Como são internalizados os tratados internacionais de direitos humanos e o status normativo hierárquico constitucional que recebem?

O STATUS NORMATIVO DOS TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS E O BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE

Resumo


O STATUS NORMATIVO DOS TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS E O BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE

Introdução: No Brasil, de acordo com o atual entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal (STF), os tratados internacionais que versam sobre direitos humanos podem ter dois níveis hierárquicos diferentes, ou seja, podem possuir status normativos diversos. Desta forma, os tratados internacionais de direitos humanos quando ratificados pelo Brasil seguindo o rito legislativo previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal, possuem equivalência à Emenda Constitucional. Além disso, a jurisprudência considera que os tratados de direitos humanos que foram ratificados pelo Brasil, mas que não seguiram o rito legislativo previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal possuem status supralegal. Porém, considerando que os direitos e garantias protegidos pela Constituição Federal não excluem outros originários de tratados internacionais, os quais o Brasil tenha ratificado (art. 5º, § 2º, da CF), existe uma corrente doutrinária que entende que a Constituição recepciona igualmente todos esses tratados. Objetivo: Este trabalho busca verificar o status dos tratados internacionais de direitos humanos na ordem jurídica brasileira, tendo em vista a divergência doutrinária a respeito do tema. Metodologia: O trabalho baseia-se em pesquisa bibliográfica, com análise de doutrina e jurisprudência. Utiliza-se o método dedutivo. Torna-se necessário traçar um histórico evolutivo do entendimento jurisprudencial brasileiro a respeito do nível hierárquico dos tratados de direitos humanos na ordem jurídica brasileira, abrangendo também o entendimento doutrinário a respeito. Resultados: Todas as normas que versam sobre direito constitucional são normas materialmente constitucionais. Esse mecanismo funciona como uma nuvem, onde todas as normas de conteúdo constitucional repousam. Isso se chama Bloco de Constitucionalidade. Isso significa dizer que as normas que integram o rol de direitos e garantias fundamentais são constitucionais. Assim, parte de doutrina do Direito Internacional entende que todos os tratados de direitos humanos, por terem conteúdo constitucional, possuem status constitucional. Conclusão: Atualmente, pelo entendimento do Supremo Tribunal Federal, como os tratados de direitos humanos podem ter níveis hierárquicos diferentes, alguns direitos humanos possuem status normativo mais elevado que outros. Se o status constitucional for reconhecido a todos os tratados de direitos humanos, ocorrerá uma paridade normativa, promovendo-se uma proteção ainda maior aos direitos das pessoas, sobretudo pela impossibilidade de se reduzir tais direitos.

Palavras-chave: Tratados de Direitos Humanos; Status; Bloco de Constitucionalidade.


Introdução:

A Constituição brasileira de 1988, têm entre seus propósitos o Estado Democrático de Direito e a proteção aos Direitos Humanos Fundamentais, garantindo o efetivo exercício dos direitos civis, sociais, liberdades, entre outros direitos. Além disso, tem também como tarefa manter a estabilidade do ordenamento jurídico do país, se encontrando no topo da pirâmide hierárquica das leis.

Com o fim da Segunda Guerra, muito se falava na proteção aos Direitos Humanos. Assim, começaram a surgir os primeiros Tratados Internacionais que tinham como objetivo o cumprimento desses direitos em maior escala e territorialidade. Estes tratados são instrumentos normativos de grande complexidade, isto porque são fontes de Direito Internacional e Interno, além de refletirem diversos impactos aos Estados e sujeitos do Direito Internacional signatários.

Dentre estes impactos, surgiu há pouco tempo uma discussão no Brasil a respeito do controle de convencionalidade, sendo este um complemento ao controle de constitucionalidade a partir dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos. Diante disso, os Tratados Internacionais de Direitos Humanos têm natureza e nível constitucional? O que é o controle de convencionalidade? Qual a importância do controle para a manutenção dos Direitos Humanos? São algumas indagações que queremos discutir. 

1. O status hierárquico dos tratados sob a ótica do Art. 5º, §§ 2 e 3: 

A criação da recente Constituição, foi um marco significativo para o início da redemocratização do estado brasileiro e da institucionalização dos direitos humanos no país, tendo em vista que o mundo estava se recuperando das crises humanitárias, econômicas e sociais por consequência da Segunda Guerra. A sua promulgação representou a abertura do nosso sistema jurídico para uma nova ordem, para um sistema mais democrático e humano. Assim, dezenas de tratados regionais e internacionais direcionados a proteção dos direitos da pessoa humana foram ratificados pelo Brasil, criando normas diretamente aplicáveis pelo Judiciário, e ainda incorporando novos direitos e garantias além daqueles já constantes em nosso ordenamento interno.

