Por José Manuel
Nieves
Publicado na ABC Ciencia
Não foram os extraterrestres, nem uma civilização antiga perdida nas névoas do tempo. As pirâmides foram construídas pelos egípcios. Isso é demonstrado pelo diário de trabalho de um ex-capataz que participou das obras faraônicas e que acabou com o ‘mistério’ da construção da Grande Pirâmide de Gizé. O documento, encontrado em 2013 no Mar Vermelho, acaba de ser exposto ao público no museu de Cairo.
A Grande Pirâmide de Gizé foi construída em homenagem ao faraó Quéops, que reinou entre 2551 e 2528 AEC), e é a maior das três pirâmides construídas no planalto de Gizé. Considerada como uma maravilha do mundo desde a antiguidade, a Grande Pirâmide media, quando foi construída, 146 metros, embora hoje sua altura tenha sido reduzida para 138 metros.
O diário de notas foi escrito em caracteres hieróglifos em pedaços de papiro. Seu autor era um inspetor de obras chamado Mener, que segundo os arqueólogos Pierra Tallet e Gregory Marouard em um artigo publicado na Near Estern Archaeology, “era responsável por uma equipe de cerca de 200 homens”.
Tallet e Marouard são os diretores da equipe arqueológica da França no Egito, e encontraram o diário do capataz no porto de Wadi al Jarfin, no Mar Vermelho, no ano de 2013. A antiguidade atribuída ao documento é de cerca de 4500 anos, o que o torna o mais antigo papiro já descoberto no Egito.
De acordo com os pesquisadores, “O diário de trabalho abrange um período de vários meses, sob a forma de um calendário com duas colunas para cada dia, e detalha muitas das operações relacionadas à construção da Grande Pirâmide de Quéops em Gizé e o trabalho nas pedreiras de calcário na margem oposta do Nilo”.
Merer escreve essas notas durante o 27º ano do reinado de Quéops. Seus registros indicam que naquela época a Grande Pirâmide estava quase terminada, e que grande parte do trabalho restante se concentrava na construção da casca de calcário que cobria a parte exterior da pirâmide.
Pedras levadas ao barco
O diário de trabalho também afirma que no 27º ano do reinado de Quéops, a construção da Grande Pirâmide estava sendo supervisionada pelo vizir Ankhaf (também escrito Anjaf), o meio irmão de Quéops (Um vizir era um funcionário sênior no antigo Egito que servia o rei.)
O papiro, de acordo com Tallet e Marouard, também revela que um dos títulos de Ankhaf era o de “chefe de todas as obras do rei”. Embora o registro de trabalho assegure que Ankhaf foi responsável pelas obras no 27º ano do faraó, muitos estudiosos acreditam que é possível que outra pessoa, possivelmente o vizir Hemiunu, tenha se encarregado da construção das pirâmides durante a primeira parte do reinado de Quéops.
Os responsáveis pelo Museu de Cairo não especificaram por quanto tempo o valioso documento estará disponível para o público.
Referência
- Tallet, P., & Marouard, G. (2014). The Harbor of Khufu on the Red Sea Coast at Wadi al-Jarf, Egypt. Near Eastern Archaeology (NEA), 77(1), 4-14.
Os inúmeros fatos sem explicação que envolvem a construção das pirâmides levaram muitos estudiosos a buscarem respostas totalmente diferenciadas para a maneira pela qual elas foram erguidas. Um de tais pesquisadores é o químico Joseph Davidovits, professor da Universidade de Toronto, no Canadá, diretor do Instituto de Ciências Arqueológicas Aplicadas (IAPAS), da Barry University, na Flórida, e que ficou famoso por ter sido o criador da química dos geopolímeros, a qual revolucionou a construção civil e a ciência dos materiais. Na obra que escreveu defendendo sua tese � que veremos mais adiante � ele resume as objeções aos conceitos da arqueologia clássica ao dizer que com serras de cobre, é possível cortar madeira, mas não o tipo de granito duro encontrado na Grande Pirâmide. Implementos de cobre, além disso, não poderiam cortar 2,5 milhões de blocos de calcário em 20 anos. Ele informa, também, que a arte de trabalhar o bronze surgiu no Egito cerca de 800 anos depois da construção das pirâmides de Gizé e que o ferro só chegou mais tarde àquele país e continuou raro, mesmo durante o Império Novo.
