O que significa desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa para o Direito?

E então, o que é personalidade jurídica?

 Antes de esclarecermos o que é a desconsideração da personalidade jurídica, se faz necessária a compreensão do que é de fato a personalidade jurídica e, para falarmos sobre isso, é importante esclarecermos o que é empresa, posto que esta será dotada de personalidade jurídica para que proceda a seus negócios.

A empresa, como vimos em artigos anteriores, é a atividade econômica organizada, o que significa que o empresário que a exercerá terá em mãos todos os insumos necessários para seu exercício. Essas estruturas organizadas voltadas para a produção de bens e serviços (empresas) são realizadas pelo empresário, aquele que detém conhecimento e insumos para tal exercício da atividade empresária.

A personalidade jurídica dessa organização chamada empresa começa com a personalização da sociedade empresária. Essa personalização se dá pelo registro da sociedade empresária (empresa) no órgão competente.

A pessoa jurídica de direito privado (empresa) pode ser sociedade simples ou empresária, de acordo com a forma de exploração da empresa.  Se os fatores de produção forem organizados, será sociedade simples. Se a exploração for social, será sociedade empresária.

A personalização da sociedade empresária é ato de caracterização dessa sociedade, dando-lhe patrimônio, responsabilidades, características e personalidade únicos, diferenciando-os daqueles que compõe a sociedade, ou seja, separando a sociedade do empresário ou administradores.

A aquisição, pela sociedade empresária, de personalidade jurídica, garante a ela, a aquisição de direitos e deveres tal qual a pessoa do empresário o tem. O início da personalidade jurídica se dá com o efetivo registro da empresa nos órgãos competentes, a princípio, a Junta Comercial.

Portanto, a personalização da sociedade empresária é o meio pelo qual se atribui à sociedade empresária, ou seja, à pessoa jurídica, reconhecimento de sua personalidade para que possa atuar no plano jurídico, obtendo também a proteção jurídica conferida aos seus direitos da personalidade. Isso permitirá que a empresa seja também um agente de direitos e obrigações, similar à uma pessoa física.

Tal personalidade jurídica serve, principalmente, para que os sócios empresários não respondam com seus patrimônios pessoais pelas responsabilidades e dívidas da empresa, ou seja, a regra é de que os bens particulares dos sócios não respondem pela empresa, somente os bens da própria empresa serão afetados por dívidas ou quaisquer problemas judiciais, a princípio.  ¹

            Isso se deve ao fato de que, com a aquisição de personalidade jurídica própria pela sociedade empresária, esta passa a se distinguir de seus sócios pessoas físicas, podendo desse modo adquirir obrigações diversas daquelas adquiridas pelos seus fundadores.

O que é a desconsideração da personalidade jurídica?

Apesar de, a princípio, a pessoa jurídica ter uma personalidade distinta daquela de seus sócios, e responder com seu próprio patrimônio pelas obrigações sociais, há exceções que geram a aplicabilidade da desconsideração da personalidade jurídica.

A desconsideração da personalidade jurídica é meio pelo qual se elimina a barreira existente entre o patrimônio empresarial do patrimônio pessoal dos sócios fundadores, podendo, portanto, este último ser atingido pelas responsabilidades da empresa, ou seja, a responsabilidade dos sócios será expandida e as obrigações da personalidade jurídica da empresa se estenderão até o patrimônio dos sócios através deste instituto do Direito Empresarial.

Fundamentos para a desconsideração da personalidade jurídica

Como vimos acima, a desconsideração da personalidade jurídica é um meio (geralmente judicial), pelo qual se eliminará a separação legal existente entre o patrimônio da empresa e o patrimônio de seus sócios, fazendo com que o patrimônio dos sócios seja atingido por problemas da empresa.

Para que haja essa imposição legal de atingimento patrimonial de ambos (a empresa e os sócios), é preciso haver uma decisão judicial de desconsideração da personalidade jurídica da empresa.

Tal desconsideração se dá por meio de uma decisão judicial, determinando que a personalidade jurídica da empresa seja desconsiderada, tornando seus sócios responsáveis com seus patrimônios pessoais pelas obrigações da empresa, no entanto, é preciso que a empresa ou seus sócios tenham feito atos que ensejem a possibilidade de tal desconsideração, ou seja, existem requisitos específicos para tal.          

 Vejamos o que diz o Código Civil sobre o assunto:

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. ”

E, complementando, vemos o artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor:

“Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. ”

Pela leitura de ambos os artigos, podemos entender que a desconsideração da personalidade jurídica ocorrerá se houver abuso da personalidade. E o que seria isso?

