O espelho Machado de Assis resumo

Resumo O Espelho de Machado de Assis – parte I

Esse é o melhor conto para que se possa entender de maneira mais direta a “filosofia” machadiana que sustentaria a tese de que sua análise do comportamento humano destaca uma abordagem psicossocial: nossa personalidade é fruto de forças sociais, que por sua vez existem graças à nossa personalidade.

O Espelho de Machado de Assis trata-se da história de Jacobina, um homem que nunca expunha suas opiniões para seus amigos porque não queria discutir, um ato que entendia como uma herança no homem de um caráter bestial.

Mas a narrativa se inicia porque o protagonista havia sido obrigado a expressar sua opinião sobre a existência da alma. Emite, então, uma curiosa teoria sobre a existência não de uma, mas de duas almas, interligadas, a alma interna, que pode ser entendida como a verdadeira maneira como nos enxergamos, e a alma externa, que é como os outros nos enxergam.

Sem uma, a outra não existe. E para provar sua teoria, conta uma história passada em sua juventude, quando havia recebido o título de alferes. Era apenas um título e uma farda, mas isso trouxe à personagem uma notoriedade tamanha. Tanto que sua tia Marcolina pede para que ele passe uns dias em seu sítio, só para ter a honra de receber em suas terras um alferes.

E em sua homenagem deixa no quarto dele um móvel cuja parte mais chamativa era um espelho. Pouco depois da chegada de Jacobina, sua parenta recebe a notícia da morte eminente da filha dela, o que a faz partir com demais familiares, deixando o protagonista só com os escravos, mas estes fogem no dia seguinte.

Jacobina fica quase uma semana na completa solidão, sem ninguém para elogiar seu cargo e principalmente sua farda. Chega a uma crise tal que pensa em praticar suicídio. Seu único momento de alívio era quando dormia e em seus sonhos via as pessoas elogiarem sua farda.

Em O Espelho de Machado de Assis, o clímax da negatividade ocorre quando acidentalmente se olha no espelho e percebe a sua imagem muito difusa, pouco nítida. Supera, no entanto, o desespero e tem uma ideia salvadora: veste a farda e se coloca diante do espelho. Espantosamente, sua imagem está nítida.

Passa, então, a dedicar uma determinada hora do dia para olhar-se no espelho e admirar a sua vestimenta, o que lhe garante a sobrevivência no final do período de 14 dias em que ficou sozinho.

Deve-se notar neste conto, O Espelho de Machado de Assis, a análise aguda que Machado de Assis fez da sociedade, a ponto de seu alcance tornar-se ainda atual. A simbologia de “O Espelho” nos indica que, em nosso meio, a alma externa, ligada ao status, ao prestígio social, é muito mais importante do que a alma interna, a nossa real personalidade. Sem essa máscara, praticamente não sobrevivemos. Vamos a ele:

Quatro ou cinco cavalheiros debatiam, uma noite, várias questões de alta transcendência, sem que a disparidade dos votos trouxesse a menor alteração aos espíritos. A casa ficava no morro de Santa Teresa, a sala era pequena, alumiada a velas, cuja luz fundia-se misteriosamente com o luar que vinha de fora.

Entre a cidade, com as suas agitações e aventuras, e o céu, em que as estrelas pestanejavam, através de uma atmosfera límpida e sossegada, estavam os nossos quatro ou cinco investigadores de coisas metafísicas, resolvendo amigavelmente os mais árduos problemas do universo.

Por que quatro ou cinco? Rigorosamente eram quatro os que falavam; mas, além deles, havia na sala um quinto personagem, calado, pensando, cochilando, cuja espórtula no debate não passava de um ou outro resmungo de aprovação.
Esse homem tinha a mesma idade dos companheiros, entre quarenta e cinquenta anos, era provinciano, capitalista, inteligente, não sem instrução, e, ao que parece, astuto e cáustico.