Sabendo da importância dos tratados internacionais, o legislador constituinte os evidenciou no art. 5º, §2 da lei maior, dando a oportunidade de interiorizar essas normas internacionais ao ordenamento pátrio com a seguinte disposição: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”. Dito isto, cabe então compreendermos um pouco a respeito do status destes tratados na pirâmide hierárquica das leis, a partir do art. 5º, §§ 2 e 3.

O mencionado dispositivo (§2), segue a tendência do constitucionalismo contemporâneo, na defesa dos tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como sendo de nível e índole constitucional, de aplicação imediata, não podendo ser revogado por lei ordinária anterior. Nesse sentido, para Valério Mazzuoli, se a lei supracitada estabelece que os direitos e garantias nela elencados “não excluem” outros provenientes dos tratados internacionais “em que a República Federativa do Brasil seja parte”, é porque ela própria está a autorizar que esses direitos e garantias internacionais constantes dos tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil “se incluem” no nosso ordenamento jurídico interno, passando a ser considerados como se escritos na Constituição estivessem. 

A Carta supramencionada, de maneira inédita, passou a reconhecer no que tange os direitos e garantias duas fontes normativas: a) aquela advinda do direito interno (são os direitos expressos e implícitos na Constituição); b) aquela proveniente do direito internacional (tratados regionais e internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil). Fato é que a lei maior colocou os tratados internacionais de direitos humanos como sendo uma fonte do sistema constitucional de proteção de direitos, com a mesma eficácia e igualdade das normas constitucionais expressas ou implícitas. Para Flavia Piovesan “Os direitos enunciados nos tratados de direitos humanos de que o Brasil é parte integram, portanto, o elenco dos direitos constitucionalmente consagrados.”

Embora, parte da doutrina compreenda que o art. 5º, §2 insere os tratados de direitos humanos como norma de nível constitucional, a jurisprudência e o Supremo Tribunal Federal não se satisfazem com este entendimento. Assim, em virtude da controvérsia doutrinária e jurisprudencial, a Emenda Constitucional 45 de 2004, estabeleceu no art. 5º, §3 que “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.”.

 Para a doutrina, o novo dispositivo traz uma controvérsia, isto porque o §2 adiciona os tratados internacionais como norma de nível constitucional, como já foi mencionado anteriormente. O §3 dispõe que os tratados internacionais de direitos humanos, quando não aprovados pelo quórum qualificado em ambas as casas, em dois turnos, se encontrará no nível das leis federais, status supralegal na pirâmide hierárquica das leis. Por outro lado, caso sejam aprovados, passa de um status material, para formal equivalentes às emendas constitucionais.

 A EC 45/2004, ao invés de suprimir as discussões, aumentou-as mais ainda. De toda forma, os tratados internacionais que vigoram no Brasil, são normas constitucionais, o que os tornam paradigmas para o controle de produção normativa doméstica. É o que se denomina controle de convencionalidade.

2. O Controle de Convencionalidade: 

Do ponto de vista jurídico, é necessário que seja diferenciado o controle de constitucionalidade e o controle de convencionalidade das leis. No primeiro é analisada a compatibilidade do texto legal com a Constituição. No segundo importa verificar se o texto está de acordo com os Tratados Internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil. Invalidando assim as leis que não sejam compatíveis com os tratados mais favoráveis, bem como com a Constituição.

A teoria do controle de convencionalidade no Brasil, surgiu há pouco tempo, na defesa do doutorado de Valério Mazzuoli, para o mesmo, além de compatíveis com a Constituição, as normas internas devem estar em conformidade com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo governo e em vigor no país, condição a que se dá o nome de controle de convencionalidade. Esse controle tem como finalidade compatibilizar verticalmente as normas domésticas (lato sensu) com os tratados internacionais nos quais o Brasil é signatário.

Nesse sentido, trata-se de adaptar os atos e normas internas aos Tratados Internacionais assumidos pelo Estado, uma vez que criam deveres no plano internacional em que o país signatário se compromete a assumir e cumprir. Os direitos e deveres assumidos pelos países que ratificam os tratados, refletem no ordenamento jurídico dos mesmos. Assim, seu sistema deve estar de acordo não somente com suas normas constitucionais, mas também pelos tratados assumidos.

Ademais, o controle de convencionalidade deve ser aplicado tanto pelos tribunais internos, quanto pelos tribunais internacionais ou supranacionais, estes últimos são convencionados entre os Estados signatários que se comprometem a respeitar e seguir tudo o que ali for decidido, sob pena de responsabilidade internacional.