O abuso de personalidade jurídica é determinado pelo mesmo art. 50 do Código Civil como desvio de finalidade.

O desvio de finalidade constitui abuso, no qual o sócio utiliza-se da empresa para se imiscuir de suas obrigações, ou seja, a empresa passa a ser uma fachada para seus negócios escusos, dessa forma, obtendo proteção indevida de seu patrimônio, enquanto a sociedade empresária responde com o patrimônio da pessoa jurídica por quaisquer obrigações adquiridas pelo sócio enquanto pessoa física.

A desconsideração da personalidade jurídica também será possível quando houver confusão patrimonial, o que significa que patrimônio da sociedade e o patrimônio pessoal do sócio se confundem, de forma a deixar pouco claro qual é o patrimônio de cada um (sócio ou empresa), um exemplo clássico é a utilização da mesma conta bancária tanto para sócio quando para a pessoa jurídica, ou ainda, o sócio utilizar a conta da empresa para pagar contas dele enquanto pessoa física.

Em ambos os casos, tanto os credores que porventura estejam processando (executando) a empresa judicialmente, quanto o Ministério Público podem pedir a desconsideração da personalidade jurídica ao juiz, deixando ainda, o art. 50 do CC civil bem claro qual o significado legal de tal pedido, o qual acarretará que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações serão estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Para haver a aplicabilidade da desconsideração da personalidade jurídica pelo Código de Defesa do Consumidor, segundo o artigo 28 do CDC, será possível quando houver abuso em detrimento do consumidor, tais abusos podem ser: abuso de direito (exceder os limites legais do exercício de um direito), excesso de poder (abuso de poder econômico e intelectual), infringir a lei, praticar atos ou fatos ilícitos ou violar estatutos sociais da empresa (conjunto de regras que constituem a sociedade) e má administração (ou seja, a incapacidade de administrar corretamente um empreendimento).

À luz do Novo Código de Processo Civil, tal medida se faz regulamentada pelo incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto no art. 133 do NCPC, além da chamada desconsideração inversa da personalidade jurídica, instituto por meio do qual a pessoa jurídica poderá também ser responsabilizada por atos que não sejam seus e sim dos sócios, ou seja, revertendo a ordem na qual os sócios se tornam responsáveis por atos da empresa, passando esta a ser responsável com seu patrimônio pelos atos daqueles – hipótese que já era utilizada pela jurisprudência nos casos em que o sócio, fugindo de negócios ilegais, integralizava patrimônio pessoal no patrimônio da empresa.

Além disso, a desconsideração da personalidade jurídica poderá, também, ser aplicada em sede de Direito Trabalhista.

Neste breve artigo o leitor pode obter uma ideia sobre como, muitas vezes, a desconsideração da personalidade jurídica poderá ser admitida, encerrando, portanto, as atividades da empresa, e prejudicando os sócios – isso como medida repressiva para os casos de fraudes já vistos acima.

Dessa forma, é muito importante que, no decurso de uma sociedade, sejam utilizadas assessorias jurídicas capazes de evitar problemas muitas vezes gerados pela desatenção às regras do estatuto social da empresa ou confusão patrimonial, visando evitar o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

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Referências

¹ GUILHERME. Luiz Fernando do Vale de Almeida. BRESSAN. Gabriel Barreira. “Do incidente de desconsideração da personalidade jurídica no NCPC”. Migalhas. Disponível: . Acesso em: 25/10/17.

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O que acontece quando há a desconsideração da personalidade jurídica?

Quais as consequências da desconsideração da personalidade jurídica? A consequência principal da despersonalização de pessoa jurídica é atingir o patrimônio dos sócios. Ainda que a dívida seja da empresa, eles serão responsáveis por satisfazê-la com seus recursos particulares.

O que significa desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa?

“Como se sabe, a desconsideração da personalidade jurídica, derivada da disregard doctrine, consiste no afastamento temporário, ocasional e excepcional da personalidade jurídica da sociedade empresarial, a fim de permitir, em caso de abuso ou de manipulação fraudulenta, que o credor lesado satisfaça, com o patrimônio ...

Qual a consequência para os sócios quando o juiz determina a desconsideração da personalidade jurídica de uma determinada pessoa jurídica?

Portanto, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica objetiva alcançar o patrimônio pessoal dos sócios ou administradores que se valeram do princípio da autonomia da pessoa jurídica para finalidades escusas em prejuízo de terceiros ou dos credores da empresa constituída.

Quais são os tipos de desconsideração da personalidade jurídica?

Desconsideração da Personalidade Jurídica: Direta, inversa, indireta e expansiva.

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