Não discutia nunca; e defendia-se da abstenção com um paradoxo, dizendo que a discussão é a forma polida do instinto batalhador, que jaz no homem, como uma herança bestial; e acrescentava que os serafins e os querubins não controvertiam nada, e, aliás, eram a perfeição espiritual e eterna.

Como desse esta mesma resposta naquela noite, contestou-lha um dos presentes, e desafiou-o a demonstrar o que dizia, se era capaz. Jacobina (assim se chamava ele) refletiu um instante, e respondeu:
— Pensando bem, talvez o senhor tenha razão.

Vai senão quando, no meio da noite, sucedeu que este casmurro usou da palavra, e não dois ou três minutos, mas trinta ou quarenta. A conversa, em seus meandros, veio a cair na natureza da alma, ponto que dividiu radicalmente os quatro amigos.

Cada cabeça, cada sentença; não só o acordo, mas a mesma discussão tornou-se difícil, senão impossível, pela multiplicidade das questões que se deduziram do tronco principal e um pouco, talvez, pela inconsistência dos pareceres. Um dos argumentadores pediu ao Jacobina alguma opinião — uma conjetura, ao menos.
— Nem conjetura, nem opinião, redarguiu ele; uma ou outra pode dar lugar a dissentimento, e, como sabem, eu não discuto. Mas, se querem ouvir-me calados, posso contar-lhes um caso de minha vida, em que ressalta a mais clara demonstração acerca da matéria de que se trata. Em primeiro lugar, não há uma só alma, há duas…
— Duas?
— Nada menos de duas almas. Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para entro… Espantem-se à vontade, podem ficar de boca aberta, dar de ombros, tudo; não admito réplica.
Se me replicarem, acabo o charuto e vou dormir.
A alma exterior pode ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto, uma operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma exterior de uma pessoa; — e assim também a polca, o voltarete, um livro, uma máquina, um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc.

Está claro que o ofício dessa segunda alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja.
Quem perde uma das metades, perde naturalmente metade da existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior implica a da existência inteira. Shylock, por exemplo.

A alma exterior aquele judeu eram os seus ducados; perdê-los equivalia a morrer. “Nunca mais verei o meu ouro, diz ele a Tubal; é um punhal que me enterras no coração.” Vejam bem esta frase; a perda dos ducados, alma exterior, era a morte para ele. Agora, é preciso saber que a alma exterior não é sempre a mesma…
— Não?
— Não, senhor; muda de natureza e de estado. Não aludo a certas almas absorventes, como a pátria, com a qual disse o Camões que morria, e o poder, que foi a alma exterior de César e de Cromwell. São almas enérgicas e exclusivas; mas há outras, embora enérgicas, de natureza mudável. Há cavalheiros, por exemplo, cuja alma exterior, nos primeiros anos, foi um chocalho ou um cavalinho de pau, e mais tarde uma provedoria de irmandade, suponhamos.
Pela minha parte, conheço uma senhora, — na verdade, gentilíssima — que muda de alma exterior cinco, seis vezes por ano. Durante a estação lírica é a ópera; cessando a estação, a alma exterior substitui-se por outra: um concerto, um baile do Cassino, a Rua do Ouvidor, Petrópolis…
— Perdão; essa senhora quem é?
— Essa senhora é parenta do diabo, e tem o mesmo nome; chama-se Legião… E assim outros mais casos. Eu mesmo tenho experimentado dessas trocas. Não as relato, porque iria longe; restrinjo-me ao episódio de que lhes falei. Um episódio dos meus vinte e cinco anos…

Os quatro companheiros, ansiosos de ouvir o caso prometido, esqueceram a controvérsia. Santa curiosidade! tu não és só a alma da civilização, és também o pomo da concórdia, fruta divina, de outro sabor que não aquele pomo da mitologia.

