiro ganhou a medalha de Pierre de Coubertin?
Trecho de gravação das Olimpíadas de Atenas que mostra momento que Vanderlei foi empurrado para longe do curso / Crédito: Divulgação/ Youtube/ Olympics

Apesar do obstáculo, Vanderlei estava determinado a dar o seu melhor, e continuou correndo. Com a ajuda de alguns outros atletas que viram o episódio, o brasileiro continuou liderando a maratona durante dez minutos antes de dois outros corredores conseguirem ultrapassá-lo. 

Apesar da injusta intervenção de alguém que deveria estar apenas assistindo a corrida, e do maratonista ter acabado chegando em terceiro lugar, ele comemorou mesmo assim, fazendo seu tradicional gesto de “aviãozinho” que gostava de simular quando tinha uma vitória. 

 "Na verdade, naquele ano havia um sonho que eu sempre alimentei, que era o de conquistar uma medalha olímpica. Não importava a cor. Então, quando cheguei ao término da prova no Estádio Panathinaikos e senti que já tinha ganhado o bronze, esqueci daquilo que tinha ocorrido no quilômetro 35”, comentou Vanderlei na época, segundo divulgado pelo seu site oficial. 

“A minha conquista foi maior que a decepção de não ter ficado com o ouro. Para falar a verdade, eu nem estava mais preocupado com aquilo que o cara tinha feito. Nunca vou reclamar da vida. Eu só tenho que agradecer a Deus por tê-la me dado", concluiu ainda o maratonista. 

Sua ação inspiradora fez com que recebesse uma premiação ainda mais exclusiva que as da olimpíada: ele foi escolhido pelo Comitê Olímpico Internacional para ganhar a medalha Pierre de Coubertin como forma de reconhecimento pelo seu espírito olímpico. Com isso, Vanderlei ainda se tornou o único atleta latino-americano a receber essa honrada condecoração.

Porque o maratonista brasileiro Vanderlei Cordeiro ganhou a medalha de Pierre de Coubertin?
Fotografia de Vanderlei acendendo pira olímpica nas Olimpíadas Rio 2016 / Crédito: Getty Images 

Sua importância no mundo do esporte foi tanta que ele foi até mesmo escolhido para acender a pira olímpiada da cerimônia de abertura das últimas olimpíadas, de 2016, que foram sediadas no Brasil. 

O que fez o brasileiro Vanderlei de Lima receber a medalha Pierre de Coubertin?

FICHA TÉCNICA. A carreira de Vanderlei Cordeiro de Lima tomou outro rumo após o bronze conquistado nos Jogos Olímpicos Atenas 2004. O ato heroico de continuar na prova, mesmo tendo sido agredido durante a prova, e a demonstração de espírito olímpico o levaram a ser homenageado pelo COI com a medalha Pierre de Coubertin ...

Qual atleta recebeu a medalha Pierre de Coubertin e por qual motivo?

A medalha Barão de Coubertin de Vanderlei foi uma homenagem ao espírito esportivo demonstrado durante a disputa. O brasileiro liderava a corrida a 7 km do final quando foi abraçado pelo ex-padre irlandês Cornelius Horan.

O que impediu a vitória do brasileiro Vanderlei Cordeiro de uma maratona olímpica em 2004?

Vanderlei Cordeiro de Lima é um dos grandes nomes da história olímpica brasileira. Em 2004, ele liderava a maratona quando foi impedido por um padre irlandês. Em 2016, ele foi o responsável por colocar o fogo na pira olímpica no Maracanã.

O que significa a medalha de Barão de Coubertin?

A medalha Barão de Coubertin é uma premiação concedida pelo COI à atletas e pessoas envolvidas com o esporte que demonstrem alto grau de esportividade e espírito olímpico dentro e fora das competições.