O controle pode ser difuso ou concentrado. No primeiro referido, é equivalente ao controle de constitucionalidade, assim que os tratados forem incorporados ao direito pátrio, os tribunais locais poderão aplicar o controle nos casos concretos. Já no segundo controle referenciado, fica por conta do STF, devendo seguir o rito do art. 5º, §3, somente deve ser matéria os tratados que versam sobre os Direitos Humanos. Dessa forma, os parâmetros de controle concentrado (de constitucionalidade/convencionalidade) no Brasil são a Constituição e os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo governo e em vigor no país. 

Indubitavelmente incluir os Tratados Internacionais de Direitos Humanos como constitucionais e firmar o Controle de Convencionalidade, traz e trará mudanças significativas no sistema interno do Estado. É chegado o momento que os Estados assumam posição de destaque e desenvolvam ações, no plano interno e externo, para a proteção dos direitos humanos na medida em que a observância dos direitos humanos e a prevalência da dignidade da pessoa humana.

3. Conclusão: 

Portanto, conclui-se que os tratados internacionais de direitos humanos têm caráter constitucional, embora a Emenda Constitucional 45/ 2004 e o STF, entenda que só será considerada assim, se aprovada com o rito definido no art. 5º, §3. Além disso, o vínculo como norma de nível constitucional, possibilita que o ordenamento jurídico brasileiro esteja integrado a um novo tipo de controle normativo, o controle de convencionalidade. Este que por sua vez, verifica as normas infraconstitucionais sob a ótica não somente da Constituição, mas também dos tratados internacionais de proteção da pessoa humana os quais o Estado é signatário.

Por fim, assim como a doutrina entende, os tratados internacionais de direitos humanos, bem como o controle de convencionalidade, são mecanismos necessários para a manutenção da dignidade da pessoa humana no sistema jurídico e no Estado, buscando dirimir as arbitrariedades que dele fazem parte, como também, as injustiças que diariamente são atreladas ao funcionamento do nosso ordenamento jurídico.

Palavras-chaves: Controle de convencionalidade. Direitos Humanos. Tratados Internacionais. Estado. Jurídico.

5. Referências Bibliográficas:

MAZZUOLI, Valério. O Controle Jurisdicional da Convencionalidade das Leis. 2. ed.  São Paulo: Revista dos Tribunais, v.4, 2011.

MAZZUOLI, Valério. Teoria geral do Controle de Convencionalidade no direito brasileiro. Senado, Brasília, 2009. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/46/181/ril_v46_n181_p113.pdf. Acesso em: 28 de jul. 2020.

GUERRA, Sidney. A Proteção Internacional dos Direitos Humanos no âmbito da Corte Interamericana e o Controle de Convencionalidade. Repositório UFC, Ceará, 2012. Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/11994/1/2012_art_sguerra.pdf. Acesso em: 29 de jul. 2020.

PIOVERSAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucionais. 14. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2013.

Como são internalizados os tratados internacionais de direitos humanos e o status normativo hierárquico constitucional que recebem?

Conforme a maneira como são internalizados, os tratados internacionais de direitos humanos podem receber status normativo-hierárquico constitucional ou legal. Comentário: A assertiva está incorreta, eis que após a Emenda Constitucional nº 45/2004, que incluiu o § 3º na redação do art.

Como se dá a recepção dos tratados internacionais sobre direitos humanos na ordem jurídica interna?

Portanto, os tratados internacionais ingressam na ordem jurídica interna brasileira mediante o preenchimento dos seguintes requisitos: (a) negociação pelo Estado brasileiro no plano internacional; (b) assinatura do instrumento pelo Estado brasileiro; (c) mensagem do Poder Executivo ao Congresso Nacional para discussão ...

É possível a incorporação de um tratado internacional de direitos humanos com status normativo hierárquico infraconstitucional?

Para a tese constitucional, os tratados de direitos humanos ratificados após a Constituição de 1988 e antes da Emenda Constitucional n° 45, de 2004, integram o direito interno brasileiro com valor hierárquico de norma constitucional, seguindo as determinações constantes no artigo 5°, parágrafos 1° e 2°, que conferem a ...

Qual o status normativo dos tratados internacionais de direitos humanos?

Portanto, conclui-se que os tratados internacionais de direitos humanos têm caráter constitucional, embora a Emenda Constitucional 45/ 2004 e o STF, entenda que só será considerada assim, se aprovada com o rito definido no art. 5º, §3.