Qual o recurso cabível da decisão que indefere o pedido de recuperação judicial?

Ementa Oficial

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SISTEMA RECURSAL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. HONORÁRIOS DO ADMINISTRADOR JUDICIAL E RENOVAÇÃO BENEFÍCIO PRODEIC. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO. ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. POSSIBILIDADE.
1. O Código de Processo Civil, na qualidade de lei geral, é, ainda que de forma subsidiária, a norma a espelhar o processo e o procedimento no direito pátrio, sendo normativo suplementar aos demais institutos do ordenamento. O novel diploma, aliás, é categórico em afirmar que "permanecem em vigor as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, às quais se aplicará supletivamente este Código" (art. 1.046, § 2°). 2. A Lei de Recuperação e Falência previu sistema recursal próprio, prevendo, para diversas situações específicas, o recurso adequado a desafiar o correspondente ato judicial. Estabeleceu, ainda, em seu art. 189, que, "no que couber", haverá aplicação supletiva da lei adjetiva geral.
3. Com relação aos recursos, por sua característica estritamente processual, assim como pela ausência de vedação específica na Lei n° 11.101/2005, deve incidir o novo diploma processual, seja para suprimento, seja para complementação e disciplinamento de lacunas e omissões, desde que, por óbvio, não conflite com a lei especial.
Deveras, verifica-se que a lei especial não se ocupou de situações que, por sua natureza e relevância, devam ser passíveis de contradita por meio de recurso.
4. O rol taxativo do art. 1.015 do CPC/2015 não afasta a incidência das hipóteses previstas na LREF, pois o próprio inciso XIII estabelece o cabimento do agravo de instrumento nos "outros casos expressamente referidos em lei". Havendo disposição expressa da Lei de Recuperação de Empresas e Falência, essa prevalecerá sobre o numerus clausus do dispositivo do CPC, de modo que a aplicação desse Código será apenas para suprimento de lacunas e omissões. Por outro lado, se o provimento judicial, no âmbito falimentar/recuperacional, enquadrar-se em uma das hipóteses do rol do diploma processual, será também possível o manejo do agravo de instrumento.
5. Nas decisões interlocutórias sem previsão específica de recurso, incidirá o parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015, justamente porque, em razão das características próprias do processo falimentar e recuperacional, haverá tipificação com a ratio do dispositivo - falta de interesse/utilidade de revisão da decisão apenas no momento do julgamento da apelação -, permitindo a impugnação imediata dos provimentos judiciais.
6. Assim como se dá nos procedimentos previstos no parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015, as decisões de maior relevância na recuperação judicial e na falência são tomadas antes da sentença propriamente dita, que, via de regra, se limita a reconhecer fatos e atos processuais firmados anteriormente. Consequentemente, aguardar a análise pelo Tribunal, apenas em sede de apelação, equivaleria à irrecorribilidade prática da interlocutória, devendo incidir a interpretação extensiva do dispositivo em comento.
7. Além disso, a natureza também processual (de execução coletiva e negocial) da LREF justifica a interpretação do parágrafo único do art. 1.015 no CPC (ou dos incisos do caput do art. 1.015) no sentido de estender a interposição do recurso de agravo de instrumento às decisões que envolvam matérias dos regimes falimentar e recuperatório. 8. Na hipótese, o magistrado de piso indeferiu os pleitos das recuperandas quanto à renovação do benefício fiscal (PRODEIC) e determinou que elas efetuassem o imediato depósito de 40% dos honorários do administrador judicial, sob pena de convolação da recuperação em falência. Portanto, tal decisão desafia o recurso de agravo de instrumento, na forma do artigo 203, §2°, do CPC.
9. Recurso especial provido.
(REsp 1722866/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/09/2018, DJe 19/10/2018)

Em um caso raro, o Juízo da 7ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), após determinar que fossem prestadas informações sobre "o atual faturamento da sociedade, seus ativos e expectativas de receitas futuras", indeferiu o processamento da recuperação judicial de uma mantenedora de instituição de ensino superior, por entender que não foram "atendidos os requisitos formais exigidos no art. 51, I, da Lei nº 11.101, de 2005", porquanto a (a) universidade não está "funcionando, não foram mantidos os empregos e muito menos os alunos, os geradores de recebíveis, (b) "sem exercício de atividade econômica, não há empresa" e (c) "alienação do ativo das sociedades geridas para pagamento das dívidas se mostra dificultoso e duvidoso". (Processo nº º 0105323-98.2014.8.19.0001).

Interposto recurso, a 3ª Câmara Cível do TJ-RJ deu-lhe provimento, declarando o v. acórdão que "o juiz não pode analisar a viabilidade econômica da empresa para deferir ou não o processamento da recuperação, na oportunidade mencionada no art. 52 da Lei nº 11.101, de 2005", pois "a sua atuação se resume à verificação dos requisitos formais" (Apelação Cível nº 0105323-98.2014.8.19.0001).

A sentença do juízo a quo tem respaldo (a) nas chamadas "máximas de experiência"; (b) nos princípios que norteiam a atuação do juiz no processo civil moderno; (c) na "ratio" dos arts. 51 e 52 da Lei nº 11.101, de 2005 (LRFE) e (d) no direito comparado.