Para começar sua discussão esse autor pondera que a própria existência das
O autor observa que, ao contrário do que geralmente se afirma, o tamanho dos blocos não diminui invariavelmente à medida em que a pirâmide sobe. Existem centenas de blocos enormes, só superados em tamanho pelas pedras da base, pesando de 15 a 30 toneladas, mais ou menos no nível da câmara do rei. Eles são tão grandes que ocupam o espaço de dois degraus do monumento. De modo geral, as alturas dos degraus aumentam e diminuem subitamente em 19 nítidas flutuações ao passo que os comprimentos � que o autor mediu em cerca de 10% da área da pirâmide � enquadram-se dentro de 10 medidas perfeitamente uniformes. Elimina-se, assim, � afirma Davidovits � qualquer possibilidade de que os blocos houvessem sido cortados em tamanhos aleatórios, determinados por rachadura e outras características do leito rochoso. Tentativas de explicar a preparação e uso de blocos de dimensões tão uniformes, baseadas na hipótese de corte, deparariam com grandes dificuldades. Este grau de uniformidade exclui inteiramente a possibilidade de corte com instrumentos primitivos.
Dois arqueólogos e arquitetos, George Perrot e Charles Chipiez, referindo-se às esculturas do Império Antigo perguntaram: De que maneira conseguiram os escultores cinzelar essas rochas tão duras? Ainda hoje isto é muito difícil, mesmo usando os melhores cinzéis de aço temperado. O trabalho é muito lento e difícil, e o artista se vê obrigado a parar com frequência para afiar o gume do cinzel, que se torna rombudo em contato com a pedra, e, em seguida, retemperá-lo. Mas os contemporâneos de Kéfren, e todos concordam com isto, não possuíam cinzéis de aço. Acontece, entretanto, que no decorrer do Império Novo e nas épocas posteriores, os egípcios não conseguiram realizar trabalhos semelhantes, mesmo dispondo, então, de ferramentas de bronze. Isso estarrece os estudiosos e o próprio Champollion se mostrou surpreso com a qualidade medíocre das estruturas erquidas no Império Novo. E diga-se ainda que, segundo estimativas do geólogo de Roziere, um dos 150 cientistas que acompanharam Napoleão ao Egito, há mais pedras nas pirâmides de Gizé do que em todas as obras erguidas durante o Império Novo, o Período Tardio e o Período Ptolomaico juntos, uma época que totaliza cerca de 1500 anos.
Além disso, os monumentos erguidos a partir do Império Novo, em sua
As pirâmides do Império Antigo � resume Davidovits � consistem fundamentalmente em calcário abundante e carcaças fósseis, um material heterogêneo, de corte extremamente difícil. Templos de fins da XVIII dinastia (1400 anos a.C.) são encontrados por todo o Egito. Foram construídos com calcário branco muito macio, mesmo quando erigidos em regiões inteiramente graníticas, como no sul. Após a XVIII dinastia, o emprego de calcário macio cedeu finalmente lugar ao arenito mole. Arenito de Silsilis, no sul do Egito, foi usado para construir os templos de Karnak, Luxor e Edfu, no tempo do Império Novo. O material é homogêneo, mole e fácil de esculpir. E a seguir o autor enfatiza: Aí reside o grande paradoxo tecnológico do Egito: numa ocasião em que as ferramentas eram de pedra e cobre, utilizou-se um volume imenso de variedades duras de pedra, mas logo que foram adotados o bronze e o ferro, os egípcios usaram apenas os materiais mais frágeis. E conclui: Há mais do que prova abundante para confirmar a existência de dois diferentes métodos de construção em alvenaria, usados em épocas diferentes e com resultados muito diversos.
Ao analisar a hipótese clássica da egiptologia que explica a construção das pirâmides, esse autor considera que problemas permanecem sem solução a despeito de numerosos estudos, e fatos importantes foram ignorados. No que se refere ao conceito de que os blocos foram extraídos das pedreiras, ele cita o estudo de uma equipe de geoquímicos da Universidade de Munique, Alemanha, que tinha por objetivo datar os vários métodos de exploração das pedreiras usados no Egito ao longo da história. A conclusão a que chegaram foi a de que não há absolutamente vestígios de extração de blocos das pedreiras em época anterior a 1600 a.C. De que modo teriam então os egípcios retirado pedra em tempos mais antigos para erguer as pirâmides? O estudo concluiu também que o método de extrair pedras com o uso de cunhas de madeira jamais foi empregado pelos egípcios, mas sim exclusivamente pelos romanos quando ocuparam o Egito. Se esse tosco método houvesse sido empregado na construção das pirâmides, como se alega, � comenta o autor � o volume de detritos em Gizé seria espantoso, incluindo incontáveis milhões de blocos rachados e inaproveitáveis.
