A mar� montante do capital estrangeiro que nos anos noventa, principalmente depois do Real, avan�ou sobre a economia brasileira colocou novamente na ordem do dia um antigo debate. At� que ponto a presen�a das multinacionais � �til para o pa�s? Como uma droga, o limite entre funcionar como rem�dio ou veneno pode ser apenas uma quest�o de dosagem. Em 1990, o estoque de capital estrangeiro investido no Brasil correspondia a 8% do Produto Interno Bruto. Com a
enxurrada dos �ltimos quatro anos, as empresas sob controle estrangeiro t�m o equivalente 20% do PIB nacional. Pesquisa da consultoria Price Waterhouse Coopers, de novembro passado, mostra que, depois do Real, o n�mero de empresas brasileiras cujo controle passou para as m�os do capital estrangeiro aumentou 498% em rela��o � primeira metade da d�cada. De 1995 para c�, ocorreram 1233 opera��es de fus�es e aquisi��es no pa�s em que o capital estrangeiro adquiriu o controle ou participa��o em
empresas de capital nacional. S� em 1999, empresas estrangeiras investiram no pa�s mais de US$ 30 bilh�es, principalmente para adquirir o controle de empresas nacionais. Os setores mais visados na �ltima d�cada foram o de qu�mica e petroqu�mica, alimentos, material de transporte, inform�tica, metalurgia, com�rcio varejista, servi�os p�blicos e telecomunica��es.
Dos setores de tecnologia de ponta, o �nico que permanece sob o controle nacional � o aeron�utico, j� em vias de passar para o dom�nio franc�s. A participa��o do capital estrangeiro no setor financeiro j� chegou a 42%. A poss�vel compra do Banespa por uma institui��o estrangeira pode inverter os pratos da balan�a.
Os que enxergam nesse tipo de preocupa��o apenas sentimentos ultrapassados de nacionalismo e at� mesmo xenofobia deveriam levar em conta que, se a presen�a de empresas multinacionais no pa�s pode trazer vantagens, h� tamb�m riscos. E qualquer pol�tica sensata deveria considerar os dois lados da quest�o.
O professor Martin Carnoy, da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, um dos que n�o rezam pela cartilha de Wall Street, montou um esquema para apontar as benef�cios e malef�cios das multinacionais. A partir desse esquema, podemos fazer as seguintes considera��es:
Vantagens para o pa�s hospedeiro
A maior vantagem para a economia local � ter acesso a tecnologias e t�cnicas de gerenciamento superiores, na medida em que essas firmas empregam trabalhadores, aumentam a produ��o e criam demanda por mat�rias-primas locais. Tendem, tamb�m, a baixar os pre�os dos produtos locais pela intensifica��o da concorr�ncia.
Evidentemente, esse �ltimo aspecto � relativo. Quando a ind�stria em quest�o � um oligop�lio nacional, a entrada de novos concorrentes globais tende, normalmente, a derrubar os pre�os no mercado local. Contudo, � medida que esses oligop�lios nacionais transformam-se em oligop�lios mundiais (caso da ind�stria automobil�stica, inform�tica, telecomunica��es), a concorr�ncia em pre�os deixa de existir.
Quanto mais uma empresa multinacional est� disposta a contratar gerentes e t�cnicos e adquirir suas principais mat�rias-primas nos mercados locais, maior a vantagem para a economia local do investimento direto estrangeiro. Aquelas economias que t�m grandes mercados locais, uma oferta abundante de m�o-de-obra qualificada, uma boa infra-estrutura de comunica��o e recursos naturais valiosos e abundantes est�o em melhor condi��o de barganhar e ampliar as concess�es dos investidores estrangeiros do que aquelas cuja �nica vantagem comparativa � a m�o-de-obra barata. Quanto mais pobre uma economia, quanto menor o seu mercado e mais reduzida a oferta daqueles ativos em troca dos quais as multinacionais est�o dispostas a fazer concess�es, maiores dever�o ser as concess�es feitas pelo pa�s para atrair investimentos estrangeiros.
Desvantagens para o pa�s hospedeiro
As multinacionais operam no exterior para tirar vantagens da sua superioridade tecnol�gica, gerencial e de marketing, de seu acesso privilegiado a informa��es, que lhes permitem avaliar os riscos e tomar decis�es, al�m, evidentemente, de acesso a volumes de capital que, normalmente, n�o s�o acess�veis aos competidores locais. Tomadas em conjunto essas vantagens, a competi��o das empresas locais, principalmente em ind�strias oligopolizadas, intensivas em capital e tecnologia, torna-se virtualmente imposs�vel. Por outro lado, a n�o ser que os pa�ses hospedeiros tenham poder de barganha suficiente para for��-las a isso, essas empresas externas est�o muito pouco interessadas em transferir conhecimento e capacita��o tecnol�gica para a economia local. Al�m disso, essas grandes empresas podem impedir a concorr�ncia local, a partir de uma pol�tica predat�ria de pre�os ou simplesmente negando o acesso dos concorrentes locais a determinadas mat�rias-primas sobre os quais elas t�m dom�nio na cadeia produtiva mundial.
Outro aspecto a destacar � que raramente essas empresas est�o dispostas a localizar fora de seus pa�ses de origem as atividades de alto n�vel, que exijam tecnologia e capacidade gerencial mais avan�adas. Muitas das desvantagens para o pa�s hospedeiro s�o vantagens para o pa�s de origem das empresas multinacionais. As opera��es no exterior das subsidi�rias de empresas multinacionais podem aumentar o lucro de suas matrizes, lucros esses que podem ser utilizados para expandir o investimento dom�stico em atividades que gerem alto valor agregado e sejam intensivas em tecnologia e capacidade gerencial. Al�m disso, essas opera��es externas podem ser utilizadas para obter o acesso a novas tecnologias.
Outro aspecto importante a destacar � que, numa economia crescentemente globalizada, empresas multinacionais dom�sticas podem ser os �nicos agentes com capacidade de sustentar a competi��o local e internacional na produ��o de bens de alto valor agregado e conte�do tecnol�gico. O problema n�o se resume, portanto, ao mercado externo, mas tamb�m diz respeito � capacidade de sustentar internamente a competi��o com multinacionais de outros pa�ses, dado o crescente grau de abertura da economia mundial.
O desenho de um pol�tica sensata de relacionamento com o capital estrangeiro deve, necessariamente, levar em conta esses dois lados da quest�o. Os que acham que isso � xenofobia fariam melhor em mudar-se para Miami e, com apoio dos exilados cubanos, fazer uma campanha para transformar o Brasil no mais novo estado americano.
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