As ‘máximas de experiência’ habilitam o juiz a indeferir a recuperação, após dar oportunidade à parte para emendar a petição

No exercício diuturno do seu mister, sobretudo quando preside centenas de demandas de igual jaez em um "juízo especializado", o magistrado reúne uma gama de conhecimentos empíricos, denominados, por Friedrich Stein, "máximas de experiência" e, pelo art. 335 do CPC, "regras de experiência comum", que são, na concepção de Couture, "o conjunto de conclusões empíricas fundadas sobre a observação do que ocorre comumente".

As "máximas de experiência" habilitam o juiz a indeferir a recuperação judicial, após dar oportunidade à parte para que emende ou complete a petição inicial (art. 285 do CPC), em respeito ao princípio da ampla defesa, e após criteriosa leitura das peças dos autos, que o leve a formar íntima convicção sobre os fatos expostos pela autora e o direito aplicável ao caso, consoante o brocardo "da mihi factum, dabo tibi jus" ("dá-me o fato, dar-te-ei o direito").

O "princípio do livre convencimento motivado e da persuasão racional" e o "princípio constitucional à celeridade processual" (EC nº 45, de 2004), que comandam o ato decisório e maximizam o valor que modernamente se atribui ao juiz na condução do processo judicial, impõem ao julgador o dever de buscar uma solução justa, tempestiva e eficaz para solução da lide.

A propósito, relembre-se, que não há, hoje, quem defenda a ideia de que o juiz é apenas "a boca da lei", mero assistente privilegiado dos dramas forenses, mas o criador do "direito concreto", do "direito vivo", do "direito real", sobretudo quando o dispositivo de lei é defeituoso, como sói acontecer com o art. 52 da LRFE, que diz: "Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial…".

É curial que o uso puro e simples do elemento literal ou linguístico na exegese dos arts. 51 e 52 da LRFE não desvela a sua "ratio", pois a atuação do juiz não se circunscreve a rápida e mecânica verificação da "documentação exigida no art. 51", mas a um criterioso e ponderado exame da situação jurídica da empresa (art. 51, I), da sua situação econômico-financeira (art. 51, I a III, V e VII a IX), da situação social (art. 51, IV) e da situação dos bens de controladores e administradores (art. 51, VI), devido às graves restrições aos direitos e interesses dos credores impostas pelo art. 52, III, da LRFE – aliás, não fosse assim, essa atribuição teria sido delegada a serventuários da confiança do juízo, que se incumbiriam de "certificar" a existência "da documentação exigida no art. 51".

A descoberta da "ratio" dos arts. 51 e 52 e sua escorreita aplicação ao caso sub judice exigem que o juiz recorra ao "elemento sistemático da interpretação lógica" (Vicente Ráo) e verifique, com prudente arbítrio, a existência (a) dos pressupostos subjetivo e objetivo da ação de recuperação judicial, (b) da causa de pedir, (c) do objeto da ação e (d) dos documentos essenciais elencados no art. 51, e, se concluir pela insuficiência ou inexistência de qualquer deles, deve, primeiro, facultar à parte que junte os documentos faltantes, e, segundo, não atendido, deve interromper o procedimento e extinguir o processo sem julgamento do mérito.

Essa á a orientação que vige na França, na Espanha e na Alemanha, que autorizam o magistrado a pôr fim a "aventuras judiciais" já no limiar do processo: (a) no direito francês, se a "situação do devedor é manifestamente insuscetível de recuperação", "o tribunal" pode "decidir a abertura do procedimento de liquidação judiciária" (Código de Comércio francês, art. L631-7); (b) no direito espanhol, se "o juiz entender que o pedido ou a documentação que o acompanha padecem de algum defeito", fixará "um prazo de justificação ou correção que não poderá exceder de cinco dias" e, se não atendido, indeferirá o concurso (Lei de Concursos da Espanha nº 22/2003, art. 13, 2, primeiro e segundo parágrafos); no direito alemão, na falta de requisitos ou pressupostos processuais ou insuficiência ou inexistência de massa, o juiz pode indeferir a "ab initiio" a petição inicial (Lei de Insolvência alemã (InsO), art. 34, §1º), de acordo com o magistério do eminente Des. Carlos Henrique Abrão.

Jorge Lobo é advogado

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Fonte: Valor | Por Jorge Lobo

Qual o recurso cabível da decisão do indeferimento pelo juiz do pedido de recuperação judicial?

RECURSO CABÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. 1. A decisão que indefere a recuperação judicial quanto a uma das postulantes, determinando esclarecimento/correções por parte da outra empresa, sem por fim ao processo, tem natureza de decisão interlocutória e, portanto, desafia recurso de agravo de instrumento, conforme arts.

Qual recurso é cabível da decisão que concede a recuperação?

É cabível agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas nos processos de recuperação judicial e de falência, por força do disposto no parágrafo único do artigo 1015 do Código de Processo Civil.

Qual o recurso cabível caso caso seja negado pelo juiz o pedido de recuperação judicial?

O agravo de instrumento é o recurso cabível contra as decisões tomadas pelo juiz no curso do processo – as chamadas decisões interlocutórias –, antes da sentença.

O que ocorre se o requerimento de recuperação judicial não for deferido?

55 desta Lei. A decisão que defere o processamento da recuperação judicial traz como consequência a suspensão de todas as ações e execuções movidas contra a recuperanda pelos credores sujeitos ao plano, nos termos do art. 6º, da Lei 11.101/2005. Esse é o chamado stay period, que não deve durar mais de 180 dias.

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