Outro item que Davidovits analisa refere-se ao uso de rampas. Ele pondera que uma vez que as polias só foram conhecidas no Egito durante a ocupação romana e que a roda foi introduzida pelos hicsos somente no final do Império Médio, a única opção que a evidência arqueológica oferece para erguer blocos é a rampa. No caso da Grande Pirâmide, calculou-se que qualquer rampa reta teria o comprimento de cerca de 1600 metros e que conteria uma quantidade imensa de material. Sua grande largura e comprimento teriam coberto a pedreira. Quanto a possíveis rampas helicoidais, lembra que nenhuma delas jamais foi encontrada. Cita também uma rampa de barro que foi achada em Saqqara no sítio da pirâmide de Sekhemkhet, da III dinastia, mas alerta que essa pequena pirâmide não contém grandes blocos e pondera que transportar blocos pequenos rampa acima era a maneira mais sensata e óbvia para construir esse tipo de pirâmide. Já com relação ao fato de existirem restos de rampas em Gizé, o autor considera que o volume tremendo de material exigido pela teoria padrão não foi encontrado, e embora se possa esperar que um material constituído na maior parte de terra se degrade com o tempo, um pequeno volume de restos sugere apenas o uso de pequenas rampas destinadas a escalar as pirâmides.
E qual seria essa grande tecnologia esquecida? Entendendo tecnologia como um conjunto de princípios científicos que se aplicam a um determinado ramo de atividade, Davidovitz afirma que a ciência que tornou possível as pirâmides foi a química, ou mais exatamente, sua precursora, a alquimia. Em épocas tão remotas quanto o ano pré-histórico de 3800 a.C. os alquimistas egípcios criaram um esmalte azul vibrante. Um experimentador qualquer misturou pó de crisocola com natrão e aplicou uma chama. Obteve um esmalte duro, lustroso, azul, que era em seguida derretido e aplicado em contas e pedras. Os antigos egípcios são bem conhecidos por usarem minerais como crisocola e lápis-lazúli a fim de produzir esmaltes, que para eles constituíam imitações desses minerais ou pedras. Possuíam, inclusive, uma palavra para esses produtos, ari-kat, significando feitos pelo homem ou sintéticos. (...) Esta velhíssima tradição revela o próprio núcleo de uma notável invenção alquímica relevante para a solução do enigma da construção das pirâmides: os sacerdotes de Khnum há muito eram peritos na arte de fabricação de cimentos extraordinários. Cimento encontrado em várias partes da Grande Pirâmide tem cerca de 4500 anos de idade, mas ainda está em boas condições. Essa argamassa antiga é muito superior aos cimentos hoje usados em construção civil. O moderno cimento Portland, usado para reparar antigos monumentos egípcios, rachou e degradou-se em apenas 50 anos.
Depois dessas considerações, o químico e � lembramos mais uma vez � criador de um novo ramo da química, a geopolimerização, Joseph Davidovits, finalmente apresenta a sua tese: Se os egípcios antigos possuíam capacidade de produzir cimento de qualidade excepcionalmente alta, o que os impediria de adicionar ao mesmo carcaças fósseis a fim de produzir concreto calcário de primeiríssima classe? A resposta é que nada os impediu. Demonstrarei adiante que os blocos da pirâmide não são pedra natural, mas, na verdade, concreto de calcário de qualidade excepcionalmente alta � pedras sintéticas � moldadas diretamente no local. Os blocos consistem de cerca de 95% de pedregulho de calcário e de 5 a 10% de cimento. Constituem imitações de calcário natural, fabricados segundo a antiquíssima tradição de produção alquímica de pedras. Nenhum corte de pedra ou exaustivas operações de arrastamento ou içamento foram jamais necessárias à construção das pirâmides.