A sala, até a pouco ruidosa de física e metafísica, é agora um mar morto; todos os olhos estão no Jacobina, que conserta a ponta do charuto, recolhendo as memórias. Eis aqui como ele começou a narração:
— Tinha vinte e cinco anos, era pobre, e acabava de ser nomeado alferes da Guarda Nacional. Não imaginam o acontecimento que isto foi em nossa casa. Minha mãe ficou tão orgulhosa! tão contente! Chamava-me o eu alferes. Primos e tios, foi tudo uma alegria sincera e pura.
Na vila, note-se bem, houve alguns despeitados; choro e ranger de dentes, como na Escritura; e o motivo não foi outro senão que o posto tinha muitos candidatos e que esses perderam. Suponho também que uma parte do desgosto foi inteiramente gratuita: nasceu da simples distinção.

Lembra-me de alguns rapazes, que se davam comigo, e passaram a olhar-me de revés, durante algum tempo. Em compensação, tive muitas pessoas que ficaram satisfeitas com a nomeação; e a prova é que todo o fardamento me foi dado por amigos… Vai então uma das minhas tias, D. Marcolina, viúva do Capitão Peçanha, que morava a muitas léguas da vila, num sítio escuso e solitário, desejou ver-me, e pediu que fosse ter com ela e levasse a farda.

Fui, acompanhado de um pajem, que daí a dias tornou à vila, porque a tia Marcolina, apenas me pilhou no sítio, escreveu a minha mãe dizendo que não me soltava antes de um mês, pelo menos. E abraçava-me! Chamava-me também o seu alferes. Achava-me um rapagão bonito.

Como era um tanto patusca, chegou a confessar que tinha inveja da moça que houvesse de ser minha mulher. Jurava que em toda a província não havia outro que me pusesse o pé adiante. E sempre alferes; era alferes para cá, alferes para lá, alferes a toda a hora. Eu pedia-lhe que me chamasse Joãozinho, como dantes; e ela abanava a cabeça, bradando que não, que era o “Senhor alferes”. Um cunhado dela, irmão do finado Peçanha, que ali morava, não me chamava de outra maneira.

Era o “Senhor alferes”, não por gracejo, mas a sério, e à vista dos escravos, que naturalmente foram pelo mesmo caminho. Na mesa tinha eu o melhor lugar, e era o primeiro servido. Não imaginam.
Se lhes disser que o entusiasmo da tia Marcolina chegou ao ponto de mandar pôr no meu quarto um grande espelho, obra rica e magnífica, que destoava do resto da casa, cuja mobília era modesta e simples…

Era um espelho que lhe dera a madrinha, e que esta herdara da mãe, que o comprara a uma das fidalgas vindas em 1808 com a corte de D. João VI. Não sei o que havia nisso de verdade; era a tradição.

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O Espelho de Machado de Assis

Qual o desfecho do livro O Espelho?

DESFECHO: Jacobina vence o reflexo do espelho e deixa seus amigos em silêncio. Jacobina percebe que a imagem reflete sua “alma interior” e, ao vestir-se novamente com a farda, recupera sua “alma exterior”, evitando a solidão.

Qual é o foco narrativo do texto O Espelho?

O conto em questão tem início e fim com o foco narrativo em terceira pessoa; neste intervalo ocorre o discurso do personagem principal, Jacobina, que narra “um caso de sua vida” aos cavalheiros presentes na “casa do morro de Santa Tereza”.

Qual o papel do espelho na narrativa de Jacobina?

Jacobina, ao ganhar um espelho antigo, projeta sua imagem através do olhar dos outros. O espelho é a representação do jogo do “ser” e do “parecer”. Sem a farda de Alferes, Jacobina perde sua identidade.

Quais características do realismo estão presentes na obra O Espelho?

Como características que não fogem a realidade do poema e alude o realismo, podemos citar: visão irônica da realidade; critica social, personagens inspirados na realidade, uso de cenas do cotidiano, valorização de personagens inspirados na realidade, entre outros.

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